Alberto Oliveira

Responda rápido: o que é moeda? (agora você vai entender economia)

Uma série para quem quer entender sem precisar de um doutorado


Aposto que você pensou nisso. Mas será só isso? | Foto: Pixabay/Creative Commons

A pergunta do título é daquelas que frequentemente nos levam a uma resposta do tipo: "Pensando bem, eu sei o que é, mas não sei dizer o que é".

Quando ouvimos falar em moeda pensamos imediatamente naquele objeto de ouro, prata ou liga metálica, de forma circular, utilizado para comprar outros objetos. Quando os economistas falam em moeda quase sempre estão se referindo a outra coisa.

Mas vamos começar do começo, que é sempre um bom lugar para se dar início a um serviço, como ensinou o Rei ao Coelho Branco de Alice no País das Maravilhas.

Estamos tão acostumados a utilizar o dinheiro que custamos a acreditar no fato de que por muitos, muitos anos o homem viveu sem ter a menor noção do que fosse.

Vamos pensar um pouco em como viviam as primeiras comunidades.

Imaginemos que existisse sobre a terra apenas dois grupos de pessoas, separados um do outro por alguns quilômetros. O primeiro grupo plantava, digamos, milho; e fabricava lanças de pedra, que utilizava para caçar. O segundo grupo plantava feijão e costurava roupas de peles de animais.

Primeiro grupo: milho e lanças de pedra
Segundo grupo: feijão e roupas de peles de animais

Os dois viviam felizes e nenhum sentia necessidade de possuir alguma coisa além do que tinha.

Um belo dia, os dois grupos se encontraram. E um homem do primeiro grupo (milho e lanças, lembra-se?) sentiu vontade de possuir uma roupa de pele. E um homem do segundo grupo (feijão e roupas de pele) ficou com desejo de comer um pouco de milho.

Não custa imaginar que os dois acabaram chegando a um acordo, trocando um punhado de milho por uma vestimenta, dando-se ambos por muito satisfeitos.

Eles acabavam de inventar um sistema de trocas diretas de mercadorias, que chamamos de escambo.

Ainda hoje esse sistema é muito utilizado no mundo. Em Salvador, por exemplo, há a "Feira do Rolo"; em Aracaju (Sergipe), existe a "feira da troca", onde se costuma trocar papagaio por bicicleta, rádio de pilha por chapéu de couro, rapadura por mingau.

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Voltemos às tribos do nosso exemplo, onde as coisas começaram a se complicar.

Qual a quantidade de milho que deveria ser trocada por uma roupa de pele? Bem, poderíamos comparar a utilidade de cada produto, o que os economistas chamam de valor de consumo ou valor de uso.

Mas quem poderia afirmar que o milho é mais útil do que a vestimenta? A utilidade de um produto é medida pela necessidade que temos dele. Ora, o homem da primeira tribo deseja, ardentemente, uma roupa de pele, portanto ela é, para ele, mais útil que o milho. Para o homem da segunda tribo, é o contrário.

Chegamos à conclusão de que a utilidade - o valor de consumo - não é o parâmetro apropriado para equilibrar a troca das mercadorias.

Por falar nisso, mais uma pergunta para responder rápido: o que é mercadoria?

Está aí outra palavra que usamos tanto, sem pensar no que significa. Pois mercadoria é qualquer produto útil, que serve para satisfazer necessidades humanas, mas com um detalhe: ela é produzida para a venda ou troca por outra, não para o uso de quem a produz.

Muito bem. Estamos vendo que para determinar quantas espigas de milho vale uma roupa de pele precisamos descobrir alguma coisa que as duas mercadorias tenham em comum e que possa ser quantificada.

E o que seria? Um ponto para você se pensou no trabalho humano. Tanto a produção do milho quanto a confecção da vestimenta exigiram uma determinada parcela de trabalho do homem, que pode ser medida em horas de serviço, por exemplo.

Se, para produzir o casaco, o homem da segunda tribo precisa de dois meses, e para o milho o homem da primeira tribo necessita de um, fica claro que o justo seria trocar duas espigas por uma roupa de pele, isso porque para produzir uma roupa foi preciso tanto trabalho quanto o necessário para as duas espigas.


