Ao lado do Passeio Público de Salvador fica o belo Palácio da Aclamação (assim denominado em homenagem à República), que foi ocupado como residência oficial dos governadores da Bahia desde 1917 até 1967.
Para transformá-lo na residência governamental foi realizada uma reforma e ampliação ainda na primeira década do século XX. E essa história começa de uma forma trágica: o bombardeio de 10 de janeiro de 1912.
Naquele ano, lutas políticas entre o governo federal, o governo estadual e lideranças políticas baianas, como Ruy Barbosa, Otávio Mangabeira, Luiz Viana, José Joaquim Seabra e outros, culminaram no bombardeio da cidade pelos fortes de São Pedro, do Barbalho e de São Marcelo, que durou cerca de quatro horas.
O resultado foi a destruição parcial do Palácio Tomé de Sousa (atual Palácio Rio Branco), com a perda do acervo da Biblioteca Pública e do Arquivo Público da Bahia, que funcionavam no mesmo edifício, danos ao prédio da Câmara Municipal e em outras edificações.
A cidade sofreu ainda pelo conflito entre as polícias estaduais e as tropas do exército, com baixas de civis e militares, vandalismo e fugas de presos da penitenciária, uma verdadeira guerra que durou mais de um mês. Nesse imbróglio, após renúncias e manobras políticas, J. J. Seabra foi eleito governador.
Palácio do governo destruído pelo bombardeio (1912)
O governador anterior, João Ferreira de Araújo Pinho, havia comprado, em 1911, o Palacete dos Moraes situado ao lado do Passeio Público, para instalação de algumas repartições públicas, contudo, após o bombardeio do Palácio do Governo, ele se tornou a residência oficial dos governadores.
O projeto de reforma e ampliação foi elaborado pelo engenheiro italiano Filinto Santoro, e a obra durou cinco anos.
Na primeira fotografia, abaixo, vemos o Palacete Moraes antes da ampliação. E qual foi o projeto de Santoro?
Bem, na segunda fotografia vemos a fachada do palácio como ficou após a ampliação, que corresponde ao corpo central e à ala esquerda, assinalados em vermelho na vista aérea.
A ampliação tomou uma parte do Passeio Público o que foi bastante criticado por políticos e intelectuais da época.
Fachada do Palacete dos Moraes e o Palácio da Aclamação com suas dimensões finais
Em 1913, o obelisco do Passeio Público, erguido em 1815 em homenagem à família real, foi transferido para a Praça da Aclamação. Seabra deixou o governo em 1916 sem concluir as obras do palácio, que foi inaugurado em 1917 pelo seu sucessor, Antônio Muniz Sodré de Aragão.
A arquitetura do Palácio da Aclamação reflete uma época de ruptura com a herança colonial portuguesa, que se caracterizou por ações de reformas urbanas cujo intuito era demolir grandes áreas urbanas em cidades como Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Recife, para definir um novo desenho voltado ao que a modernidade estava a oferecer: transporte público urbano (bonde elétrico); expansão das ferrovias; iluminação elétrica e meios de comunicação e industrialização. Ao lado disso, dever-se-ia eleger uma nova arquitetura, agora, sob influência francesa e italiana.
O Ecletismo, então, tornou-se a linguagem arquitetônica das obras públicas, bem como das famílias abastadas. Reformas internas e externas inseriram elementos ornamentais como colunas, flores, guirlandas e estátuas, além de luxo e conforto, assim, como diz Andrade Junior (2007), refletindo “[...] referências simultâneas às diversas vertentes histórico-geográficas da arquitetura europeia, como o barroco francês ou o renascimento italiano.”
Ao analisarmos a fachada frontal do Palácio da Aclamação vemos que ela é dividida em três partes: duas alas e um corpo central, que é um pouco avançado em relação ao resto do edifício.
O edifício tem um embasamento, o pavimento térreo, mais elevado em relação ao nível da rua, e o pavimento superior.
No pavimento térreo, as janelas de verga reta são ornadas com cornijas e cartelas e abaixo dos peitoris, folhagens delicadas.
As janelas do pavimento superior também têm ornamentos, e há três janelas de verga em arco pleno no centro de cada ala. As platibandas das alas têm no centro um frontão triangular.
O corpo central do edifício tem janelas de verga reta e de arco pleno. Colunas com capiteis enfeitam o pavimento superior, que é coroado com platibanda reta.
O edifício é separado do Passeio Público por um muro enfeitado com bustos de mulheres.
Fachada frontal e muro que separa o palácio do Passeio Público.
Em 1967 o governador Antônio Lomanto Junior transferiu a residência oficial para o Palácio de Ondina, antiga residência do administrador do Campo de Experiências Botânicas, ao lado do Jardim Zoológico, mas o Palácio da Aclamação continuou a ser utilizado esporadicamente pelo Governo do Estado em algumas solenidades.
O palácio é um museu-casa e possui um acervo de bens móveis composto de mobiliário, porcelana, quadros, tapetes persas e franceses, pinturas de paredes e forros do baiano Presciliano Silva. Atualmente o espaço também é utilizado para eventos privados.
Em 2010 o Palácio foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Artísitico e Cultural da Bahia (IPAC). No entanto, a proteção não se estendeu ao Passeio Público nem à Praça da Aclamação, e mesmo que sejam espaços contíguos ao edifício tombado eles são elementos urbanos que contam a história do uso do espaço público e mereciam um cuidado maior tanto do poder municipal quanto do governo do estado.
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Para saber mais
ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira de Andrade. A Influência Italiana na Modernidade Baiana: o caráter público, urbano e monumental da arquitetura de Filinto Santoro. 19&20, Rio de Janeiro, v. I, n. 4, out. 2007. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/arte%20decorativa/ad_fs_vnaj.htm>.
PUPPI, Suely de Oliveira Figueirêdo. A arquitetura monumental de Salvador no início do século XX: Uma resposta local a um processo internacional. 19&20, Rio de Janeiro, v. IV, n.4, out. 2009. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/arte%20decorativa/ad_spuppi.htm>.