Você sabe qual é o animal mais perigoso do mundo? Se sua resposta foi um dos “big five” que povoam o nosso planeta, você está bem enganado.
Quando estamos diante de uma situação de perigo no mundo animal, lidar com um leão, elefante, búfalo, leopardo ou rinoceronte não é o maior desafio que podemos enfrentar, até mesmo porque eles são tão grandes e ruidosos que você provavelmente terá tempo de escapar e se proteger para não ser eliminado.
O animal mais perigoso do planeta é o mosquito, um ser aparentemente frágil, muitas vezes minúsculo e imperceptível, mas com o gigante poder de minar nossas resistências e aniquilar milhões de pessoas por ano.
Gosto de fazer essa analogia quando falamos de microviolências e do perigo que elas representam para as pessoas. Claro que toda violência deve ser eliminada, principalmente quando pode ser identificada e prontamente combatida.
Mas, infelizmente, nós humanos somos vítimas de danosas microviolências todos os dias: em casa, na escola e no trabalho. E esse quadro se dá em um ambiente muito bem estruturado por uma cultura de machismo, misoginia, homofobia e racismo.
Entretanto, independentemente da forte cultura de opressão em que vivemos, não é tão difícil assim perceber as várias microviolências sofridas por nós, e principalmente pelos grupos minorizados, representados por mulheres, negros, jovens, idosos, pessoas com deficiência e toda a comunidade LGBTQIA+ que nos cerca.
Sabe aquela piada que o seu colega faz frequentemente e que você sabe que deixa alguém da roda desconfortável? Ou aquelas frases bobinhas e aparentemente ingênuas como ‘isso é coisa de mulherzinha’, ‘fala que nem homem’, ‘mulher não sabe dirigir’, ‘mulheres precisam escolher entre a carreira e o casamento’, ‘isso está parecendo um samba de crioulo doido’ ou aquela situação em que se pergunta a idade de alguém só para diminuir o trabalho ou a opinião de quem é mais jovem ou mais velho que o “padrão”?
Difícil também imaginar o quanto nós mesmos já utilizamos essas frases em nossas vidas e, principalmente, o quanto fomos os agentes causadores dessas microviolências.
O quanto podemos ser vítimas e, ao mesmo tempo, contribuir para toda a cultura de opressão, reforçando práticas como o manterrupting, que consiste em um homem interromper a mulher, impedindo que ela complete um raciocínio.
O bropriating, que é uma forma de roubar as ideias femininas e apresentá-las como se fossem de um homem, deslegitimando suas capacidades;
o mansplaining, que é quando a mulher perde seu local de fala, sobre um assunto que ela entende, para um homem, ou ainda o gaslighting, típico dos relacionamentos abusivos, que é a tática usada para questionar e manipular alguém, numa tentativa de convencer a vítima de que ela está fora de sua sanidade.
Histórias assim são constantes e até mesmo assustadoras, e agora preocupam ainda mais, porque ampliaram seu alcance no mundo virtual.
As redes sociais, ao mesmo tempo que nos beneficiam com informações, também se tornaram um mecanismo de objetificação e humilhação. Nestes casos, o celular pode ser uma arma de perseguição voraz na mão de pessoas, que se sentem no direito de invadir o cotidiano de outras, seja com ações, palavras, vídeos ou conversas.
O uso da internet pode ser cruel quando coloca as vítimas em gaiolas de algoritmos, que são usados para ampliar opressão e violência.
Mascarado por trás de um suposto interesse, o cyberbullying cresce na mesma medida que a era digital. Uma pesquisa realizada pela ONG Plan Internacional em escala global, aponta que 58% das entrevistadas já sofreram algum tipo de assédio virtual.
Entrando na realidade do Brasil, esse número chega a 77%, com mulheres de idades entre 15 e 25 anos. Precisamos despertar a consciência de que as redes sociais também são uma forma deliberada de importunar, intimidar, perseguir, ofender ou hostilizar alguém.
Por isso, é tão importante que o mundo corporativo ajude seus colaboradores a desenvolver uma consciência coletiva que elimine essas microviolências e todas as suas consequências pela raiz, formando colaboradores, e principalmente líderes, que possam transformar a realidade a partir da influência e do poder que eles têm no dia a dia das empresas.
Estudos mostram que a supervisão abusiva é um dos principais espaços usados para agressões que podem se manifestar de várias formas. Uma liderança que não está pronta para ressignificar e promover espaços seguros para a diversidade e inclusão pode estar sabotando consciente ou inconsciente o potencial dos colaboradores e de toda a empresa, a partir das microviolências que promove.
Infelizmente, ainda presenciamos processos de gestão em que líderes se recusam a se comunicarem diretamente com suas equipes, impondo contato apenas por e-mail ou bilhetes, o que segrega colaboradores, isolando-os e impondo dificuldades para que se comuniquem com colegas de trabalho, muitas vezes impedindo os trabalhadores de se expressarem sem explicar os motivos, ou delegam tarefas impossíveis a alguns ou que normalmente são desprezadas por outros.
Lideranças desconectadas da urgência de humanização nos processos corporativos ainda pressionam suas equipes por prazos inadequados de entrega de tarefas ou, ao contrário, deixam alguns membros ociosos, sem quaisquer tarefas a cumprir.
Manipulam informações de forma a não serem repassadas com a antecedência necessária ao colaborador ou ainda trocam seus horários ou turnos sem avisá-lo com antecedência. Alguns ainda colocam determinados colaboradores controlando outros, fora do contexto hierárquico da empresa.
Microviolências são evitadas quando temos empatia pela dor do próximo, quando quebramos a cultura que nos retroalimenta e nos posicionamos contra isso.
Quando falamos em microviolências, cada um de nós tem total poder de mudar e transformar a realidade. Basta pensar e, principalmente, se informar. Ouvir. Neste caso, a vacina é farta e abundante.
Conecte-se, conheça e respeite as pessoas e suas diferenças. Se você se incomoda em ser vítima ou agressor, dê o primeiro passo: se aproxime e se envolva nas ações de diversidade promovidas pela sua empresa. Comece dando o exemplo e se protegendo com a diversidade, a partir de sua roda de amigos. Seja um catalisador da mudança através das suas atitudes.
*Ronaldo Ferreira Júnior é conselheiro da Ampro – Associação das Agências de Live Marketing, CEO da um.a #diversidadeCriativa – empresa especializada em eventos, campanhas de incentivo e trade, e sócio-fundador com a Pearson Educacional do programa de capacitação MDI – Mestre Diversidade Inclusiva. uma@nbpress.com
Sobre a um.a
Fundada em 1996, a um.a #diversidadeCriativa está entre as mais estruturadas agências de live marketing do Brasil, especializada em eventos, incentivos e trade. Entre seus principais clientes estão Anbima, Atento, Bristol, B3, Citi, Carrefour, Corteva, Cielo, Motorola, Nextel, Mapfre, Pandora, Sanofi, Sumup, Tigre, Via Varejo, Visa e Motorola entre outras. Ao longo de sua história, ganhou mais de 40 “jacarés” do Prêmio Caio, um dos mais importantes da área de eventos.