Um comboio de veículos militares blindados irá passear pelos arredores do Congresso Nacional nesta terça-feira, 10, pela manhã. O desfile de tanques e armamentos é um evento programado pela Marinha do Brasil para o mesmo dia em que está prevista a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso no plenário da Câmara.
A PEC tem sido motivo para declarações antidemocráticas e ameaças do presidente da República Jair Bolsonaro. A proposta já foi derrotada na comissão especial que avaliava o tema, mas, mesmo assim e diante da insistência de Bolsonaro, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu levar a questão para o plenário, em que será votada pelos 513 deputados.
De acordo com nota divulgada pela Marinha, a iniciativa faz parte da Operação Formosa, um treinamento militar realizado desde 1988 e que este ano, pela primeira vez, contará também com a participação do Exército Brasileiro e da Força Aérea Brasileira.
"Nesta terça-feira (10/8), pela manhã, comboio com veículos blindados, armamentos e outros meios da Força de Fuzileiros da Esquadra, que partiu do Rio de Janeiro, passará por Brasília, a caminho do Campo de Instrução de Formosa (CIF). Na oportunidade, às 8h30, no Palácio do Planalto, serão entregues ao Presidente da República, Jair Bolsonaro, e ao Ministro da Defesa, Walter Souza Braga Netto, os convites para comparecerem à Demonstração Operativa, que ocorrerá no dia 16 de agosto, no CIF", diz a nota
A coincidência dos eventos provocou preocupação no Parlamento. "Sobre essa história de tanques nas ruas. Não quero crer que isso seja uma tentativa de intimidação da Câmara dos Deputados, mas, se for, aprenderão a lição de que um Parlamento independente e ciente das suas responsabilidades constitucionais é mais forte que tanques nas ruas", escreveu no Twitter o vice-presidente do Congresso, deputado Marcelo Ramos (PL-AM).
Nota da Marinha
Realizada desde 1988, a Operação Formosa é o maior treinamento militar da Marinha do Brasil no Planalto Central. Este ano, a operação, pela primeira vez, contará também com a participação do Exército Brasileiro e da Força Aérea Brasileira.
Nesta terça-feira (10/8), pela manhã, comboio com veículos blindados, armamentos e outros meios da Força de Fuzileiros da Esquadra, que partiu do Rio de Janeiro, passará por Brasília, a caminho do Campo de Instrução de Formosa (CIF). Na oportunidade, às 8h30, no Palácio do Planalto, serão entregues ao Presidente da República, Jair Bolsonaro, e ao Ministro da Defesa, Walter Souza Braga Netto, os convites para comparecerem à Demonstração Operativa, que ocorrerá no dia 16 de agosto, no CIF.
A Operação Formosa tem o propósito principal de assegurar o preparo do Corpo de Fuzileiros Navais como força estratégica, de pronto emprego e de caráter anfíbio e expedicionário, conforme previsto na Estratégia Nacional de Defesa.
Este ano, a Operação Formosa envolverá mais de 2.500 militares, da Marinha, do Exército e da Força Aérea, que simularão uma operação anfíbia, considerada a mais complexa das ações militares, empregando mais de 150 diferentes meios, entre aeronaves, carros de combate, veículos blindados e anfíbios, de artilharia e lançadores de mísseis e foguetes. Foram transportadas 1.500 toneladas de equipamentos do Rio de Janeiro para Brasília, num deslocamento de mais de 1.400 km.
Militar do Exército em comboio - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Diante das suspeitas provocadas pelo inédito desfile bélico que passará na frente do Palácio do Planalto na manhã desta terça-feira, 10, o presidente Jair Bolsonaro usou as redes sociais com o objetivo de convidar presidentes de Poderes para assistir às manobras militares. Na mensagem, Bolsonaro se apresenta como "Chefe Supremo das Forças Armadas". O anúncio da presença de um comboio de tanques na Praça dos Três Poderes provocou protestos porque a operação vai ocorrer justamente no dia em que a Câmara votará a proposta de emenda à Constituição que institui o voto impresso.
"Sr. Presidente do ... STF, Câmara Federal, Senado, TCU, TSE, STJ, TST, Deputados, Senadores... : Como ocorre desde 1988, a nossa Marinha realiza exercícios em Formosa/GO. Como a tropa vem do Rio, Brasília é passagem obrigatória. Muito me honraria sua presença amanhã na Presidência (08h30), onde receberei os cumprimentos da Força e lhes desejarei boa sorte na missão", escreveu Bolsonaro.
Para chegar a Formosa, no entanto, não é necessário passar pelos arredores do Congresso. Além disso, a Operação Formosa - promovida pela Marinha desde 1988 - tradicionalmente não incluía, como nesta edição, o Exército e a Aeronáutica.
