Alberto Oliveira

Por que a carne subiu de preço (e o que Bolsonaro tem a ver com isso)

Será que há razão na gritaria?

Foto: pxhere/Creative Commons
O preço da carne subiu nos últimos meses

O aumento médio de 8% no preço da carne, a partir de novembro, levou oposicionistas às redes sociais, para acusações ao governo do presidente Jair Bolsonaro. Choveram memes e ironias contra os que ajudaram a elegê-lo. Mas será que há razão nas críticas e gozações? Uma olhada mais de perto no que aconteceu e nos livros-texto de Economia pode ajudar a responder.

Vamos começar pela teoria. São poucas as leis que os brasileiros não conseguiram ainda desmoralizar, entre elas a da gravidade e as da oferta e procura. O que diz a Lei da Oferta? "Se a oferta de um bem ou serviço cai o seu preço tende a subir". Por exemplo: quando há menos bananas sendo vendidas elas tendem a ficar mais caras. E a Lei da Procura? "Quando a procura por um bem ou serviço sobe o seu preço tende a aumentar". Por que a cerveja fica mais cara, no verão? Porque a procura aumenta, simples assim. 

Agora vamos a alguns fatos: 

1) A peste suína africana, uma doença altamente contagiosa e para a qual inexiste vacina ou tratamento começou a dizimar o rebanho na China (os primeiros casos apareceram em agosto de 2018), um país com mais de 1 bilhão de consumidores (cinco vezes o tamanho da população brasileira) e que consome anualmente cerca de 54 milhões de toneladas do produto.

Sem o seu principal tipo de carne, os chineses se voltaram para as de frango e de boi, e foram à compras no mercado externo. Com as dificuldades de aquisição nos Estados Unidos, por causa da guerra comercial entre os dois países, restou o Brasil como principal fornecedor. 

Em 2017 eles compraram 10% da produção mundial de carnes suína, bovina e de frangos. Em 2020 serão 21%.

No caso do Brasil, as compras chinesas de carne bovina subiram 23,6% nos 10 primeiros meses deste ano, chegando a 320 mil toneladas, segundo dados da associação da indústria, a Abrafrigo (em 2019 somaram 494 mil toneladas, contra 322 em 2018, de acordo com o Ministério da Economia).

Ao mesmo tempo, russos e árabes reabriram seus mercados compradores, ampliando a demanda pela carne brasileira. As compras da Rússia saltaram de 7,5 mil toneladas em 2018 para quase 70 mil toneladas em 2019. No caso dos Emirados Árabes Unidos chegaram a 71 mil toneladas em 2018, contra pouco mais de 36 mil em 2018, ainda segundo dados do Ministério da Economia.

É a Lei da Procura em seu esplendor. Maior a procura, maior o preço.

Com os produtores dirigindo suas vendas para o mercado externo, caiu a oferta de carne para o consumidor brasileiro.

Olhe a Lei da Oferta aí, gente! Menor oferta, preços mais altos, como vimos.

2) Os brasileiros historicamente consomem mais carne no último trimestre do ano, em especial a partir de novembro. É o efeito do décimo-terceiro nas contas da população de menor poder aquisitivo, e que em 2019 injetou mais de R$ 210 bilhões na economia. 

A carne é um produto que os economistas chamam de elástico: seu consumo cresce quando a renda aumenta.

E maior procura por carne leva a preços mais altos. 

3) Este ano ocorreu outro componente alimentador do consumo: o resgate de R$ 500 nas contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (mais R$ 40 billhões).

No terceiro trimestre de 2019 as famílias gastaram R$ 1,2 trilhão, o décimo trimestre seguido de avanço, segundo o IBGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Aqui é preciso chamar a atenção para um indicador: o consumo doméstico, que se encontrava estagnado desde 2015, início da recessão econômica no Brasil, voltou a crescer.

O brasileiro consumia anualmente, em média, 44 quilos de frango (deve fechar o ano em 47), e em 2019 consumirá 37,4 quilos de carne bovina (quase 800 gramas a mais, por pessoa, do que nos anos recentes de recessão).

Aí, sim, pode-se lançar a maior parte desse aumento da procura por carne na conta do governo Bolsonaro, embora dificilmente isso possa ser motivo de crítica. 

Economia está longe da exatidão matemática, mas a teoria aponta para uma queda nos preços da carne a partir de janeiro ou fevereiro.

Em nome da coerência as ironias de agora teriam que se transformar em aplausos ao governo Bolsonaro. Seria o segundo erro, no entanto. Nem o presidente tem culpa pelo aumento, nem será o responsável pela queda dos preços da proteína animal.

Nos dois casos, é só a Lei da Oferta e da Procura agindo (aquela que os brasileiros ainda não encontraram um meio de desmoralizar).