Estava eu me recuperando da coluna em homenagem ao Dia das Mães que exigiu de mim um mergulho mais difícil, e cá pensando comigo que queria escrever uma coisa mais levinha, quando me bato com uma notícia, comprovada cientificamente, que abalou minhas estruturas.
Só 43% do meu corpo é humano.
O resto, são microrganismos que vivem em mim.
Colagem do artista visual inglês Ben Giles - https://benlewisgiles.format.com/collagegg
Imediatamente minha cabeça deu um nó, quase entro em crise existencial, mas daí já pensei: se eu entrar em crise eles assumem o comando.
Voltei ao prumo, ou aos 43% de prumo que me cabem, e respirei fundo.
Sou nerd velha guarda, como diz meu filho, gosto de coisinhas científicas e permiti que o site Hypesciense me mande notificações.
E ele me mandou essa, bem no meio da cara...
Quer saber quais são os nosso outros 57% ?
Bactérias, vírus, fungos e arqueias, que são organismos originalmente classificados erroneamente como bactérias.
Eu nem sabia que arqueias existiam, quanto mais que elas existiam em mim!
E então a expressão “pessoas virulentas” ganhou um novo sentido.
Será que há também pessoas baqueterientas, funguentas e arqueientas?
Ilustração do designer, ilustrador e cenógrafo polonês Igor Morski - http://www.igor.morski.pl/
Pois é...
E essa afirmação científica só se tornou possível porque o nosso microbioma está se tornando uma área de estudo cada vez mais importante, e uma das cientistas que está mergulhada nas pesquisas é a professora Ruth Ley, do Departamento de Microbiologia do Instituto Max Planck (Alemanha), que diz o seguinte: “os micróbios são essenciais para a sua saúde. Seu corpo não é só você”.
Então, vamos dar uma segunda respirada e entender melhor, porque não é uma questão de higiene, não são micróbios causadores de doenças, mas que, interagem com nosso corpo, e nós e eles fazemos a nossa máquina humana funcionar (e as maquininhas deles também).
Colagens da artista visual franco-holandesa Marian Williams - https://www.pinterest.co.uk/pin/73887250107035413/
Pois bem, quase todos os cantos do nosso corpo estão cobertos de microrganismos.
Eles nos ajudam a digerir os alimentos, produzir hormônios, regular o intestino, prevenir doenças… Na verdade nós somos um microbioma ambulante (bateu na cabeça agora “Metamorfose Ambulante”, de Raul Seixas).
É.
Cada pessoa tem seu microbioma ou sua microbiota particular, tão exclusiva quanto uma impressão digital.
Os micro-organismos que ficam no nosso intestino, por exemplo, formam a chamada de Flora Intestinal (70 % dos que vivem em nosso corpo) e são o grupo de bactérias que auxiliam em vários processos como a digestão de alimentos e monitorando o desenvolvimento de outros micro-organismos que causam doenças.
Mas também podem interagir com o sistema imunológico e afetar nosso cérebro.
Um novo estudo da Universidade da Califórnia em Los Angeles (EUA) parece ter encontrado evidência de uma ligação especial entre o intestino e o cérebro: uma seleção de micróbios intestinais parecem estar conectados a regiões do cérebro associadas ao humor e ao comportamento geral.
Eles descobriram que a quantidade de lactobacilos no intestino afeta o nível de um metabolito (composto intermediário das reações enzimáticas do metabolismo) no sangue chamado quinurenina, e ele pode conduzir à depressão.
Assim, estas bactérias probióticas que fermentam leite em iogurte e ajudam no processo digestivo, podem reverter o comportamento depressivo e a ansiedade.
Já foi comprovado em camundongos.
Colagem do artista visual austríaco Gabi Tinkaus - http://www.artnet.com/artists/gabi-trinkaus/
A verdade é que as milhares de espécies diferentes de micro-organismos que convivem conosco estão distribuídas em partes de nosso corpo, como a boca, o nariz, os ouvidos, a garganta e regulam muitos de nossos processos fisiológicos.
Produzem proteínas indispensáveis para a nossa sobrevivência, produzem vitaminas do complexo B-12, fibras solúveis, limpam nossa pele, os olhos...
Cada um desses microrganismos mede cerca de um milésimo de milímetro de diâmetro – um volume cerca de mil vezes menor que o de uma de nossas células –, mas a quantidade deles num ser humano é tão grande que pesa em torno de dois quilos.
Então quando se pesarem, tirem dois quilos do resultado final.
Gostaram né!?
