A pauta é monotemática, tem que ser, pois o tema é relevante por todos critérios de noticiabilidade: interesse público, atualidade, abrangência, risco para a vida etc.
Os profissionais do jornalismo prestam um serviço tão importante quanto o dos profissionais de saúde.
No entanto, se o médico, o enfermeiro, o recepcionista e o vigilante do hospital e do posto de saúde têm que se locomover pela cidade, e aí também necessitam do motorista de ônibus, de táxi etc., para estar lá atendendo quem precisa, os jornalistas, pelo menos em algumas situações, poderiam se valer de estratégias para se proteger, preservar as fontes e, por tabela, seus familiares e a população de um modo geral.
Se, pelo aparato técnico necessário, é complicado abrir mão da presença do apresentador e do cinegrafista no estúdio, o mesmo não se pode dizer dos produtores e editores que estão nas redações e que poderiam estar fazendo seu trabalho de casa. A tecnologia permite.
Também não consigo entender por que o infectologista, o secretário de saúde e qualquer outro entendido do assunto têm que sair da sua casa para falar sobre os riscos da propagação do vírus e recomendar que as pessoas fiquem em casa. Isso numa era em que qualquer adolescente faz uma live no YouTube e no Instagram usando um celular ou uma webcam. Sem falar na possibilidade de usar o bom e velho telefone, exibindo na tela a foto do rosto da fonte para que a gente possa ver a cara do cidadão enquanto ele dá a entrevista.
A imagem não seria a mesma, a qualidade do som tampouco, mas será que não valeria a pena o sacrifício em nome de uma causa maior e da autoproteção?
E o microfone do repórter passa de uma boca para outra numa matéria que fala sobre como se contrai o maldito vírus.
Qual a necessidade de o jornalista ir para a rua gravar uma passagem no local falando do primeiro caso de morte por coronavírus em Niterói como eu vi ontem? Não daria para usar imagem de arquivo, pedir para alguém gravar da janela as mesmas imagens que ele mostrou da rua deserta, dos equipamentos de ginástica lacrados para não serem usados pela população. É imprescindível esse atestado da imagem perfeita para comprovar que aquilo é verdade?
Se não é falta de bom senso, no mínimo, é de criatividade. Quer fazer uma matéria sobre o que os pais estão fazendo para entreter as crianças em casa, por que não criar uma chamada pedindo para a galera mandar vídeos para a redação? Isso promoveria interação ainda por cima. Mas não, o repórter e o cinegrafista vão até a casa da fonte, entram no quartinho das crianças, muito provavelmente sem nem tirar os sapatos, e conversam de perto com a mãe e com os filhos pequenos.
Numa situação de exceção, não seria louvável quebrar a rotina, sacrificar um pouco que seja o padrão de qualidade e dar também o exemplo daquilo que se quer passar como informação de utilidade pública?