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Conheça a lenda de Yemanjá

Yemanjá é altiva, corajosa, apaixonada, obstinada, produtiva, inflexível, adaptativa, protetora, e às vezes arrogante

Foto: Janduari Simões

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Cobertura da Festa de Yemanjá:
Doris Pinheiro, Monalisa Leal, Rosana Andrade, Morgana Montalvão, Felipe Belmonte, Antonio Muniz, Iven Vit, Luiz Paulo San Martin, Roberto Aguiar, Djair Sant'Anna, Gina Marocci, Alberto Oliveira

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Yemanjá é altiva, corajosa, apaixonada, obstinada, produtiva, inflexível, adaptativa, protetora, e às vezes arrogante. É justa, mas possui um grande senso de hierarquia de comando. Impõe respeito, é formal; mas também uma amiga fiel e dedicada. Maternal, dificilmente perdoa uma ofensa. É vaidosa, mas não a extremos... É a mãe dos orixás e aqui no Brasil, a rainha do mar. 

Divindade de origem africana, da cultura ioruba da nação dos Egba, seu nome “yèyé omo ejá”  quer dizer “mãe cujos filhos são peixes”. Importantíssima para os que professam o Candomblé a Umbanda, em sua origem era um orixá fluvial. Os Egba viviam na região sudoeste da Nigéria, nas proximidades do rio Yemanjá.  Devido às guerras ocorridas entre os povos iorubas durante o século XIX, os Egba tiveram de migrar da região do rio Yemanjá, mas continuaram a cultuar a deusa, que teria passado a viver no rio Ògùn.

No Brasil ela passou a ser a Mãe D´Agua, mas das águas salgadas, do mar. Por isso ela é a protetora dos pescadores, de quem ela também decide o destino.

Itan, as lendas de Yemanjá

“Quando Obatalá e Odudua se casaram, tiveram dois filhos: Yemanjá (o mar) e Aganju ( a terra ). Os irmãos se casaram e tiveram um filho, Orungã (o ar). Quando cresceu, Orungã se apaixonou pela mãe. Um dia, aproveitando a ausência do pai, tentou violentá-la. Iemanjá conseguiu escapar e fugiu pelos campos.

Quando Orungã já a alcançava, ela caiu ao chão e morreu. Então seu corpo começou a crescer até que seus seios se romperam e deles saíram dois grandes rios, que formaram os mares; e do ventre saíram os Orixás que governam as 16 direções do mundo: Exu, Ogum, Xangô, Iansã, Ossain, Oxossi, Obá, Oxum, Dadá, Olocum, Oloxá, Okô, Okê, Ajê Xalugá, Orum e Oxu”.

"A relação de Iemanjá com os homens, nas lendas mais antigas, é a de distância física. Ela está sempre farta dos esposos, sempre fugindo deles ou, no mínimo, eles estão ausentes. Não há relatos ancestrais de amores ardentes e sensuais e seus companheiros aparecem apenas como os pais materiais de seus filhos, embora ela habitualmente conceba sozinha a sua prole. A relação de Iemanjá com os seus companheiros é de a parceria, de amizade, de comunhão e não de amor sexual. (...)Quanto ao último elemento das lendas de Iemanjá, podemos dizer que os seios da mulher contêm um duplo simbolismo. Primeiramente eles representam o princípio feminino, inequivocamente, a mãe, personificada em Iemanjá. Por outro lado, os seios femininos também materializam a proteção, o refúgio, o lugar de repouso. Na ideologia mortuária iorubá, morrer nas águas significa regressar à origem, ao conforto e abrigo do corpo sagrado da Mãe. Durante os duros séculos de escravidão moderna, a imagem da mãe, à qual os nagô imaginavam regressar após a morte, era a da Mãe África, o berço da cultura iorubá."Pierre Fatumbi Verger- antropólogo e babalaô, em “Orixás. Deuses iorubás na África e no Novo Mundo”.

Por aqui Yemanjá também é chamada de Janaína, Dandalunda, Mucunã, Princesa do Mar, Sereia do Mar, Ísis, Inaé... Mas em seu vasto reinado ela recebe outros nomes: Ayaba ti gbe ibu omi, rainha que vive na profundeza das águas; Ibu gba nyanri, regato que retém a areia; Oloxum (Olosun), regato vermelho; Ibu Alaro, regato negro (anil); Olim?, dona da folha de palmeira; Onilaiye, dona do mundo;Onibode Iju, guardiã da floresta; mãe de Minihun (Iya ominihun), em referência a minihun que é o nome que se dá às crianças que acredita-se concebidas graças a Iemanjá; Ayaba lomi o, rainha na água;Iyá Ori, mãe da cabeça Rainha do Mar, Sereia.

Outras referências como Aiucá ou Princesa do Aioká parecem corruptelas de Abeokuta, cidade principal do culto de Iemanjá. Wikipedia

Outra Itan ...

“Yemanjá teve muitos problemas com os filhos. Ossain, o mago, saiu de casa muito jovem e foi viver na mata virgem estudando as plantas. Contra os conselhos da mãe, Oxossi bebeu uma poção dada por Ossain e, enfeitiçado, foi viver com ele no mato. Passado o efeito da poção, ele voltou para casa mas Yemanjá, irritada, expulsou-o. Então Ogum a censurou por tratar mal o irmão. Desesperada por estar em conflito com os três filhos, Iemanjá chorou tanto que se derreteu e formou um rio que correu para o mar.”