Colagem da artista alemã dadaísta Hannah Hoch
Os primeiros micróbios são adquiridos ainda durante o nascimento, quando o bebê passa pelo canal do parto, que tem bactérias vaginais benéficas para a saúde.
Crianças que nascem de parto normal e de cesariana possuem microbiomas diferentes, sendo que as últimas têm taxas mais altas de doenças como asma, e tendência a obesidade e alergias.
As crianças que são apresentados a uma maior diversidade de comunidades microbianas, que convivem com animais de estimação ou vivem em fazendas ou perto delas, por exemplo, tendem a ter menos problemas no sistema imunológico.
Colagem do artista inglês Patrick Bremer - https://www.patrickbremer.co.uk/
Há evidências de que tomar banho com muita frequência e com produtos agressivos danifica nosso microbioma, resultando em problemas de pele e até alérgicos.
O modo de vida germofóbico ocidental, com abuso de limpeza e sabonetes antibacterianos, pode ser um importante culpado no aumento de casos de alergias nas novas gerações.
O problema é que algumas das bactérias que compõem o nosso microbioma excretam substâncias químicas desagradáveis que provocam odores... fedorentos.
Mas os pesquisadores não sabem dizer qual seria a frequência de banho ideal para mantermos um microbioma rico, sem cheirar mal.
Ilustração do designer, ilustrador e cenógrafo polonês Igor Morski - http://www.igor.morski.pl
Geneticamente falando, estamos em maior desvantagem.
O genoma humano é composto de 20 mil instruções chamadas genes.
Se juntarmos todos os genes do nosso microbioma, temos um número entre 2 e 20 milhões de genes microbianos.
“Nós não temos apenas um genoma. Os genes do nosso microbioma representam essencialmente um segundo genoma que aumenta a nossa própria atividade genética. O que nos torna humanos é, na minha opinião, uma combinação de nosso próprio DNA mais o DNA de nossos micróbios intestinais”, argumentou Sarkis Mazmanian, microbiologista do Instituto de Tecnologia da Califórnia (EUA).
Mas ...assim como os humanos, esses microrganismos também têm seus genes, que determinam como eles vivem e interagem com outros organismos.
Se calcularmos o número de genes microbianos presentes em nosso corpo, a conta é a seguinte: abrigamos 100 vezes mais genes microbianos do que humanos.
Então, em se falando de genes, somos 99% micróbios e apenas 1% humanos.
Então aceita que dói menos...
É importante a gente entender que muitas vezes os micróbios são nossos aliados, e não rivais, mas a gente enxerga eles sempre como fonte de doença e tacamos vacinas e antibióticos e nos lavamos demais e agora então, é álcool gel várias vezes ao dia por causa dessa gripe perigosa.
Há pesquisadores preocupados de que nosso ataque aos maus micro-organismo esteja causando danos incalculáveis às nossas “boas bactérias”.
Embora estejamos fazendo um ótimo trabalho na eliminação de doenças infecciosas nos últimos 50 anos, também estamos assistindo a um enorme aumento de doenças autoimunes e alergias.
O microbioma desequilibrado também está sendo associado a doenças inflamatórias, Mal de Parkinson, câncer, autismo e até obesidade.
Colagens do artista francês Matthieu Bourel - http://thereart.ro/matthieu-bourel-works
E aí eis que uma luz se acende e este novo campo de estudo pode se transformar em uma nova forma de medicina.
Há evidências crescentes de que manipular o microbioma de uma pessoa pode praticamente curar doenças.
E embora a medicina microbiana esteja em seus estágios iniciais, mais e mais pesquisadores acreditam que monitorar nossos micróbios em breve se tornará um exame de rotina importantíssimo e que no futuro a parte não humana de seu corpo poderá ser lida instantaneamente para dizer se nossa saúde está indo em uma boa ou má direção.
Mais uma força dada pelas bactérias
Os cientistas criaram, acidentalmente, uma enzima mutante que degrada plástico rapidamente.
A enzima foi encontrada na primeira bactéria que naturalmente evoluiu para comer plástico, em um depósito de lixo no Japão.
Ao estudar a estrutura detalhada da enzima crucial produzida pelo organismo, os testes dos pesquisadores mostraram que a molécula inadvertidamente se tornou ainda melhor em quebrar o plástico PET (polietileno tereftalato) comumente utilizado em garrafas plásticas.
O avanço pode ajudar a resolver a crise global da poluição de plásticos, permitindo pela primeira vez uma reciclagem completa dessas garrafas.