Alberto Oliveira

Tarifaço de Trump: uma ameaça silenciosa à economia brasileira

A guerra comercial entre EUA e China pode acionar mecanismos de inflação importada, no Brasil


Ilustração
: Sora IA

O tarifaço imposto pelo presidente americano Donald Trump encontrou um cenário mundial que inclui cadeias produtivas mais fragilizadas pela pandemia, tensões geopolíticas persistentes e um sistema multilateral em descrédito. 

No Brasil, discute-se o impacto sobre o fluxo de negócios com o exterior, mas pouco se vê, no debate público brasileiro, preocupação com as implicações sobre os preços internos da guerra comercial entre Estados Unidos e China, embora o efeito seja real e crescente, devido à vulnerabilidade do país a choques externos que impactam as cadeias de valor.

Ao elevar os custos de insumos e mercadorias globais o tarifaço trumpista pode acionar mecanismos de inflação importada — e, num país ainda marcado por juros altos e crescimento tímido, isso é muito mais que um detalhe. 

A imposição de tarifas sobre produtos chineses ameaça redirecionar o fluxo de mercadorias no mundo, criando gargalos em cadeias que envolvem metais, componentes eletrônicos e maquinário - itens com peso expressivo no custo da indústria brasileira.

Além disso, a pressão sobre commodities agrícolas pode se intensificar. A China tende a retaliar reduzindo importações dos EUA e buscando fornecedores alternativos - como o Brasil. A curto prazo, isso pode parecer positivo para o agronegócio nacional, mas a elevação nos preços internacionais de grãos, fertilizantes e energia cria pressão inflacionária interna, especialmente nos alimentos.

Outro problema: crises comerciais elevam a aversão a risco. Investidores fogem de mercados emergentes, valorizando moedas como o dólar. Um real mais fraco encarece as importações - de combustíveis a eletrônicos - e gera efeito cascata nos preços ao consumidor, já que a política monetária, nesse contexto, perde margem de manobra, pois um choque de oferta externo eleva a pressão por uma resposta de juros - mesmo com a economia desacelerando.

Ou seja: o tarifaço encarece a produção em escala global, e o Brasil, que depende fortemente de insumos importados para sua indústria, absorve parte dessa alta de custos.

Alguns analistas veem no tarifaço uma chance de o Brasil ocupar espaço nas exportações para a China, tese limitada, embora correta. O que se coloca em jogo é maior: um rearranjo das cadeias globais em que o custo da proteção nos EUA será, em parte, pago pelos países que têm menor poder de barganha.

Ao Brasil caberá agir com lucidez, estimulando a produção interna sem recorrer a subsídios ineficientes, monitorando a inflação com transparência, sem respostas automáticas, mas, acima de tudo, fortalecendo sua integração com mercados onde o multilateralismo resiste.

O tarifaço de Trump pode parecer um evento distante; seus reflexos no supermercado, na bomba de gasolina e no caixa do Banco Central, no entanto, são tão concretos quanto qualquer medida de política interna. A inflação importada é uma ameaça silenciosa. E, como tal, exige atenção imediata.