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"Reforma virou uma corrida por privilégios", diz presidente do IBGE

Paulo Rabello de Castro, do IBGE, diz que a proposta de mudanças nas regras de aposentadoria e pensões é uma 'reforma mínima'

Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
Ele alerta que a discussão está contaminada pela \'confusão\' entre Previdência e assistencialismo

À frente do instituto responsável pelas estatísticas oficiais econômicas, sociais e demográficas no Brasil, o presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Paulo Rabello de Castro, diz que a proposta de mudanças nas regras de aposentadoria e pensões é uma "reforma mínima".

"Quem acha que esta é uma reforma muito séria, muito dura, não tem noção dos dados demográficos brasileiros e da situação fiscal", afirma. 

Ele alerta ainda que a discussão está contaminada pela "confusão" entre Previdência e assistencialismo e que o que se vê hoje no Brasil é uma "corrida por privilégios". 

Como deve evoluir a demografia do Brasil daqui para frente? 

Não podemos dizer que daqui para frente há uma tendência ao envelhecimento. É preciso mudar o tempo do verbo. O Brasil já vem, desde os anos 80, sofrendo uma transformação histórica na sua estrutura demográfica, toda ela apontada para um rápido, muito célere, envelhecimento da população.

A tendência é termos, daqui para a frente, uma proporção bem mais relevante de idosos sobre crianças. O que as pessoas não sabem é que o tipo de Previdência que o Brasil optou por ter, tanto no setor público quanto no setor privado, enseja a necessidade de termos mais crianças vindo para pagar a conta dos que se aposentam, e isso é exatamente o que não acontecerá. Há três tipos de Previdência. Uma com lastro em ativos, em que o indivíduo vai contar com o conjunto das próprias contribuições.

Essa é a ideal, mas infelizmente não temos nenhum caso de Previdência lastreada, a não ser o Funpresp, que é o fundo complementar de Previdência do setor público.

O segundo tipo, que é majoritário, é sem lastro, mas com suporte populacional. E o terceiro é justamente a Previdência tradicional do setor público, que não tem lastro em nada e não tem suporte populacional, porque ela não foi feita para você ir empregando mais funcionários públicos para pagar no futuro.

O IBGE tem feito pesquisas sobre a mulher no mercado de trabalho. O sr. acha necessária uma idade mínima menor para elas? 

Não há polêmica quanto aos dados. As mulheres têm uma sobrevida superior à dos homens, estatisticamente. Mas é preciso ter cuidado, olhar a sobrevida para aqueles que atingiram determinada faixa de idade.

A pergunta mais relevante seria: ao atingir 50 anos de idade, por exemplo, qual é a expectativa de vida? As mulheres hoje ultrapassam os 80, os homens ainda não. E a diferença pode ser de 5 ou 6 anos a mais para as mulheres.

Faz sentido ter idade mínima menor para mulheres? 

Nesse sentido, seria contraditório se as mulheres viessem a se aposentar mais precocemente, porque elas justamente sobrevivem aos homens.

A bancada feminina na Câmara argumenta que as mulheres ganham menos do que os homens. O sr. concorda? 

Mas o que isso tem a ver com as regras de aposentadoria é que eu não sei. Na realidade, instituiu-se no Brasil uma mentalidade que ainda não foi afastada, de caráter assistencialista, em relação a qualquer regra previdenciária.

Se confunde Previdência com algum tipo de assistência ou até de compensação por desvantagens diversas.

A confusão entre assistencialismo e Previdência está custando caro ao Brasil? 

Não está custando caro; está custando caríssimo. Num País onde os privilégios começam no próprio setor público, a partir do momento em que um tipo de privilégio abusivo do ponto de vista de possibilidade de pagamento que o País tem é instituído, a régua passa a ser essa. Todos passam a postular uma compensação por alguém que tem um privilégio maior. Nós estamos no Brasil diante de uma corrida por privilégios.

Isso está dominando as discussões sobre a reforma? 

Claro. E o governo está perdendo a guerra de comunicação em relação a esse debate. Por isso é que fiz questão e tento colaborar com o resto do governo nesse esclarecimento, ao separar as Previdências que nem suporte populacional têm daquelas que têm pelo menos o suporte populacional como apoio, que é o típico INSS. E isso faz uma diferença enorme.

No caso dos Estados, o que estamos vendo é que essa Previdência quebrou, não? 

Eu não gosto da palavra "quebrou", porque pode significar muitas coisas. Cada caso é um caso, tem situação de Estados que estão bem próximos até de um razoável equilíbrio atuarial, e a maioria, que está bastante desequilibrada.

O desequilíbrio na Previdência rural também é muito grande, não? 

Não se deveria falar em desequilíbrio na Previdência rural. É uma conta de assistência que está sendo bancada pela Previdência Geralmente, vemos nos jornais que o déficit da Previdência ultrapassa R$ 100 bilhões, mas a maior parte desse valor constitui essa conta de assistência previdenciária rural que, obviamente, não tem qualquer tipo de equilíbrio nem condição de se equilibrar.

O sr. acha que a reforma será aprovada? 

Eu torço para que ela seja aprovada, tendo em vista que ela constitui o que a gente poderia chamar de reforma mínima. É uma reforma do sistema atual, sem mudança do sistema.

Muito proximamente, teremos de debater a Previdência do futuro, que vai ter de passar a ser uma Previdência dotada de lastro, aquela que hoje é praticamente inexistente no Brasil.

Essa vai ser a verdadeira resposta para as próximas gerações. Portanto, esta é uma reforma mínima. Quem acha que esta é uma reforma muito séria, muito dura, não tem noção dos dados demográficos brasileiros e da situação fiscal.