Comportamento

Como lidar com traumas de crianças após ataques a escolas

Psicanalista Joseana Sousa avalia a importância do acolhimento

Em um intervalo de 10 dias, a mídia nacional noticiou dois casos de ataques brutais em escolas do País. Um deles aconteceu nesta terça-feira (5), quando um homem invadiu uma creche em Blumenau, Santa Catarina, matou 4 crianças que estavam no local e deixou outras seis feridas.

Outro caso aconteceu há pouco mais de 1 semana, em uma escola da zona oeste de São Paulo, quando um aluno de 13 anos invadiu a sala de aula e matou uma professora de 71 anos, com golpes de faca, além de ferir outras pessoas que estavam na instituição de ensino. Além da semelhança dos casos se dar pelos ataques brutais realizados, outra analogia está nas ações traumáticas que os casos deixam às crianças, famílias e corpo docente das instituições.

O medo, a insegurança, o luto e a tristeza em retornar às atividades podem tomar conta do consciente - e inconsciente - dessas pessoas sendo necessário uma ajuda profissional para lidar com essa situação. Joseana Sousa, psicanalista e especialista em desenvolvimento humano, comenta que uma das primeiras medidas a serem tomadas, principalmente, com as crianças é o acolhimento em casa e na escola. 

“Entender e saber como encarar os traumas é desafiador. Aprender a lidar com eles é indispensável para minimizar danos emocionais. No caso de crianças e adolescentes, a iniciativa parte dos pais, pois muitas das vezes, o trauma pode impedir aquela criança de prosperar, avançar nos estudos, na vida social, por ainda estar paralisado no que aconteceu, fazendo com que os seus olhos sempre estejam voltados para trás”, comenta a especialista. 

Joseana ainda alerta que a forma como cada um lida com traumas é relativa. Para superar ou pelo menos aprender com o que aconteceu, uma boa ideia é dedicar a algumas técnicas de autoconhecimento. Além dessa prática com auxílio de profissionais, uma rede de apoio, principalmente, voltada à escola também é uma iniciativa importante, de acordo com a especialista, afinal, mais pessoas vão conseguir compartilhar os mesmos medos e receios.

Como conselho aos pais, a psicanalista reforça que também é necessário perceber possíveis mudanças comportamentais nas crianças e adolescentes dentro de casa e o mais importante, não fomentar a raiva, o ódio após o ocorrido. “Assim, você vai machucar o que já está ferido e precisa ser trabalhado”, conta. 

Combate ao bullying e à violência na escola

O especialista em Comportamento e Comunicação, Eduardo Toledo, fala sobre bullying:

Dia 7 de abril é o dia nacional de combate ao bullying. Qual a sua opinião?
O bullying é considerado todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivação evidente, (referência Lei 13.185/2015), eu acredito que a prevenção para estes casos deve ser também repetitiva.

O que acontece muitas vezes é que a “figura de cuidado” dessa criança não a conhece e não se preocupa em conhecer melhor o dia a dia da criança.

Muitos quando observam acabam sendo omissos em não querer reconhecer, diagnosticar e tratar o que pode parecer diferente. Essa prevenção acontece tanto na escola, quanto em casa. E em casa a observação das atitudes, uso de celular, séries na TV, deve ser ainda maior.

Estamos vivendo um caos em relação a saúde mental, a exposição em redes sociais, “padrões de beleza”, filtros, onde pode acontecer Cyberbullying por exemplo. E ao mesmo tempo com esse avanço tecnológico muitos pais ou como tenho dito, “figuras de cuidado” têm se distanciado de seus filhos, tanto no aspecto carinho/atenção quanto em querer ser mais participativo na vida escolar. 

E muitas vezes uma criança na figura de “agressor/agressora” de bullying pode demonstrar comportamentos diferentes em casa e na escola, como por exemplo:

-- Não saber resolver seus problemas/conflitos com conversas
-- Sempre tem o instinto de querer ser superior aos demais
-- Não sabe lidar com seu nervosismo, com sua raiva
-- Quer mostrar aos outros que é mais forte, ou até mesmo liderar tudo e todos, impondo sempre suas vontades
-- Aparece com objetos novos em casa
-- Pode estar sempre desafiando o outro
-- Envolvimento em brigas constantes;

A partir de que idade a criança ou adolescente pode dar sinais de que está sendo vítima de bullying? Como os pais podem perceber?

