E eis que eu faço enfim esta coluna tantas vezes escrita e reescrita na minha cabeça desde que eu comecei esta jornada aqui na coluna Modas e Modos.
Já vou avisando, está grande, então vá lendo aos pedaços, mas me dê a honra do seu tempo.
Tem muita música pelo meio, então dá para fazer o caminho curtindo...
Hoje que quero celebrar meu aniversário, que foi no dia 31 de maio, quando completei 56 anos às 7h5 da manhã.
Dia da consagração de Nossa Senhora (que eu já coroei quando fiz 11 anos, na Igreja de Santana, no Rio Vermelho), um dos dias do ano em que a energia angelical é mais forte e, neste ano em especial, dia de Corpus Christi, dia santo católico que remonta ao Século 13, e que celebra o mistério da eucaristia, ou seja, o sacramento do sangue e corpo de Jesus Cristo.
Achei especial cair no dia do meu aniversário.
Fiquei honrada.
Dito isso, hora de botar um ponto no “i” que me incomoda acho que desde sempre, a tal da expressão “no meu tempo”...
No tempo eu que eu apresentava o Multicultura na Rádio Educadora, uma das minhas experiências profissionais mais lindas, gratificantes, adoráveis, um dos meus partners de bancada, que tinha idade para ser meu filho, no ar veio com esta brincadeira de “no seu tempo Doris Pinheiro”.
Imediatamente eu respondi: no meu tempo de que?
O meu tempo é agora.
E em combate a mais esta violência que o senso comum, a desvalorização do ser humano, as manipulações do capital, a futilidade da nossa cultura, entre outras coisas, promovem, hoje eu celebro meu aniversário gritando:
O passado não existe mais.
O futuro ainda não existe.
O meu tempo é agora!
E aproveito para celebrar com você, compartilhando memórias afetivas e músicas, escolhidas entre muitas, mas significativas para este meu tempo de agora.
Então, se prepare para apertar o play!
Dias de sol
Acho que a primeira música que eu lembro me marcar (hoje música tema do meu filho na minha vida, está no toque do meu celular), é “You Are the Sunshine of my Life”, do maravilhoso Steve Wonder.
Na minha infância nós íamos nos finais de semana de verão de turma, irmãos e primos, levados por meus pais, para o Clube Campomar.
Lá passávamos o sábado, desde cedo, torrando embaixo do sol, entrando e saindo das piscinas, ficando com os dedos murchos de tanto estar na água, comendo batata frita e filezinho de carne e ouvindo tocar músicas no sistema de autofalantes.
“You Are the Sunshine of my Life” marcou estes meus dias que eram muito felizes.
A gravação de que eu gosto é esta
Meu avô solene
No tempo em que eu era criança e morava na “casa velha”, verdadeiro ente da família, na Rua Guedes Cabral, bem em frente à Praia de Santana, à Casinha de Yemanjá e à Igreja de Santana, com meus avós – o poeta Hermes e Guiomar Veiga, minha Guió, ambos nascidos no Século 19 – minha avó que era magrinha, lindinha, colocava pedaços de frutas caras, como pera e maçã, embaixo das xícaras dos netos que moravam com ela, eu, minha irmã Gina e meu irmão Roberto...
Já para meu avô Hermes, eu achava que parecia que a gente nem existia...
Olhando para trás hoje percebo ainda mais como era estranho.
Acho que era a forma de lidar com criança na cabeça dele.
Pois bem, nos dias de aniversário minha mãe colocava uma toalha branca especial, flores na mesa e assim começava a celebração da data especial.
Tendo festa ou não mais tarde, você já amanhecia o dia se sentindo especial.
Minha mãe linda...
Aos dez anos de idade estava eu sentada num lado da mesa e meu avô sentado do outro lado, só nos dois na sala, quando ele parou, olhou bem nos meus olhos e disse: 10 anos, uma década, uma idade importante, ou outra coisa por aí, com aquela solenidade bonita de poeta.
Eu fiquei tão honrada e ao mesmo tempo tão surpresa.