Divulgado pela Marinha como uma deferência a Bolsonaro, o desfile bélico provocou críticas de parlamentares, que se sentiram intimidados.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), classificou como "trágica coincidência" a realização do desfile bélico nas proximidades do Congresso. "Não é usual", afirmou Lira sobre o exercício militar, em entrevista ao site O Antagonista. "E, não sendo usual, em um País polarizado do jeito que o Brasil está, isso dá cabimento para que se especule (tratar) de algum tipo de pressão. Entramos em contato com o Palácio do Planalto, falei com o presidente (Bolsonaro) e ele garantiu não haver esse intuito".
Nas últimas semanas, Bolsonaro fez duros ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Não foi só: xingou o presidente do TSE, Luis Roberto Barroso, de "filho da p..." por sua posição contrária ao voto impresso; acusou fraudes nas urnas eletrônicas sem apresentar quaisquer provas; afirmou que o ministro Alexandre de Moraes era a "mentira" no STF e disse haver um "complô" para eleger o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), hoje líder nas pesquisas de intenção de voto, em 2022. Com tantos insultos, o presidente do Supremo, Luiz Fux, cancelou a reunião entre os Poderes, que estava prevista para os próximos dias.
"Tanques na rua, exatamente no dia da votação da PEC do voto impresso, passou do simbolismo à intimidação real, clara, indevida, inconstitucional. Se acontecer, só cabe à Câmara dos Deputados rejeitar a PEC, em resposta clara e objetiva de que vivemos numa democracia e que assim permaneceremos", criticou a senadora Simone Tebet (MDB-MS).
Na avaliação da deputada Perpétua Almeida (PC do B-AC), integrante da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Bolsonaro quer fazer do treinamento militar um espetáculo político. "Há homens fracos e frouxos que usam da força para mostrar poder. Bolsonaro é desses. Mais uma vez usa as instituições militares para impulsionar seu projeto anarquista de poder", criticou Perpétua. "É um necessário exercício da Marinha, mas que Bolsonaro transforma num espetáculo político, quando o traz pra Esplanada, com clara intenção de aumentar especulações."
O objetivo da Operação Formosa é treinar militares da Força de Fuzileiros da Esquadra, sediada no Rio. Mesmo entre eles, porém, a manobra é vista como uma forma de intimidação por demonstrar a capacidade de fogo, um "instrumento de dissuasão" na linguagem da caserna.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse que recorreu à Justiça para impedir "gasto de recursos públicos em uma exibição vazia de poderio militar". "As Forças Armadas, instituições de Estado, não precisam disso. Os brasileiros, sofrendo com as consequências da pandemia, também não. O Brasil não é um brinquedo na mão de lunáticos", afirmou Vieira.
O treinamento reunirá militares das três Forças. O adestramento ocorrerá no Campo de Instrução de Formosa, em Goiás. Os fuzileiros fazem simulações de guerra, com aviões, paraquedistas, helicópteros, blindados, anfíbios, bateria antiaérea, detonação de explosivos, descontaminação por agentes químicos, nucleares, biológicos e bacteriológicos.
A área de cerrado pertence ao Exército e é cedida à Marinha por ser a única do País em que é possível realizar esses exercícios com uso de munição real.
Partidos divulgam nota
Nove partidos divulgaram nota de repúdio ao desfile militar em Brasília. Para as legendas, diante das sucessivas acusações do presidente Jair Bolsonaro contra os Poderes e da votação do projeto do "voto impresso" também nesta terça-feira, "o desfile é uma clara tentativa de constrangimento ao Congresso Nacional".
"Estranhamente, e diferente das edições anteriores, é a primeira vez que o convite é feito com um ostensivo e desnecessário desfile de blindados militares, injustificável e reprovável por várias razões de interesse sanitário público", declara a nota, relembrando a marca de quase 600 mil mortes por covid-19 no País As siglas classificam como "inaceitável" a utilização e exposição das Forças Armadas, "ainda que permitam", "para sugerir o uso de força em apoio à proposta antidemocrática e de caráter golpista, defendida pelo presidente da República".
"Neste momento em que o Brasil acumula a trágica marca de quase 600 mil mortes, não tem sentido expor pessoas, inclusive os militares, promover aglomeração e gastar recursos públicos com tal atividade", diz o texto. Em meio à crise sanitária e alta taxa de desemprego e fome, as siglas pedem o compromisso com a defesa dos "verdadeiros interesses" dos brasileiros.
"O povo não quer ver desfile de tanques de guerra, quer vacina no braço, respeito à democracia e instituições e governantes que trabalhem para gerar empregos e para acabar com a fome no país "
A nota é assinada pelo PSB, PCdoB, PDT, PT, REDE, PSOL, PSTU, Solidariedade e Unidade Popular.