Os casos de bullying podem começar desde cedo, quando a criança começa a ter convívio social/escolar com outras crianças. Ainda no começo da idade escolar pode ser atitude de ingenuidade, mas já começam casos de isolamento social, de brigas físicas por nervosismo, de perseguições, entre outros.

Casos mais evidentes começam a partir dos 7/8 anos e casos mais graves a partir dos 11/12 anos entrando na adolescência.

Os pais ou figura de cuidado devem observar alguns sinais de alerta:

-- Dificuldade de aprendizagem da criança;

-- Sinais de mudança emocional/comportamental como: tristeza, apatia, melancolia, ansiedade, pânico; agressividade; solidão.

-- A criança começa a evitar ou não desejar ir à escola, inventando desculpas que precisam ser investigadas.

-- Outras evitam até convívio em festas, reuniões, clubes etc.

-- Dificuldade em contar sobre o dia de aula, problemas, brigas.

-- Alguns apresentam sinais de mudança até de apetite, comendo muito o evitando comer.

-- Sudorese

-- Dificuldades no sono, pesadelos.

E muitas vezes a criança sozinha no quarto, quieta é preciso saber o que está acontecendo, muitos acabam achando que não é nada, pelo contrário, sinal de uma criança “boazinha”, mas é necessário saber se não há nada por trás dessa solidão.

E temos casos graves de crianças com depressão, automutilação, suicídio. Bullying é grave e é necessário cada vez mais a escola e família trabalharem juntos na prevenção.

Existe algum teste ou perguntas que se pode fazer em casa para detectar se o filho está com algum problema?

Sempre estimular o diálogo, ver o caderno, independente se há tarefa para ser realizada ou não. Estimular a criança a contar do seu dia com detalhes. Perguntas que façam com que ela responda além do “Sim ou Não”, “Bom ou Ruim”, que realmente ela possa falar mais, perguntas abertas. Saiba os nomes e quem são os melhores amigos/amigas. Pergunte se observou algo diferente, se tem algum amigo/amiga precisando de ajuda.

Complemento reforçando algo muito importante, o Bullying existe por ter 3 personagens: Agressor/Vítima e testemunhas. E muitas vezes a criança não é agressor e nem vítima, porém ela está assistindo algum amigos sofrendo por uma agressão, física ou psicológica, e por medo de se tornar a “próxima vítima” essa criança testemunha evita exposição, perguntar ao professor alguma dúvida, e acaba rindo ou aplaudindo o sofrimento do outro para ele/ela não se tornar a próxima. E nesse caso sugiro que seja concentrado os esforços de prevenção, porque se não há plateia para rir/assistir/apoiar casos de bullying, o agressor/agressora perde a força e a vítima não sofre por ver seus amigos/amigas rindo da ser sofrimento. Isso serve tanto para os pais/figuras de cuidado como para funcionários da unidade escolar.

As escolas, os professores, o que podem fazer para evitar?
Capacitação sempre da escola, e isso eu digo para todos os funcionários da escola. Porque muitas vezes um caso de bullying pode começar por uma piada ou algo que um funcionário/professor fala na escola. Isso acontece na família também, casos de bullying fomentados dentro de casa.

É necessário estimular cada vez mais os trabalhos em grupo, a comunicação e o respeito pelo outro.

Pode até mesmo trabalhar com ludicidade (teatro, música, artes) e utilização de jogos para falar do tema.

A escola deve ao máximo observar de forma preventiva tudo que acontece em sala de aula e nos pátios. Existem algumas pesquisas que alunos afirmar observar casos de bullying mais dentro da sala de aula do que nos pátios/ambiente externo.

Quais dicas você pode passar para prevenir o bullying atualmente?
Estimular o trabalho em grupo, amizade e o respeito pelo outro; atuando fortemente com as testemunhas/plateia;

Mostrar cada vez mais as consequências do bullying, não só para os alunos e sim para a família entender a gravidade e não estimular em casa falas como: “Se apanhar na escola, em casa apanhará novamente”;

-- Promover um verdadeiro diálogo em casa e na escola;

-- Na escola ter uma urna, aplicativo, telefone, para denúncias de casos de bullying ou outro tipo de agressão, assédio;

-- Capacitar todos os funcionários da instituição escolar para saber como diagnosticar, tratar e combater a casos de bullying;

-- Comunicar sempre os pais/figuras de cuidado sobre o que está acontecendo.