Opinião

A Matemática de todo dia no Dia da Imprensa

Mais do que bons textos, há muito de matemática em qualquer jornal


Ilustração: Google FX IA

Em todo primeiro de junho é celebrado no Brasil o Dia da Imprensa, em homenagem a Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça (1774 - 1823), bacharel em direito, filósofo com boa formação também em matemática, além de jornalista e diplomata luso-brasileiro. Nascido na antiga Colônia do Sacramento, então sob domínio da Coroa Portuguesa e hoje pertencente ao Uruguai, é considerado o patrono da imprensa brasileira.

Além de pioneiro do maçonarismo no país, Hipólito da Costa é patrono da cadeira 17 da Academia Brasileira de Letras, fundada em 20 de julho de 1897, hoje pertencente a atriz e escritora brasileira Arlette Pinheiro Monteiro Torres (n. 1929), mais conhecida como Fernanda Montenegro.

Perseguido e preso, Hipólito da Costa escapou do cárcere e obteve nacionalidade inglesa, passando a editar regularmente entre 1º de junho de 1808 até seu falecimento em 11 de setembro de 1823 o primeiro jornal brasileiro fora do país, intitulado de Correio Braziliense ou Armazém Literário, defendendo ideias liberais como a Independência.

Vale lembrar que o primeiro jornal da Corte Portuguesa no Brasil intitulava-se “Gazeta do Rio de Janeiro”, fundado em 10 de setembro de 1808, deixando de circular em dezembro de 1822. Já o primeiro de iniciativa privada chamava-se “Idade D’Ouro do Brazil”, impresso na Bahia entre 14 de maio de 1811 a 24 de junho de 1823. Assim como a Gazeta, era contrário à independência e aos ideais republicanos.

Mais do que bons textos, há muito de matemática em qualquer jornal. Na língua portuguesa as palavras mais citadas são os artigos, seguidos das preposições e das conjunções... Em qualquer das páginas de um jornal, todos os dias, artigos como “a”, preposições como “de” e conjunções como “e” são escritas aos milhares.

Em idos de 1935, o linguista e filólogo americano George Kingsley Zipf (1902 - 1950) deparou-se com a frequência das palavras nos textos que lia. Ele observou que, em linhas gerais, algumas palavras são usadas muito frequentemente e outras, raramente. Zipf passou a listá-las em ordem decrescente de uso, obtendo uma lei de frequência.

Por exemplo, ao analisar a obra monumental do escritor, contista, romancista e poeta irlandês James Augustine Aloysius Joyce (1882 - 1941), “Ulisses” (1922), Zipf contou as palavras distintas, ordenando-as por frequência. Ele verificou que a palavra mais comum surgia 8000 vezes; a décima, 800 vezes; a centésima, 80 vezes; e a milésima, 8 vezes. Este ordenamento decrescente apresenta uma relação intrigante e exponencial, ou seja, de natureza logarítmica, onde a palavra mais comum foi encontrada aos milhares, a décima em centenas, a centésima em dezenas e a milésima em meras unidades.

Tal observação da frequência das palavras em nada difere do que ocorre todos os dias na imprensa, seja escrita, falada ou televisionada.

A hoje conhecida Lei de Zipf está na base dos algoritmos de Inteligência Artificial (IA), que conseguem mimetizar assim a escrita humana por meio do acesso a um vasto banco de dados a aplicar esta lei, que basicamente verifica a frequência das palavras. Não há muito segredo por trás do que a IA faz entre suas linhas de códigos computacionais – os princípios matemáticos ainda regem a escrita de boa parte dos textos, mas o trabalho da imprensa de buscar a verdade, checando fatos, e descobrindo, a partir de reportagens, importantes aspectos da vida humana com ética, originalidade e conteúdo – isto, nenhuma IA é capaz de realizar.

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Professor da Escola Politécnica, Departamento de Engenharia Química da UFBA e pesquisador do SENAI-CIMATEC