Com quantos anos se faz uma ativista ambiental? Para alguém que desde pequena pôde ver de perto os efeitos das mudanças climáticas, não é preciso mais do que 12.
A surfista baiana Catarina Lorenzo marcou presença em um dos maiores protestos pelo clima na história e, ao lado de mais 15 jovens, incluindo a sueca Greta Thunberg, assinou uma denúncia contra o Brasil e outros quatro países no Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças.
A ação foi apresentada em Nova York, em 23 de setembro, dois dias após o contundente discurso de Greta na cúpula climática da ONU, e também questiona Alemanha, Argentina, França e Turquia. Juntos com o Brasil, esses países são os cinco maiores poluentes de um grupo de 45 signatários de um protocolo que autoriza menores de idade a assinarem petições contra violações da Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Crianças.
Segundo a denúncia, a incapacidade desses Estados de enfrentar a crise climática constitui uma "violação dos direitos" de crianças e adolescentes. No texto, os 16 jovens ainda exortam o comitê a obrigar os cinco países a atuarem para proteger os menores dos efeitos "devastadores" do aquecimento global.
A iniciativa é da ONG americana Earth Justice e também reúne jovens de África do Sul, Argentina, Alemanha, Estados Unidos, França, Ilhas Marshall, Índia, Nigéria, Palau e Tunísia, além de Brasil e Suécia.
Catarina se juntou à petição por intermédio da entidade Heirs To Our Oceans, que havia descoberto a jovem por meio de uma amiga sua na Califórnia.
"Ela contou minha história, e eles viram que eu mesma passei pelas mudanças climáticas pessoalmente, que eu percebi que tinha que acabar com as mudanças climáticas", conta a adolescente, em entrevista à ANSA.
A surfista relata que sua história mais impactante ocorreu quando ela nadava em uma piscina natural rodeada de corais.
"Um dia, eu estava nadando e cheguei perto desse coral grande no meio, e esse coral estava cheio de pontos brancos, o que quer dizer que ele está morto. E quando cheguei mais perto, o coral estava sem alga nenhuma, e a água estava muito quente. Eu mergulhei, toquei na areia, e quando eu faço isso a água vai esfriando, mas a água continuou quente, tão quente, que eu tive que sair. Se eu não aguentei ficar na água, como os peixes, animais marinhos e corais aguentariam ficar?", questiona.
Esse episódio ajudou a cristalizar o ativismo ambiental em Catarina, que também se incomoda com os rumos de sua cidade, Salvador. O esgoto jogado no mar, o projeto de construção de uma avenida no meio de uma floresta chamada Vale Encantado e a canalização do rio Jaguaribe explicam o caminho de uma jovem surfista baiana até Nova York.
"Meu pai é surfista e desde pequeno tem uma conexão muito grande com o mar, me levava para o mar, me levava para surfar. E desde então sempre tive uma conexão com o oceano. Tem uma floresta em Salvador que se chama Vale Encantado, e um grupo que se chama SOS Vale Encantado. O governo queria construir uma avenida na floresta, e a gente foi para as ruas, protestou, conseguiu fazer com que eles não construíssem a avenida. Então, desde pequena, por parte de mãe e de pai, sempre tive essa conexão com o meio ambiente, de sempre querer proteger, estar sempre lá com ele. E desde pequena minha família me incentivou", diz.
Mas nada se compara às manifestações pelo clima que tomaram cidades do mundo inteiro em setembro. "A maior greve que eu fui para a rua foi em Nova York. Eu fiquei impressionada com o tanto de gente, o mundo inteiro foi para as ruas falar sobre as mudanças climáticas. Eles perceberam que as mudanças climáticas estão acontecendo e são uma coisa muito perigosa", afirma.
Culpa dos adultos
Catarina, assim como Greta Thunberg, não usa meias palavras e não faz questão de ser política em seu discurso. Em sua visão, crianças e adolescentes como ela pagarão pelos problemas que os adultos criaram no passado e continuam criando no presente.
"Os adultos conseguiram criar o problema, e pelo visto poucos estão do nosso lado, então já que eles não vão fazer nada, nós queremos atuar para não sofrer as consequências no futuro, porque queremos ter um futuro. Eles tiveram o futuro deles, nós queremos ter o nosso próprio futuro. São as crianças que não vão poder tomar banho de rio, não vão poder tomar banho de mar, vão ter dificuldade para respirar, vão perder suas casas, não vão ter água porque as chuvas vão diminuir, não vão poder plantar e colher suas próprias comidas", diz Catarina, com uma indignação que cresce e atropela as palavras enquanto ela fala.
Para a surfista, os governos deveriam fazer mais pelo futuro das crianças e apoiar quem quer ajudar o meio ambiente, inclusive por meio do incentivo à plantação de árvores e ao estudo das mudanças climáticas nas escolas. Mas, de acordo com ela, o futuro não depende apenas do poder público.
"Um dos maiores passos", diz Catarina, "é que todo mundo perceba e não se acostume a viver na poluição". Em seguida, faz um apelo às novas gerações, àqueles que, como ela, não aceitam que o planeta continue como está.
"Eu gostaria que todas as crianças entendessem que elas têm direito a um futuro e que o futuro delas e o próprio presente já estão sendo afetados pelas mudanças climáticas. Só que no futuro estará bem pior, e no futuro não terá como voltar atrás e acabar com isso. Gostaria que elas começassem a atuar e fazer algo agora. Gostaria que elas nos ajudassem a convencer mais adultos a estarem do nosso lado. Quanto mais gente e mais ajuda, melhor para nós, porque vamos conseguir, todos juntos, acabar com as mudanças climáticas e ter direito de ter nosso futuro e ser feliz", conclui a surfista, agora com o tom de quem sabe que pode mudar o mundo.