A confiança é o ativo intangível central de qualquer intermediário financeiro. Quando ela se deteriora, agentes que fornecem liquidez -- correntistas, corretoras, agentes comerciais e distribuidores de produtos financeiros -- podem retirar sua exposição ou interromper a intermediação.
Essa retirada amplia a desconfiança e incentiva uma corrida dos correntistas, em busca de salvar os recursos depositados naquela instituição bancária, o que provoca uma súbita escassez de recursos disponíveis para enfrentar saques, honrar garantias e rolar dívidas de curtíssimo prazo. A perda de liquidez força vendas descontadas de ativos, deterioração do balanço patrimonial e, se não houver intervenção eficiente, insolvência e liquidação da instituição.
Forçada a vender ativos a preços deprimidos para atender saques e chamadas de margem, a instituição realiza perdas que corroem o capital próprio. A deterioração patrimonial reforça a percepção de insolvência e atrai mais retiradas e menos contrapartes dispostas a operar, até chegar à inviabilidade. Em fases avançadas, o único remédio é intervenção pública (garantia, liquidez de emergência, nacionalização) ou a venda rápida da instituição a preço fortemente descontado.
Esse cenário devastador é conhecido dos baianos.
Há exatos 30 anos, em agosto de 1995 o Banco Central decretou intervenção no Banco Econômico, o sexto maior do País, dando início a regime de liquidação extrajudicial. A instituição bancária baiana vinha perdendo rapidamente a capacidade de assegurar financiamento estável.
Há muitos exemplos clássicos no mundo. Em 2007, por exemplo, o Northern Rock, do Reino Unido, sofreu uma série intensa de retiradas e, em setembro daquele ano, diante do congelamento de mercados interbancários, perdeu acesso a financiamento de curto prazo; isso levou a uma corrida de depósitos de varejo e, por fim, à nacionalização.
Em março de 2008, o Bear Stearns, dos Estados Unidos, teve que ser socorrido pelo FED-Federal Reserva (banco central americano) e vendido para o JPMorgan.
Em setembro do mesmo ano foi a vez do poderoso Lehman Brothers, também nos Estados Unidos, abatido pela incapacidade de rolar sua dívida de curtíssimo prazo, e por uma retirada importante de suporte por contrapartes, que transformaram os problemas de solvência em insolvência efetiva. O colapso desencadeou forte contágio global.
A perda de confiança não é apenas um problema reputacional: é um mecanismo econômico que pode rapidamente produzir um colapso de liquidez e subsequente insolvência. O padrão é repetido globalmente -- embora com atores e canais distintos em cada caso.
Um dos fatores que contribuem para a perda de confiança no setor bancário é a insegurança jurídica -- imprevisibilidade das regras, aplicação instável da lei, decisões judiciais contraditórias, possibilidade de alterações das regras contratuais durante a vigência dos contratos, fraca proteção de direitos, etc.
No mercado financeiro isso se traduz em aumento do risco legal e político, o que eleva prêmios de risco, e reduz a disposição de depositantes, investidores institucionais e contrapartes de atacado em manter exposição a uma instituição ou a um país.
Estudos aplicados ao Brasil e a países da América Latina mostram que insegurança jurídica afeta a recuperação de crédito e aumenta spreads bancários.
É a diferença entre o juro que o banco cobra de quem toma dinheiro emprestado (empréstimos, financiamento, crédito) e o juro que o banco paga a quem lhe deixa dinheiro (depósitos, cadernetas, conta poupança). Em termos simples: é a margem que o banco obtém entre o preço de venda do dinheiro e o custo de aquisição desse dinheiro.
Como a insegurança jurídica torna a operação bancária mais cara e arriscada
Aumento do custo -- Provedores de liquidez exigem maior retorno para correr risco jurídico; bancos pagam spreads maiores e, frequentemente, reduzem concessão de crédito.
Concentração de retiradas -- Depositantes e contrapartes reagem mais rápido do que o capital pode ser recomposto, transformando um problema de liquidez em insolvência.
Desalavancagem forçada -- Impossibilidade de rolar financiamento de curtíssimo prazo força vendas de ativos a preços sacrificados, corroendo capital e ampliando o pânico.