Alberto Oliveira

Empresas pagam fortunas para quem alimenta ódio e mentira

Marcas arrotam ética e respeito enquanto sustentam o lado mais asqueroso da internet

Não é opinião, é fato. Se um portal ou blog, na Internet, se dedica a divulgar informação checada, apurada, proveniente de fontes confiáveis, está caminhando acelerado para a falência, porque é grande a chance de atrair um público pequeno e, portanto, ser rejeitado pelos grandes anunciantes, orientados por suas agências de publicidade.

Por outro lado, se o dito portal ou blog está voltado para a publicação de fofocas e invencionices, a escavar os podres de famosos, a incentivar a divisão de classes, o ódio e a mentira, receberá uma atenção enorme de um público sedento por baixarias e escândalos. E esse público, embora formado por pessoas sem escrúpulos, adeptas da injúria, da calúnia e da difamação, fatalmente atrairá os olhares de grandes empresas, repita-se assessoradas por suas agências de publicidade.

Marcas arrotam ética e respeito enquanto sustentam financeiramente o lado mais asqueroso da internet.

Essas pocilgas digitais existem e se multiplicam, no País, apesar dos crimes que cometem diariamente, sem atrair sobre elas a mão pesada da Justiça, que no caso tarda e falha.

A jovem de 22 anos Jéssica Vitória Canedo se suicidou após ser vítima de mentiras publicadas a seu respeito com o único propósito de amplicar o engajamento e, com isso, atrair o dinheiro das grandes marcas, hipócritas que são (no caso, cúmplices). Nenhuma delas veio a público admitir que o seu dinheiro sustenta esses antros.

É preciso punir - e temos um Código Civil e um Penal para isso - tanto os que propagam a injúria, a calúnia e a difamação, quanto os que financiam a prática desses e de outros crimes.

O artigo 122 do Código Penal descreve, desde 1940 (portanto, há 83 anos), o delito de induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, com pena prevista de 2 meses a 6 anos de reclusão, caso o suicídio efetivamente ocorra; ou, de 1 a 3 anos de reclusão, se o resultado não for a morte, mas lesão corporal de natureza grave.

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Código Penal - Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Parágrafo único - A pena é duplicada:

Aumento de pena
I - se o crime é praticado por motivo egoístico;
II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.

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“A diferença entre induzir e instigar está no fato de que na primeira hipótese a vítima nunca havia pensado em suicídio, enquanto que na instigação a intenção suicida preexistia”, explica o juiz Paulo Sérgio Barbosa de Oliveira, em texto publicado em 2020 pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.

Já o motivo egoísta (claramente presente no caso da morte da adolescente) é aquele em que a pessoa coloca o seu interesse (a busca por cliques e engajamento e a publicidade que isso atrai, por exemplo) acima de tudo e tem esta motivação para o cometimento de crime.

Temos a questão plenamente tipificada em nosso arcabouço jurídico, como se vê, e isso há longos 83 anos.

A sociedade espera que, neste caso, a Justiça mostre a celeridade que tem apresentado em alguns outros, punindo a todos os direta ou indiretamente envolvidos na morte instigada de Jéssica Vitória Canedo.