Hugo Brito


Cenas de "E o vento levou"

Esta semana recebi de uma amiga um super presente. Sabendo que sou apaixonado por música, especialmente se gravada em vinil, ela me indicou para uma amiga dela que queria doar dezenas de discos.

Fui à casa dessa senhora japonesa, que se alegrou pelo espaço liberado e me fez uma pergunta... “O senhor vai usar ou ouvir?” Ao que respondi de pronto. Ouvir.

Saí de lá feliz pelo aumento exponencial de acervo, alegre pelo sorriso dela em ver que os discos voltariam à vida, sairiam do silêncio, e com iluminados e sinceros votos de que eles funcionassem.

Olha, funcionaram e, de cara, me levaram para a viagem que trago aqui em nosso Encontro Sonoro desta semana.

Arte silenciada

Ao chegar em casa, depois da chata, mas necessária desinfecção, lá fui eu mergulhar nos discos. Tinha Ultraje a Rigor, Caetano, Gal, Bethânia, Luis Caldas, Altemar Dutra, Nelson Gonçalves, uma viagem mesmo. Mas de repente uma capa plástica amarelada, com vários discos dentro, me chamou a atenção.

Que grata surpresa! Era uma coleção das maiores trilhas sonoras de cinema, lançada em 1984. Tira poeira daqui, passa pano dali, um ou dois espirros depois e a surpresa aumentou. À medida que ia tirando os discos de suas capas de papel e das proteções plásticas meio coladas, fui percebendo que boa parte deles sequer tinham tocado ou tocado pouquíssimas vezes. Algumas daquelas peças de arte estavam silenciadas desde sempre.

Chamei então meu filho João Ignácio, fiel escudeiro das minhas viagens musicais das quintas e sextas à noite, e fiz um convite: vamos viajar? Vou rodar músicas e você vai tentando adivinhar de que filme são ou pelo menos dizer que lembra delas e o que elas te trazem à mente. Ele topou na hora.

Como cada LP vinha com uma determinada coleção de obras organizadas, fui seguindo essa lógica, e comecei dando uma boa chance para ele acertar.

Meu nome é Bond

Ele mesmo. Um disco inteiro com 12 músicas de filmes do agente secreto liberado para matar. Rodei logo o tema, ele titubeou um pouco, veio Missão Impossível e... bingo. Lembrou do velho Bond.

Fomos então viajando por Diamantes são para sempre. Fomos buscar o ano do lançamento do filme e, olhem que se existir coincidência aqui vai um bom exemplo dela. O filme saiu no ano em que eu nasci – 1971.

Foi bom lembrar do ótimo Sean Connery, o primeiro 007. O espião que me amava veio em seguida, ele lembrou da música. Ali já era Roger Moore quem dava vida ao agente secreto.

Aí rodei uma que sabia que ele mataria de primeira. E matou mesmo.  Viva e deixe morrer – filme de 1973 com Moore, antigo sim mas com música de um rapaz que tem o talento de fazer canções que nunca ficam velhas, Paul McCartney.

Superproduções

Esse foi o segundo disco da noite. Desafio lançado lá foi a primeira música. Nos primeiros acordes de piano acompanhado de baixo ele ficou na dúvida mas quando a banda entrou com o “tum..tum..tumm” matou. Jaws. Ele mesmo, o tema de Tubarão.

A conversa rolou solta. Lançado em 1975 o filme de Spielberg, grande marco do estilo terror com efeitos especiais arrojados para a época, rendeu um comentário de João que resume o poder de uma música boa no momento certo. Basta alguém fazer “tum...tum...tum...” e qual imagem vem à mente? Um tubarão!  

A faixa que rodei a seguir também foi nessa mesma pegada de memória musical. Flautas e assovios misturados, caixas tocando... Ele atirou! Essa conheço e só me lembra acampamento. Era a trilha de “A Ponte do Rio Kwai” (1957).

Fechei esse disco com uma matadora. Tema de “O Poderoso Chefão” (1972) que ele acertou no primeiro acorde. Já assistimos todos os filmes juntos.

Sucessos imortais

Aumentei a dificuldade e voltei no tempo. Lancei o Tema de Tara. Ele não matou, mas foi uma boa lembrança do espetacular “E o Vento Levou” (1939), sobre o qual falei de uma das mais antológicas falas de Vivian Leigh no papel de Scarlett O’Hara: “Nunca mais passarei fome!”.

Mas também comentei que a cena que mais me marcou no filme não foi essa e sim a de um soldado gritando enquanto tinha a perna amputada por um ferimento de guerra, sem anestesia. Lembro da hora que vi. Em umas das reprises na TV, tarde da noite e em duas partes já que o filme tem quase 4 horas de duração.

Fui assistir o filme escondido na sala, baixinho. Dormir depois? Nem pensar. 

Segui nessa linha dos sucessos com uma que ele lembrou na hora mas, claro, de ouvir a música e não pelo filme – Zorba o Grego – 1964. A música da dança de Zorba bate na memória automaticamente. Mais um filme para a lista dele para curtir Anthony Quinn no papel do grego no filme alegre e dramático.

Esse disco a gente fechou com uma que ele matou também. Mrs Robinson, executada por Simon e Gurfunkel e tema de “A primeira noite de um Homem”. Entrou na lista dele também ver Dustin Hoffman em pleno 1968.

Outras viagens

Olha, gente, confesso que a viagem por esses discos ainda vai longe e se fosse trazer tudo aqui seria um livro ou e não uma coluna (rsrs) , mas não poderia deixar nosso encontro chegar ao fim sem passar por um disco só de trilha de filmes de ficção no qual ele matou um monte de charadas: Guerra nas Estrelas (1977), Jornada nas Estrelas (1966) , Flash Gordon (1980), Caçadores Os caçadores da Arca Perdida, primeira aventura de Indiana Jones (1981) e lá vai.

Um outro só com músicas que ganharam Oscar como a do filme Fama, Carruagens de fogo e Shaft, essa última ele acertou pela versão de 2000 é claro, e não pelo filme de 1971, mas está valendo.

Para fechar, trilhas do Oeste.

Meu filho lembrou da música de “ Sete Homens e um Destino”, 1960, com Charles Bronson novinho ao lado de Steve McQueen e Yul Brynner, um clássico que enquanto ele colocava na lista para assistir não pude deixar de comentar que para a minha geração, é ouvir essa música e lembrar de um cara andando a cavalo e dizendo que fumar uma determinada marca famosa de cigarros era bom. Coisas da década de 70.

Enfim, fecho essa viagem de hoje com a feliz constatação de que bom cinema e boa música sempre andaram e sempre andarão de mãos dadas... Graças a Deus!!!

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