Foi após o nascimento do terceiro filho, há 13 anos, que a empreendedora individual Janaína Graciele, 44, começou a ganhar peso. Após a terceira gravidez, a brasiliense engordou 30 quilos – hoje ela pesa 110.
Janaína perdeu o pai no ano passado, vítima de um infarto em decorrência da obesidade.
A empreendedora faz parte do percentual de pessoas obesas que cresceu no Brasil nos últimos 13 anos. Segundo a pesquisa Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) do Ministério da Saúde, a prevalência de pessoas obesas no país subiu de 11,8% em 2006 para 20,9% no ano passado. Significa que dois a cada 10 brasileiros estão obesos.
“Acho que essa correria do dia-a-dia, a falta de informação. Ao invés de fazer uma comida, vai lá e compra que é mais rápido, mais fácil, porque tem que voltar a trabalhar. Acredito que seja esse o motivo desse aumento do percentual de obesos”, opina Janaína.
Com baixa autoestima, Janaína decidiu participar de concursos de beleza categoria plus size. O primeiro foi em 2012. “Eu falo que eu ganhei porque eu peguei terceiro lugar, com 27 mulheres, eu tinha 36 anos na época e a que ganhou tinha 18. Foi a partir daí que eu comecei a ver que tinha uma luz no fim do túnel e eu comecei a ajudar muitas mulheres que não se amavam, não se aceitavam como eu.”
Atualmente, a empreendedora individual é dona de 21 títulos de concursos de beleza. “Muitas mulheres entram em um concurso desse se sentindo um nada, desvalorizadas. A partir do concurso, muitas falam que renascem, que melhoram o relacionamento com família, amigos”, completa.
Obesidade e sobrepeso
Segundo a pesquisa Vigitel do Ministério da Saúde, a prevalência de excesso de peso também aumentou, considerando o período 2006-2019: passou de 42,6% em 2006 para 55,4% em 2019. Em 2019, o percentual de excesso de peso entre homens foi de 57,1% e entre mulheres, 53,9%.
“Sabemos se é obesidade ou excesso de peso pelo Índice de Massa Corpórea (IMC), que é o peso divido pelo quadrado da altura da pessoa. Esse índice até o número 25, é considerado peso normal. De 25 a 30, é o que chamamos de sobrepeso. De 30 a 35, chamamos de obesidade grau 1. De 35 a 40, obesidade de grau 2. Acima de 40, grau 3. E, acima de 50, uma grande obesidade. A intensidade da obesidade faz com que as doenças associadas sejam cada vez mais graves”, diz o presidente do departamento de obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, doutor Mário Carra.
Riscos à saúde
Recentemente, dois estudos, um da França e outro dos Estados Unidos, apontaram que a obesidade é um dos fatores de risco para a Covid-19.
O excesso de peso associado à outras complicações, como diabetes, aumenta a chance do quadro do coronavírus evoluir em pessoas obesas.
Além disso, a obesidade pode prejudicar a capacidade respiratória, fortemente atacada pela Covid-19.
“O maior risco é que a obesidade provoca uma espécie de inflamação crônica no organismo. Sempre um processo infeccioso é mais grave em uma pessoa com excesso de peso ou obesidade, do que em uma pessoa com peso normal. No período de pandemia, não vai ser possível que alguém diminua o peso para reverter esse processo”, destaca o doutor Mário Carra.
A obesidade é causa de várias doenças crônicas, como hipertensão, doenças respiratórias, doenças do sono e lesões em tendões, músculos e articulações.
Com pré-diabetes e pressão alta por conta de obesidade, o empreendedor Ricardo Viana, 33, sofre com problemas de peso desde criança. Recentemente, ele fez cirurgia bariátrica para redução do estômago.
Com 23 quilos a menos, ele teve de enfrentar um problema sério por conta de obesidade.
“Um dos problemas mais graves que enfrentei foi uma obstrução em uma veia do meu olho. Por conta da pressão arterial desregulada, eu não sabia que era hipertenso, essa veia ficou obstruída durante um ano, o que prejudicou minha visão nesse período. O problema só foi resolvido porque comecei dieta e controlei a pressão arterial”, diz Ricardo.
Comportamento social
De acordo com a pasta da Saúde, o aumento da obesidade e do sobrepeso no Brasil pode ser explicado por mudanças comportamentais ocorridas na sociedade nas últimas décadas, principalmente aquelas relacionadas à alimentação inadequada e ao sedentarismo.
Os problemas com peso tendem a aumentar com a idade, segundo a pesquisa Vigitel. Entre jovens de 18 a 24 anos, o percentual de obesidade foi de 8,7% no ano passado. Esse número sobe para 20,9% quando analisado o cenário com adultos com 65 anos ou mais.
“A obesidade é um problema de saúde pública. Os fatores que levam a esse aumento são vários. Um é a urbanização, é o tipo de alimentação industrializado, falta de exercício físico decorrente do dia-a-dia, televisão. Mas a causa primordial é a alimentação, que não é mais saudável”, destaca a médica endocrinologista Jamily Drago.
O levantamento apontou ainda que a prevalência de pessoas obesas é maior entre as mulheres - 21% - pouco acima da média entre os homens, que é de 19,5%.
Tratamento
A obesidade é uma doença evolutiva, mas tem tratamento. Além da dieta, há também tratamento medicamentoso.
Para a médica endocrinologista Jamily Drago, é preciso ainda estar atento às fake news relacionadas a perda de peso.
“Não basta só fazer a dieta e exercícios, é preciso uma mudança de hábitos realmente consistente e definitiva. As pessoas têm ideia errada do que é tratamento medicamentoso bem orientado, e elas procuram também fake news, propagandas milagrosas. Esse remédio milagroso não existe. Existe acompanhamento sério e de longo prazo”.
Segundo o Ministério da Saúde, o tratamento para combater sobrepeso e obesidade pode ser feito no Sistema Único de Saúde (SUS) em centros multidisciplinares, que oferecem orientação associando exercícios físicos e reeducação alimentar.
“A obesidade tem que ser tratada por um longo período de tempo, porque senão a tendência é a doença recorrer. Ou seja, nós podemos controlar a doença obesidade, mas não podemos curar a doença obesidade, pelo menos até os nossos conhecimentos atuais”, ressalta o doutor Mário Carra.
No SUS, orientações alimentares de prevenção, controle do ganho de peso e suporte profissional são encontradas na Atenção Primária. Há ainda as Unidades de Saúde da Família (USF), que identificam as pessoas propensas a desenvolver obesidade, e monitoram o quadro de ganho de peso excessivo e enfermidades que podem surgir.