Um dos políticos mais respeitados do país, o ex-senador Pedro Simon sustenta que o Brasil vive hoje uma das maiores crises da sua história política. Em entrevista exclusiva à Tribuna, o peemedebista, que participou na semana passada, em Salvador, da Semana do Ministério Público da Bahia (MP-BA), afirmou que algumas coisas que estão acontecendo no Brasil nunca aconteceram antes. “O Brasil sempre foi considerado o país da impunidade. Só ia para a cadeia ladrão de galinha. Uma pessoa importante nunca soube o que era a cadeia. Todavia, hoje há um fato novo. O Brasil mudou”.
Para o ex-senador, a Operação Lava Jato não foi arquivada porque o povo foi para a rua. “Hoje estamos vivendo essa novidade que são as redes sociais”. Simon ainda falou da prisão do senador Delcídio Amaral, que, segundo ele, foi correta. “Primeiro, a prisão tinha que ser decretada e, segundo, o Senado fez o que tinha de fazer, que é confirmar”. Sobre Eduardo Cunha, disse que o presidente da Câmara é competente seja “para o bem ou para o mal”. “Ele tem um lado que é interessante. Um dos males do Brasil nesse tempo todo foi a supremacia do Executivo, inclusive com a Constituinte, quando eles cometeram um crime com a emenda provisória. A emenda provisória é um escândalo”.
Aos 85 anos, o senador Pedro Simon diz que o ex-presidente Lula endeusou demais a presidente Dilma. “E Dilma não era tudo aquilo que ele falava. A mãe do PAC, a gerentona. Mas ela não era tudo isso. Ela era uma mulher dura, ríspida, que não mostrou ter toda essa genialidade como tentaram mostrar. Ela teve nas Minas e Energias durante quatro anos, e a Petrobras estava ligada a Minas e Energia. Ela foi chefe da Casa Civil durante quatro anos e a presidente do conselho da Petrobras era a chefe da Casa Civil. Na realidade, ela foi irresponsável. Para mim, nesses anos todos, apesar de tudo isso, mas não vejo a Dilma metendo a mão no dinheiro. O que vejo nela é uma omissão total e um domínio do governo e o PT, que ela acabou se entregando.
Confira entrevista completa:
Tribuna da Bahia – Como o senhor está vendo esse momento de pressão e efervescência política no país?
Pedro Simon - Com toda a sinceridade, estamos vivendo um momento ímpar na história do Brasil. Crise é crise, mais uma, nenhuma novidade. Problema de governabilidade, problema da oposição cobrar do governo, essas coisas todas são corriqueiras. Eu tenho 85 anos, 60 só de política. Desde criança, em 1945, eu tinha 15 anos e estava no aeroporto de Porto Alegre e, quando eu vi, estava em um avião seguindo para São Borgia, levando o caixão do Dr. Getúlio, que tinha morrido. Desde aquela época que me lembro até hoje, era gurizinho, os discursos de Osvaldo Aranha, Tancredo Neves, e do próprio João Goulart, foram fantásticos. De lá para cá é uma crise atrás da outra. Te diria que o que eu vejo diferente de hoje é que não acontecia no passado o fato de as crises se sucederem, mas era também um mar de lama no Palácio do Catete, no Rio. Morreu Getúlio, entrou primeiro o Café Filho. Ficou provado que o Getúlio era um homem digno, não se encontrou nada contra ele. A vida continua igual. Em 1954, no suicídio do Dr. Getúlio Vargas, era a mesma coisa, depois na cassação do Jango, cassado de uma maneira estúpida. O João Goulart estava em Porto Alegre, presidente da República, na casa do comandante do 3º Exército, eu estava lá naquele momento discutindo o que fazer e o que não fazer e o presidente do Senado declara vaga a presidência da República porque o presidente João Goulart estava no exterior e em um lugar incerto e ninguém sabia. Até o Tancredo dizia palavrões horríveis, berrando, pedindo que dessem três horas de prazo que Jango chegaria aqui. Ou ainda, bastava que telefonassem para o telefone da casa do ministro da Guerra, que está lá em Porto Alegre, e ele vem para cá. Não teve jeito. Hoje não. As coisas estão acontecendo como nunca aconteceram. O Brasil é um país onde as elites sempre dominaram.
nunca soube o que era qualquer coisa desse tipo.
