Alberto Oliveira

Por que a pior democracia é preferível à melhor das ditaduras

A pior das democracias ainda preserva o que é essencial para o desenvolvimento humano


É preciso defender a soberania popular exercida em liberdade
Imagem: ChatGPT AI

 

A clássica máxima de Winston Churchill, segundo a qual “a democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras que foram tentadas”, sintetiza um argumento poderoso: por mais imperfeita e suscetível a falhas que possa ser, a democracia oferece um arcabouço de proteção de direitos e participação cidadã que nenhuma ditadura é capaz de garantir.

Em tempos de polarização política, ascensão de líderes autoritários e questionamentos sobre a eficácia dos sistemas democráticos, torna-se urgente refletir sobre por que, mesmo nos seus piores momentos, a democracia é preferível à mais eficiente das ditaduras.

Podemos destacar 3 pontos:

1

Historicamente, os regimes democráticos surgiram como resposta aos abusos do poder absoluto. Na Grécia Antiga, a democracia ateniense, ainda que limitada a uma elite masculina, representou um marco na tentativa de estabelecer um governo de participação popular. Já na modernidade, as revoluções Americana e Francesa fincaram as bases para sistemas democráticos que, com o passar dos séculos, foram se expandindo para abranger direitos civis, políticos e sociais mais amplos.

2

Filosoficamente, pensadores como John Locke e Montesquieu defenderam a divisão de poderes e a necessidade de que os governantes sejam responsáveis perante os governados. A base ética dessa visão está na dignidade humana e na capacidade de escolha individual, elementos que, por definição, não podem ser plenamente respeitados em sistemas autoritários.

3

Mesmo regimes ditatoriais que promovem desenvolvimento econômico ou estabilidade política o fazem à custa de liberdades fundamentais. Esse tipo de governo, como demonstram os casos de desenvolvimento acelerado sob ditaduras na Ásia durante o século XX, eventualmente enfrenta crises estruturais justamente pela ausência de mecanismos de participação e crítica que poderiam corrigir seus excessos.

Do ponto de vista econômico, há um argumento frequente de que ditaduras podem ser mais eficazes na promoção do crescimento em curto prazo, especialmente quando conseguem centralizar recursos e implementar políticas sem os freios e contrapesos das democracias. Exemplos como o milagre econômico chinês ou o crescimento acelerado de Cingapura durante o governo de Lee Kuan Yew são frequentemente mencionados.

Contudo, é importante destacar que esses resultados são alcançados sob condições muito específicas e, geralmente, sem a garantia de que o desenvolvimento econômico será acompanhado por avanços sociais e políticos. Segundo dados do Banco Mundial, economias democráticas apresentam, em média, um PIB per capita superior a países autoritários no longo prazo, além de menor desigualdade social e melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Além disso, estudos recentes da Freedom House apontam que regimes democráticos apresentam níveis significativamente mais altos de inovação tecnológica e produção científica, justamente por promoverem liberdade acadêmica e diversidade de pensamentos. Essas características são essenciais para o desenvolvimento sustentável e para a adaptação em um mundo cada vez mais dinâmico.

Uma das características mais fundamentais da democracia é a proteção dos direitos humanos. Mesmo em sistemas democráticos frágeis ou corroídos por corrupção, existem mecanismos institucionais e civis que permitem denúncias, debates e, eventualmente, mudanças. A liberdade de expressão, de organização e de manifestação é essencial não apenas como um valor moral, mas como um meio de promover a justiça social e corrigir desigualdades.

Dados da Anistia Internacional mostram que países autoritários apresentam, em média, taxas de repressão política e censura muito superiores às encontradas em democracias, além de maiores dificuldades na promoção de reformas sociais inclusivas.

Além disso, o medo e a repressão são instrumentos frequentemente usados para garantir a estabilidade nesses regimes, gerando traumas sociais profundos que podem levar décadas para serem superados, mesmo após uma transição para a democracia.

A história mostra, à exaustão, que a pior democracia — aquela marcada por crises econômicas, corrupção ou ineficiência administrativa — ainda é preferível à melhor das ditaduras porque preserva aquilo que é essencial para o desenvolvimento humano: a liberdade de participação, de crítica e de mudança. Os mecanismos democráticos permitem ajustes graduais e pacíficos, enquanto as ditaduras, por definição, negam essa possibilidade.

Ao reconhecer as falhas das democracias contemporâneas, é fundamental compreender que seus defeitos podem ser corrigidos a partir dos próprios princípios democráticos. Já as ditaduras, mesmo quando eficientes, oferecem soluções que, por serem impostas e não negociadas, carecem da legitimidade e da sustentabilidade necessárias para promover o bem-estar genuíno da sociedade.

Mais do que um endossar a democracia é preciso defender seu princípio central: a soberania popular exercida em liberdade. Cabe à sociedade aprimorar os sistemas, não descartá-los em favor de promessas autoritárias que, por mais eficientes que possam parecer, não oferecem as garantias fundamentais que só a democracia é capaz de proporcionar.