Então, em homenagem aos meus avós lindos, e agradecendo ao meu avô pelo gene do dom da escrita, para você uma das músicas mais lindas que conheço, e que representa o amor deles dois, “A Deusa da Minha Rua”, de 1939, composta por Newton Teixeira (música) e Jorge Faraj (letra).
Há várias gravações, mas a que eu mais gosto é com o espetacular Nelson Gonçalves
Se quiser explorar outras interpretações:
Com Silvio Caldas
Com o violão de Yamandu Costa e voz de Geraldo Mais, para a trilha do filme “Lisbela e o Prisioneiro”
Com Cauby Peixoto
Amizade postal
No meu tempo em que eu tinha amigos por correspondência, ou seja, eu enviava cartas para jovens como eu, de outras cidades e estados e a gente conversava, se relacionava, minha amiga preferida era Maribel A. Dapena (era assim que eu escrevia no envelope), de São José dos Campos.
Era muito bom escrever e receber as correspondências, em especial dela.
Eu não lembro exatamente que idade tínhamos.
Maribel acha que uns 12, sim porque ela me achou no Facebook, trocamos telefones e hoje podemos nos falar todo dia pelo WhatsApp.
Foi um reencontro que me deixa muito feliz, ela é uma pessoa amorosa e feliz, tem uma família linda e eu gosto de ter ela na minha vida de novo.
Combinamos então trocar cartas via e-mail para eu colocar na coluna de hoje e fizemos assim:
Salvador, 31 de maio de 2018
Querida Maribel,
Escrevo esta carta via e-mail, no dia do meu aniversário, com o objetivo de celebrar nossa amizade.
Em nossa adolescência nos correspondemos por carta e você foi de longe minha amiga à distância preferida, era sempre muito bom esperar o Correio e receber suas mensagens.
Nós tínhamos quantos anos naquela época ? E o interessante é que olhando para trás, penso que a conexão que estabeleci com você e alguns outros amigos via carta, era uma parte de minha vida totalmente separada da minha vida em outras instâncias daquele momento.
Não me lembro de nunca ter falado com minhas amigas com quem convivia aqui sobre me corresponder por carta.
Não era por causa de nada negativo, acho apenas que sentia que esta experiência, tão rica para mim, era parte de um pedaço de minha vida que era só meu.
Apenas minha família sabia e achava muito natural e saudável.
E era...
Me lembro que uma vez você me mandou uma foto sua.
E eu achei você tão bonita e moderna e determinada.
Vivia num mundo diferente do meu, numa cidade em São Paulo (São José dos Campos) e eu imaginava que você era "mais pra frente" do que eu rsrsrsrsr.
Não sei que imagem você tinha de mim.
Pois bem, você me encontrou no Facebook, retomamos nossa amizade, e todos os dias recebo de você uma mensagem carinhosa pelo WhatsApp.
Desculpe se não respondo todo dia, mas agora todo dia posso te dar um oi e dizer que gosto muito de ter reencontrado você e que espero poder conhece-la pessoalmente em breve.
Com muito carinho, Doris
São José dos Campos, 31 de maio de 2018
Querida Amiga,
Que alegria receber sua carta, minha amiga de adolescência.
Acredito que tínhamos uns 12 anos na época, e eu contava com muito orgulho que tinha uma amiga em Salvador, lugar que amo, e sempre me interessei por saber dos lugares que um dia vou conhecer.
Amo Salvador, amo o sotaque de vocês, as comidas, músicas...tudo que vem desse lugar lindo...e foi muito bom ter você como amiga.
Depois de crescer e me casar a gente se perdeu por longos anos...e foi uma linda surpresa te encontrar um dia no Facebook.
Lembro que olhava as listas de telefone de Salvador te procurando, até que te achei no Face.
E agora nos falamos quase todo dia, e é muito bom saber de sua vida e tenho certeza de logo irei te conhecer pessoalmente e te dar um grande abraço....bjs querida e feliz aniversário...
Agora a gente tem de programar uma vinda de Maribel A. Dapena a Salvador, em pleno verão, tempo lindo e maluco desta minha terra.
Ela sabe que já está convidada tem tempo...
