O cantor e compositor baiano Raul Seixas foi uma usina de criação. Viveu tão intensamente que, aos 44, quando morreu, deixou uma das obras mais marcantes da música brasileira.
Seus versos e suas melodias são facilmente reconhecidos até mesmo pelas novas gerações de fãs do rock nacional que pedem: toca Raul!
Sua trajetória foi igualmente agitada. Alguns destes episódios ganham cores vivas em Raul Seixas – Por trás das canções, fruto de pesquisa do roteirista e jornalista Carlos Minuano, que teve um estalo depois de ouvir Ê, meu pai: “Se eu me sentir sozinho/ Ou sair do caminho/ E a dor vier de noite/ Me assustar/ E se eu perder coragem/ Pra seguir viagem/ A fé que me faltar/ Eu vou buscar com você, meu pai!”
O que estaria por trás daqueles versos? Assim, Minuano foi atrás de familiares, amigos e colegas para revelar o que os bastidores de algumas de suas canções mais famosas revelam.
A biografia Raul Seixas – Por trás das canções chega às livrarias no ano em que a morte de Raul completa três décadas. No livro, Minuano revela a verdadeira razão por trás da ausência de Raul Seixas na edição inaugural do festival Rock in Rio, que o levou a comentar com um amigo: “Como podem convidar o Ivan Lins, a Elba Ramalho e ainda chamarem o Erasmo Carlos de rei do rock brasileiro?” E completou: “Eu sou o quê, porra?”.
“Eu sei que determinada rua que eu já passei
Não tornará a ouvir o som dos meus passos
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos
E que nunca mais eu vou abrir”
(“Canto para minha morte”, de Raul Seixas e Paulo Coelho, faixa do álbum Há 10 mil anos atrás, lançado pela Philips em 1976.)
A canção “Canto para minha morte”, composta por Raul e Paulo, foi inspirada no tango “Balada para un loco”, do argentino Astor Piazzolla.
Raul Seixas – Por trás das canções apresenta aos fãs e leitores a caderneta escolar do colégio Marista, manuscritos, documentos e imagens do famoso baú do Raul, de indumentárias e de uma inusitada fronha de travesseiro usado na infância que inspirou o hit Mosca na sopa.
A galeria de fotos inclui raras imagens de Raul Seixas em pleno garimpo no Sul do Pará, em plena selva Amazônica, feitas pela fotógrafa Cristina Villares.
O cantor visitou a região Norte para promover uma miniturnê, batizada Ouro de tolo.
Regada de álcool e drogas, Raul e seus companheiros começaram a aventura em plenos ares na cabine de um monomotor. Fã de Raul Seixas, o piloto permitiu que o cantor e o guitarrista Tony Osanah pilotassem o avião. Para completar, foram recebidos em Marabá com uma saraivada de balas de garimpeiros fortemente armados. Imagens inéditas feitas pela fotógrafa Cristina Villares completam o relato deste episódio.
Além dos parceiros mais próximos como Paulo Coelho e Marcelo Nova, a biografia explora também a relação do roqueiro baiano com o jogador Walter Casagrande, que promoveu dois shows de Raul em sua curta carreira de produtor.
O autor de Raul Seixas – Por trás das canções também passeia por episódios como o provável entrevero com Silvio Santos e da amizade com Jerry Adriani.
Ao longo da narrativa, Minuano transcreve trechos de de 50 canções do ba, entre elas a primeira composição Oh por quê?, que não chegou a figurar em nenhum disco, uma homenagem Esther Judith, uma lourinha de olhos azuis, que se tornaria sua primeira esposa. Não apenas os amores como também algumas rusgas acabaram se tornando música. As notórias cutucadas nos conterrâneos tropicalistas estão em Rock’n’roll e Tapanacara.
A canção “Doce, doce amor”, de Raul Seixas, gravada por Jerry Adriani no álbum Pensa em mim, de 1971, foi um de seus maiores sucessos e não parece, à primeira vista, conter nenhuma mensagem além de um lamento romântico, bem típico do cancioneiro da Jovem Guarda. Só que ela é bem mais do que isso.
Segundo Jerry, por trás da aparente balada de amor existe o lamento indignado diante da promulgação do AI-5, que iniciou um dos ciclos mais nefastos da ditadura militar no Brasil. A canção foi apresentada a ele uma semana após o anúncio do decreto, conforme a própria letra descreve: “Está fazendo uma semana que sem mais e nem menos eu perdi você”.
“Doce, doce amor,
Onde tens andado,
Diga por favor,
Doce, doce amor,
Doce, doce amor,
Que eu vou te encontrar,Meu bem seja onde for.
Está fazendo uma semana,
Que sem mais e nem menos eu perdi você,
Mas não sei determinar ao certo,
Qual foi a razão meu bem vem me dizer”
(“Doce, doce amor”, de Raul Seixas, gravada por Jerry Adriani no álbum Pensa em mim, lançado em 1971 pela CBS.)