
Um levantamento inédito da Confederação Nacional da Indústria (CNI) faz um raio-x de como ficam as exportações brasileiras aos Estados Unidos, principal destino das vendas da indústria de transformação nacional, considerando todas as tarifas adicionais impostas pelo governo de Donald Trump ao Brasil.
No total, 77,8% da pauta exportadora está sujeita a alguma taxação adicional, considerando as ordens executivas que instituíram as tarifas de 10%, de 40% e a Seção 232 do Trade Expansion Act, de 25% e 50%, aplicadas exclusivamente a produtos de aço, alumínio, cobre, veículos e autopeças. Mais da metade das exportações enfrentarão sobretaxas de 50%.
O levantamento baseia-se em dados da United States International Trade Commission (USITC), com análise no nível de 10 dígitos do código tarifário norte-americano, o que permite identificar com precisão os produtos sujeitos às medidas comerciais. É importante destacar que cada medida comercial tem a própria lista de cobertura e isenções, o que significa que produtos livres de uma tarifa adicional podem estar submetidos à outra.
O cruzamento mostra que dos 77,8% das exportações sujeitas a taxação adicional, 45,8% estão submetidas a tarifas de 40% ou 50% direcionadas especificamente ao Brasil.
"Esse retrato dá a dimensão do problema enorme que teremos de enfrentar e o quanto vamos precisar avançar nas negociações para reverter essas barreiras. É um trabalho que precisa envolver governos e os setores produtivos. Os EUA são os principais parceiros comerciais da indústria, precisamos encontrar saídas", afirma Ricardo Alban, presidente da CNI.
Metade das exportações vai enfrentar teto das tarifas
Os dados mostram que 41,4% da pauta exportadora brasileira aos EUA, com 7.691 produtos de variados setores, está sujeita à tarifa combinada de 50%. Em 2024, a exportação desses bens alcançou US$ 17,5 bilhões.
Principal segmento exportador ao mercado americano, a indústria de transformação responde por 69,9% desse valor, com 7.184 produtos afetados pelas tarifas combinadas, que totalizaram US$ 12,3 bilhões em 2024.
Os setores com maior número de produtos exportados afetados pela sobretaxa combinada de 50% seriam: Vestuário e acessórios (14,6%), Máquinas e equipamentos (11,2%), Produtos têxteis (10,4%), Alimentos (9,0%), Químicos (8,7%) e Couro e calçados (5,7%).
Os setores de aço, alumínio e cobre, sobretaxados pela Seção 232, representam 9,3% da pauta e enfrentarão tarifa adicional de 50%.
Combinados, esses blocos da pauta exportadora representam 50,7% das exportações brasileiras aos americanos.
Indústria extrativa concentra maior parte dos produtos isentos
As exportações isentas concentram-se principalmente na indústria extrativa, que responde por 68,9% dessas exportações, com destaque para petróleo leve e pesado.
Na indústria de transformação, o setor de Coque, derivados de petróleo e biocombustíveis representa 21,5% do valor isento, especialmente outros combustíveis automotivos e óleos combustíveis pesados (sem biodiesel). O restante do valor exportado isento concentra-se nos setores de Metalurgia e de Madeira.
6,9% das exportações podem ser isentas da sobretaxa de 40%
A Ordem Executiva 14.323, que institui a tarifa adicional de 40%, inclui uma lista de produtos com isenção condicionada à comprovação de uso no setor de aviação civil. Em 2024, nesse recorte, as exportações brasileiras somaram US$ 2,9 bilhões, o que representa 6,9% da pauta exportadora.
O setor de Outros equipamentos de transporte exportou 41 produtos que totalizaram US$ 1,9 bilhão em 2024. Aviões não militares entre 4,5 e 15 toneladas e acima de 15 toneladas concentraram 52,3% valor passível de isenção e têm maior probabilidade de se enquadrar na destinação para aviação civil.
A aplicação da isenção prevista para a aviação civil pode alterar o alcance efetivo da tarifa adicional de 40% sobre 601 produtos exportados. Caso a exceção seja aceita, 577 deles ficariam sujeitos apenas à tarifa de 10% anunciados em abril, enquanto 4 estariam isentos de ambas.
Os setores com maior número de produtos exportados nessa condição seriam: Máquinas e equipamentos (34,9%), Equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (26,5%), Máquinas, aparelhos e materiais elétricos (17,7%), Produtos de borracha e de material plástico (7,2%) e Outros equipamentos de transporte (7,1%).
A análise mapeou também a parcela das exportações que pode ser impactada pelas medidas setoriais já em vigor pela Seção 232. Em 2024, essa parcela das exportações somou US$ 5,2 bilhões, o equivalente à 12,3% da pauta exportadora. Entre as medidas em vigor, aço e alumínio é a mais representativa, com participação de 8,7%, seguido de veículos e autopeças (3,0%) e cobre (0,6%).
Além dessas medidas em vigor, os Estados Unidos têm ampliado o uso da Seção 232, com várias investigações em curso que podem resultar na aplicação de tarifas adicionais a setores específicos.
Estão sendo investigados setores de aeronaves e motores, caminhões, madeira, minerais críticos, produtos farmacêuticos, semicondutores, silício policristalino e sistemas aéreos não tripulados. Enquanto a investigação não for concluída, esses setores estarão sujeitos às alíquotas previstas pelas ordens executivas publicadas pelo governo americano em abril e em julho.
CNI apresentou 8 propostas para apoiar setores mais afetados
Com o objetivo de atenuar os efeitos da aplicação das tarifas sobre a indústria nacional, a CNI apresentou ao governo federal uma lista de 8 medidas prioritárias com diversas propostas do setor em áreas como crédito, tributação, emprego e comércio exterior. A relação foi entregue ao vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin.
Confira as 8 propostas:
Criar linha de financiamento emergencial do BNDES, com juros de 1% a 4% a.a., específicas para capital de giro para empresas que tiverem exportações afetadas e suas cadeias produtivas;
Ampliar, de 750 dias para 1.500 dias, o prazo máximo entre a contratação e a liquidação do contrato de câmbio de exportação nas modalidades Antecipação de Contrato de Câmbio (ACC) e Adiantamento sobre Cambiais Entregues (ACE), especialmente aqueles que estão em andamento, realizados por bancos públicos e desenvolvimento, após o embarque da mercadoria ou após a prestação do serviço;
Prorrogar o prazo e/ou carência para pagamento de financiamentos direcionados ao comércio exterior, como PROEX e BNDES-Exim;
Aplicar direito provisório de dumping e reforçar os recursos humanos e tecnológicos para resposta rápida a desvios de comércio;
Adiar, por 120 dias, o pagamento de todos os tributos federais, incluindo as contribuições previdenciárias, e parcelar, em pelo menos seis parcelas mensais e sem incidência de multas e juros, o pagamento dos valores dos tributos que tiveram o recolhimento adiado;
Realizar o pagamento imediato dos pedidos de ressarcimento de saldos credores de tributos federais (PIS/Cofins e IPI) já homologados pela Receita Federal do Brasil e garantir compensações mais ágeis e previsíveis;
Ampliação do Reintegra, com elevação para 3% da alíquota de ressarcimento de tributos residuais nas exportações;
Reativar o Programa Seguro-Emprego (PSE) com aperfeiçoamentos.
“Nossas propostas buscam mitigar os efeitos econômicos adversos aos setores afetados pelas barreiras, preservar a capacidade exportadora das empresas brasileiras e garantir a continuidade das operações internacionais em um cenário de alta imprevisibilidade”, afirma Ricardo Alban.