O anjo dentro de mim
Bom, se eu tinha 12, 13 anos, era por volta de 1975.
E uma das músicas que eu queria muito dar de presente para você hoje é “Dentro de Mim Mora um Anjo”, de Sueli Costa e Cacaso, que eu sempre achei que tinha tudo a ver comigo e com as mulheres de uma maneira geral.
A gravação de que eu mais gosto, e que ouço desde a minha juventude abençoada com o melhor da música brasileira, é esta, com Sueli Costa.
Pois é, da minha adolescência e juventude mais tenra rsrsrsr eu teria uma quantidade imensa de músicas para selecionar, mas tenho de escolher, então dou espaço agora para você deixar suas próprias músicas tocarem junto com as lembranças na sua cabeça...
..::pausa pausa pausa pausa pausa pausa pausa pausa pausa pausa::..
Podemos voltar?
Pois bem.
O dia dois de fevereiro, cuja festa se desenrolava bem em frente à minha casa, sempre foi um dos meus dias preferidos no ano.
É uma alegria, um céu azul, um cheio de flor e alfazema e bonecas de plástico que pipocam no meu peito...
Tenho inúmeras lembranças boas deste dia, mas quero destacar uma em especial, que tem a ver com meu caminho profissional.
No meu tempo em que eu era repórter da TV Itapoan, no começo dos anos 80, eu tive a honra de, da lancha de “Seo” Pedro Irujo, narrar a entrega do presente às águas.
Mas esta não foi a maior honra.
A maior honra foi eu, foca (jornalista em começo de carreira) absoluta, ter comigo fazendo a transmissão ao vivo, Raimundo Varela, Cristovão Rodrigues, que foi no barco do presente e se jogou no mar junto com os balaios e eu narrei isso de pertinho e Fernando José, seguramente um dos maiores talentos desta terra e uma pessoa a quem sempre quis muito bem.
E ele, que me escreveu um bilhete de Natal uma vez falando que eu era talentosa, teve a generosidade de na volta, ainda na lancha, terminando a transmissão, ir me dando apoio enquanto eu falava da lua que despontava no céu no final da tarde, isso depois de tudo que havia para ser dito já ter sido dito.
Quem já fez transmissão ao vivo sabe como é.
Gratidão... a ele, a Carlos Borges, meu chefe na época e amigo-irmão, a estes super profissionais que dividiram comigo essa transmissão.
Meu presente
Para completar, como a lancha ia voltar para a Marina e eu queria ficar em casa, pedi que ela se aproximasse o máximo da praia, me joguei na água, voltei uma parte nadando e outra de carona num dos barcos dos pescadores, atravessei a rua, entrei em casa pingando e recebi dos meus pais os olhares mais orgulhosos do mundo.
Mais tarde, de 1999 a 2001, coordenei as transmissões da Lavagem do Bonfim e da Festa de Yemanjá para a TVE, concebendo o formato da transmissão, escrevendo os textos dos vídeos que entravam entre os flashes ao vivo dos meus colegas.
Outro “no meu tempo” que marcou muito minha vida e pelo qual eu agradeço a Antônio Sampaio, pelo apoio, e aos meus colegas queridos do IRDEB, como meu irmão Pará, e a Oliveira e enfim, a todos, que sempre estão no meu coração.
Para marcar este momento, só tem uma música para mim ...
“Dia Dois de Fevereiro”, de Caymmi, na voz de Gal Costa
Rock e angústia
Bom, anos 80, eu já era jornalista de TV e tinha uma cabeça complicada como só se tem aos 20 e poucos anos rsrsrsr.
Minha banda de rock preferida era a Legião Urbana e uma das músicas da minha vida é “Tempo Perdido”, que meu filho ouve hoje também.
Lembro de ir num show da Legião no estacionamento do Centro de Convenções com minha linda e super amiga até hoje, mais roqueira (na época, hoje tem a energia do rock transmutada numa bela busca interior e cuidado com corpo e mente), Laura Campos.
Adoro esta música e continuo tendo o meu próprio tempo
There was a boy
Ainda nos anos 80 eu vivi uma belíssima história de amor.