Suas características 

O dia da semana de Yemanjá é o sábado. Suas cores o cristal e o azul claro, o metal a prata, seus símbolos o leque (abebé) e a concha, seu elemento a  água e seu domínio o mar. As plantas destinadas a ela são colônia, aguapé, lágrima de Nossa Senhora, pístia (erva de Santa Luzia) e trapoeraba branca (olhos de Santa Luzia ).

Seus animais são os peixes e sua comida peixe, camarão, canjica, arroz, manjar e  mamão, a  bebida a champanhe. Ela recebe oferendas na praia e seus presentes prediletos são flores, perfumes, enfeites como colares, espelhos, pentes e suas comidas e bebidas. Suas saudações são a doce abá! Odó iyá!

Itan ...”Yemanjá foi casada com Okere. Como o marido a maltratava, ela resolveu fugir para a casa do pai Olokum. Okere mandou um exército atrás dela mas, quando estava sendo alcançada, Iemanjá se transformou num rio para correr mais depressa. Mais adiante, Okere a alcançou e pediu que voltasse; como Yemanjá não atendeu, ele se transformou numa montanha, barrando sua passagem. Então Yemanjá pediu ajuda a Xangô; o Orixá do fogo juntou muitas nuvens e, com um raio, provocou uma grande chuva, que encheu o rio; com outro raio, partiu a montanha em duas e Iemanjá pôde correr para o mar.”

"Os iorubás acreditam que homens e mulheres descendem dos orixás, não tendo, pois, uma origem única e comum, como no cristianismo. Cada um herda do orixá de que provém suas marcas e características, propensões e desejos, tudo como está relatado nos mitos. Os orixás vivem em luta uns contra os outros, defendem seus governos e procuram ampliar seus domínios, valendo-se de todos os artifícios e artimanhas, da intriga dissimulada à guerra aberta e sangrenta, da conquista amorosa à traição. Os orixás alegram-se e sofrem, vencem e perdem, conquistam e são conquistados, amam e odeiam. Os humanos são apenas cópias esmaecidas dos orixás dos quais descendem. Reginaldo Prandi, sociólogo, escritor e professor, em “Contos e Lendas Afro-brasileiros ; A Criação do Mundo”.

Itan ...”Em épocas remotas os Orixás passaram fome. Às vezes, por longos períodos, eles não recebiam bastante comida de seus filhos que viviam na Terra. Os Orixás cada vez mais se indispunham uns com os outros e lutavam entre si guerras assombrosas. Os descendentes dos Orixás não pensavam mais neles e os Orixás se perguntavam o que poderiam fazer. Como ser novamente alimentados pelos homens? Os homens não faziam mais oferendas e os Orixás tinham fome. Sem a proteção dos Orixás, a desgraça tinha se abatido sobre a terra e os homens viviam doentes, pobres, infelizes. Um dia Bará pegou a estrada e foi em busca de solução. Bará foi até Yemanjá em busca de algo que pudesse recuperar a boa vontade dos homens.

YEMANJÁ lhe disse: Nada conseguirás.

Xapanã já tentou afligir os homens com doenças, mas eles não vieram lhe oferecer sacrifícios.

YEMANJÁ disse: Bará matará todos os homens, mas eles não lhe darão o que comer.

Xangô já lançou muitos raios e já matou muitos homens, mas eles nem se preocupam com ele. Então é melhor que procures solução em outra direção. Os homens não tem medo de morrer. Em vez de ameaçá-los com a morte, mostra a eles alguma coisa que seja tão boa que eles sintam vontade de tê-la. E que, para tanto, desejem continuar vivos.

Bará retornou o seu caminho e foi procurar Orungã. Orungã lhe disse: Eu sei por que vieste. Os dezesseis Orixás tem fome.É preciso dar aos homens alguma coisa de que eles gostem, alguma coisa que os satisfaça.Eu conheço algo que pode fazer isso.É uma grande coisa que é feita com dezesseis caroços de dendê. Arranja os cocos da palmeira e entenda seu significado. Assim poderás conquistar os homens.

Bará foi ao local onde havia palmeiras e conseguiu ganhar dos macacos dezesseis cocos. Bará pensou e pensou, mas não atinava no que fazer com eles.Os macacos então lhe disseram: Bará, não sabes o que fazer com os dezesseis cocos de palmeira? Vai andando pelo mundo e em cada lugar pergunta o que significam esses cocos de palmeira.Deves ir a dezesseis lugares para saber o que significam esses cocos de palmeira. Em cada um desses lugares recolheras dezesseis ODÚS. Recolherás dezesseis histórias, dezesseis oráculos. Cada história tem a sua sabedoria, conselhos que podem ajudar os homens. Vai juntando os ODÚS e ao final de um ano terás aprendido o suficiente.

Aprenderás dezesseis vezes dezesseis ODÚS. Então volta para onde moram os Orixás. Ensina aos homens o que terás aprendido e os homens irão cuidar de Bará.

Bará fez o que lhe foi dito e retornou ao Orun, o Céu dos Orixás .Bará mostrou aos deuses os ODÚS que havia aprendido e os Orixás disseram: Isso é muito bom. Os Orixás, então, ensinaram o novo saber aos seus descendentes, os homens.

Os homens então puderam saber todos os dias os desígnios dos Orixás e os acontecimentos do porvir. Quando jogavam os dezesseis cocos de dendê e interpretavam o ODÚ que eles indicavam, sabiam da grande quantidade de mal que havia no futuro. Eles aprenderam a fazer sacrifícios aos Orixás para afastar os males que os ameaçavam. Eles recomeçavam a sacrificar animais e a cozinhar suas carnes para os deuses. Os Orixás estavam satisfeitos e felizes. Foi assim que Bará trouxe aos homens o Ifá.”