Hugo Brito

Nossos ídolos ficaram... velhos

Para bons artistas o tempo só faz bem, não é mesmo?


Foto: pxhere/Creative Commons

É um fato amigos. O tempo passa para todos. E nessa época de pandemia, presos em casa, a gente começa a ver isso de forma mais intensa. Mas não pensem que o título de nossa conversa de hoje é melancólico, triste. Na realidade ele traz uma constatação positiva. Sim eles ficaram velhos o que, para grande parte deles, foi ótimo.

Conversava sobre isso com um amigo, Kiko Medeiros, num desses despretensiosos bate papos via zap. Na conversa chegamos à conclusão de que nossos ídolos, pelo menos a maior parte deles, crescem e amadurecem e isso fica claro em suas obras.

O Nando Reis de hoje, por exemplo, não lembra em nada o que tínhamos na era Titãs. A profundidade do trabalho que ele faz hoje é inegável. Vejam amigos que não estou dizendo que a música que ele fazia quando jovem era ruim, pois inclusive adoro discos como Cabeça Dinossauro e Õ Blésq Blom, mas a densidade do que ele compõe hoje é imensamente maior.

Nós ficamos... velhos

Depois da conversa, quando me sentei na frente do computador para escrever essa coluna de hoje, comecei a refletir se essa forma de ver o trabalho desses artistas que conheci na juventude, e que acompanhei o amadurecimento, não seria na realidade uma reflexão trazida pelo meu próprio envelhecimento.

Mas aí me veio a imagem do Capital Inicial, banda que acho super legal, mas que me parece ter ficado parada no tempo, adolescente sem causa até o túmulo, meio que me provando que não seria a projeção da minha velhice o principal fator para essa percepção em relação aos artistas mais maduros (vixe, ficou muito papo cabeça, desculpem mas escapou – rsrs).

O mundo ficou... velho?

Aí é uma pergunta mesmo. Ao me ver afirmar que o Capital seria uma banda de adolescentes cinquentões, muitos de vocês devem ter pensado que eu estaria misturando jovialidade com falta de maturidade.

Aqui me defendo com alguns exemplos. Lá fora não dá para dizer que Bruce Springsteen ou a banda Red Hot Chilli Pepers não tragam jovialidade, mas em ambos os exemplos é possível ver a maturidade no trabalho. Aqui no Brasil para mim um grande exemplo é o Paralamas do Sucesso. Vi um show dos caras ano passado e aquele fogo no olhar estava lá, em uma banda extremamente madura musicalmente.

Quer outro exemplo? Gostem ou não, e aqui é uma discussão que vai além de preferências pessoais, temos o Skank. Ouvindo o que eles fizeram no decorrer da carreira é possível perceber de forma clara esse amadurecimento, sem perder a pegada.  

Mais trovão, menos raio

Voltando à conversa com meu amigo Kiko, lá pelas tantas ele citou a presença desse fenômeno do amadurecimento em artistas como Renato Russo e Cazuza, que rapidamente evoluíram, talvez até forçados pelo fato de que sabiam que não viveriam muito tempo. Especificamente sobre esses dois artistas espetaculares, rasgando adjetivo mesmo, me peguei em mais uma viagem.

Que pérolas eles dois não teriam nos trazido nesse momento atual? E após ele? E mais, o que nos dariam um David Bowie, um John Lennon e um George Harrison? Caramba, só de pensar vem aquela agonia de sentir falta de algo que nunca houve, mas também vem mais um desdobramento dessa nossa discussão de hoje, e que até toca um pouco no que falamos por aqui semana passada sobre a forma com a qual as músicas mudam de sentido com o tempo e com as situações.

Artistas como esses que citei, dentre tantos outros que nos deixaram precocemente, são como raios que brilharam por um tempo curto, mas cuja obra é como um trovão, segue fazendo barulho e nos impactando, vindo cada vez mais perto, rolando em nossa direção. É amigos, sei que viajei um bocado hoje e, aos que acharam que a dose de maionese dessa viajem foi excessiva, peço aquele desconto dado aos efeitos da pandemia certo?

Mas de toda essa loucura acho que podemos concordar em um ponto. Para bons artistas o tempo só faz bem, não é mesmo?