Eu e meu tio Sílvio, irmão de meu pai, nos apaixonamos, claro que como sobrinha e tio.
A pedido de minha mãe ele pagou para mim meu curso de inglês e eu, para agradecer, o visitava em seu apartamento nos Barris, e levava tardes conversando com ele.
Acontece que meu tio Silvio Pinheiro era o ser humano mais inteligente que eu já conheci.
Maestro, tocava seis instrumentos, falava não sei quantas línguas, era cultíssimo e tive o privilégio de aprofundar o relacionamento com ele, experiência que guardo com profundo amor no meu coração.
Lembro totalmente encantada, da tarde em que ele tocou ao piano, e me apresentou “Nature Boy”, que é de Eden Ahbez, super compositor absolutamente hiponga.
Imagine aquele homem lindo e elegante tocando para sua sobrinha caçula num momento que era só nosso...
Há muitas gravações de “Nature Boy”, mas eu selecionei três e disponibilizo o links das outras para você curtir comigo.
Então, lá vai minha seleção:
Com Michael Jackson
Só instrumental, com Miles Davis
E com James Brown
Mas futuque aí
Nat King Cole
David Bowie
Frank Sinatra
Ella Fitzgerald
Sarah Vaughan
Caetano Veloso
Vinicius de Moraes e Toquinho
Vida vida vida
Bom, eu vou parar no meu tempo quando eu tinha 20 e poucos anos não porque eu ache que a vida era mais vida, mas porque afinal de contas são minhas experiências e eu não sou narcisista a ponto de ficar achando que falar de mim, de saber sobre mim é uma coisa assim tão interessante.
Na verdade, estes momentos eu conto aqui para que se faça a celebração deste caminho que é meu e seu e que se chama vida.
E mais uma vez para dizer o quanto acho uma babaquice esse negócio de “no meu tempo, no seu tempo”.
Mas acho que já ficou claro né (rsrsrs)?
Mas, só para fechar, pare e pense comigo: somos um dos sete bilhões e 600 milhões de seres humanos no mundo (e muda toda hora que nasce gente e morre gente), nesse planeta que é um dentro uns 100 bilhões que existem só na Via Lactea, que é uma entre dois trilhões de galáxias que estimam existam no Universo, que muitos cientistas acreditam que é infinito (e ele se expande para onde? Para o nada? O nada existe então), Universo este que existe há cerca de 17 bilhões e 700 milhões de anos.
Essa história de tempo não vira ainda mais uma bobagem?
Então, enquanto estamos aqui, vamos aproveitar e ouvir música?
Selecionei várias outras e dou de presente.
Olhe só...
Do tempo em que eu assistia “Gabriela”, novela da Rede Globo, com minha família, no quarto dos meus pais.
Na tela Sônia Braga e na trilha sonora mais uma vez Sueli Costa, desta vez com “Coração Ateu”, na voz de Maria Bethânia
Do tempo em que eu estive total e completamente apaixonada.
Deus me livre disso de novo!
“Você pra Mim”, com Fernanda Abreu – 1990
Para todos os momentos em que bate crise séria no amor, do querido Carlinhos Cor das Águas, “Não Vá Embora”
Do tempo em que eu dei tchau para este cidadão por quem fui apaixonada em excesso – “Love me or Leave me”, Billie Holiday?
A música escolhida para a chegada do meu filho em 1997 – “Superbacana”, de Caetano Veloso
Do talentozérrimo músico, cantor, compositor e diretor musical Luciano Salvador Bahia (baiano, claro), na voz da amada Cris Mendez – “Consideração”, que exprime bem meus sentimentos...
Para o tempo em que eu me apaixonar de novo (caso ocorra, com o cabra se apaixonando também), de Cláudio Lins, filho de Lucinha a Ivan Lins, “Cupido”, na voz de Maria Rita
E só para todo mundo saber, que neste meu tempo agora, eu estou assim...
“Eu Apenas Queria que Você Soubesse”, uma das muitas do genial Gonzaguinha.
Beijos e obrigada pelo seu tempo...