A roupa de pele valeria o mesmo que 2 espigas, porque o tempo para produzir a roupa é o mesmo no caso do milho

Outra pergunta perigosa: e se outro homem da segunda tribo gastou quatro meses para confeccionar o seu casaco, isso significa que ele vale o dobro daquele que foi preparado em dois meses?

Não responda rápido. Pense, antes.

É evidente que não se deve medir o valor das mercadorias examinando-se o tempo de trabalho empregado por produtores isolados. Pode muito bem ser que o segundo produtor tenha precisado do dobro do tempo apenas porque trabalha mais devagar do que o primeiro.

A grandeza do valor de uma mercadoria é estabelecida observando-se o tempo médio de trabalho empregado pelos produtores.

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Primeiro grupo: milho e lanças de pedra
Segundo grupo: feijão e roupas de peles de animais

Voltemos às nossas tribos, onde as coisas se complicaram ainda mais: um produtor de milho da primeira tribo (aquela que produz milho e lanças de pedra, recordemos) quer uma roupa de pele, mas o fabricante da roupa, da segunda tribo (produtora de roupas de pele e feijão), não quer milho. Ele deseja é uma das lanças, fabricada por outra pessoa da primeira tribo e que não quer nem ouvir falar em casaco de pele ou em espigas de milho.

-- A  produz milho e quer roupa de pele
-- B produz roupa de pele, mas não quer milho, quer uma lança
-- C produz lança mas não quer nem milho nem roupa de pele. 

E agora? Como fazer com que cada um consiga a mercadoria que procura? Seria fácil, por exemplo, se pudéssemos encontrar um objeto que todos se dispusessem a aceitar. Digamos que no caso de nossas tribos esse objeto fosse o feijão. Então, o produtor de milho (que quer uma roupa de pele) troca seu produto por feijão; em seguida, troca o feijão por uma vestimenta. O produtor da vestimenta pega o feijão que recebeu e o troca por uma lança com o produtor dessa mercadoria.


A roupa de pele é trocada pelo feijão, que é trocado pelas espigas de milho

Esse produto que expressa o valor de todos os demais (no nosso exemplo, o feijão) é chamado de "equivalente universal".

Na Grécia de Homero (Século VIII a.C.), faziam-se as contas tomando-se bois como parâmetro. Uma mulher valia de 20 a 40 cabeças de gado; um homem, 100.

Os bois estão na origem do dinheiro. Os húngaros têm um ditado que diz: "o gado é ouro". Quando os antigos magiares queriam dizer que uma pessoa era rica, falavam: "tem muito gado".

E muitos nomes de moedas derivam desse animal. A primeira moeda romana de bronze fundido chamava-se "Aes", palavra derivada de assum, que quer dizer assado (uma referência aos banquetes, em que a carne de boi era servida).

As moedas gregas, os óbolos, vem de obelos, espetos de ferro nos quais se colocavam pedaços de boi, nos sacrifícios.


Óbolo ateniense cunhado entre 454 e 404 a.C..Nele há a efígie de Atena e uma coruja

E o mais interessante: pecúnia, que significa dinheiro, deriva de pecus, ou seja, gado.

O boi, no entanto, não foi o único equivalente universal utilizado. Em certas regiões da América, principalmente no México, o grão de cacau, guardado em pequenos sacos, serviu como dinheiro. E ainda hoje, no Brasil, é comum perguntar a alguém se "recebeu o cacau", em lugar de "recebeu o dinheiro".

O sal servia de meio de pagamento em vários países, como a Guiné ou Libéria e Etiópia, onde 300 torrões compravam um escravo. Do uso do sal como pagamento, por sinal, é que vem a palavra "salário".

Em Barbados usava-se açúcar e algodão, como dinheiro; na Nigéria, amendoim; na China, botas; na Frísia, cerveja; na Oceania, dentes de animais; nas Ilhas Carolinas, esteiras; no Alasca, peixes; nas Novas Hébridas, penas; no Caribe, tambores; nas Marianas, tartarugas. etc.

Mas, chega, por hoje. Vamos continuar na semana que vem, quando continuaremos nossa busca pela resposta do título e ficaremos sabendo o que é que Juno Moneta tem a ver com tudo isso.