Tribuna – E o que difere de hoje?
Pedro Simon - Hoje há um fato novo. O Brasil mudou. Em primeiro lugar, temos uma lei muito importante, que é a Lei da Ficha Limpa, conseguida com o povo na rua. O Brasil tem uma legislação em que o cidadão que é rico, tem posses, acusado de qualquer roubo ou fato, ele põe um advogado e esse advogado acompanha o processo. Não é para a pessoa ver, só para empurrar com a barriga. Ele o defende perante o juiz, ele é condenado por outro juiz, ele recorre para o tribunal, no tribunal manda para a junta, a junta manda para o pleno do tribunal, que recorre para o Supremo em Brasília e assim vai. É condenado, é recurso, é condenado, dois anos, três anos, quatro anos, o processo vai e termina caindo em recurso de prazo e ele é absorvido porque passou tempo demais. O Maluf é um exemplo disso. Não sei quantos processos que ele teve condenações, mas nenhuma definitiva e nunca pegou um dia de cadeia. Hoje, com essa nova lei, o cara é condenado uma vez, recorre, o segundo tribunal condena, ele vai para a cadeia, ele perde o mandato, tem que devolver o dinheiro. O segundo aspecto é que esses jovens na rua fizeram com que o Supremo condenasse no processo do mensalão. Ninguém acreditava. Todo mundo dizia: ‘mensalão?’ ‘O Supremo nunca condenou, como é que vai condenar agora?’ Mas condenaram. Condenou o chefe da Casa Civil, condenou o presidente da Câmara, o presidente e o tesoureiro do PT, o dono do banco. E agora esse processo da Lava Jato mostra que as coisas são diferentes. A Polícia Federal e os procuradores, desde que houve a operação Mãos Limpas na Itália, estão se espelhando no que aconteceu por lá. Eu fui senador e trouxe para o Brasil os comandos da operação Mãos Limpas, que vieram para o Brasil e ficaram discutindo com os procuradores daqui, debatendo, analisando, foram no Senado. Se discutiu por muito tempo, mas não apareceu nada de novo. Mas o que ficou disso tudo? Ficou que na Polícia Federal e no grupo de procuradores começaram a aparecer pessoas interessadas em mudar as coisas, e isso aconteceu nessa realidade. O governo de Fernando Henrique, o senhor Brindeiro, procurador da República era considerado um engavetador geral, porque ele não denunciava, não devolvia para pedir mais esclarecimentos. Apenas deixava na gaveta e ficava na gaveta. Isso foi meio que uma explosão. E de lá para cá passamos a viver uma nova realidade. Agora eles trabalham em conjunto.
Tribuna – Como o senhor avalia a Operação Lava Jato? Há excessos ou atende aos anseios da sociedade?
Pedro Simon – A operação Lava Jato só não foi arquivada por causa da sociedade, porque o povo foi para as ruas várias e várias vezes e se manifestou a favor da investigação. Hoje estamos vivendo essa novidade que são as redes sociais. Em 1964, a ditadura foi estabelecida, e o povo na rua, a igreja, a Globo, foi cobrando, cobrando e fizeram. Hoje, a grande mídia tem força, mas não tem força total. E ela não tem força total por uma razão simples, por causa dessa nova realidade da sociedade que, através dessa nova realidade de comunicação, fazendo uma verdadeira cadeia social de comunicação, essas redes sociais de 30, 40, 300 jovens se comunicando, fazendo a opinião pública. Como é que fizemos as Diretas Já se todos eram contra? Os jovens foram avisando, avisando, avisando; foi se comunicando, crescendo e, de repente, quando eles foram ver o povo estava nas ruas.
Tribuna – Há quase 30 semanas, quando esteve aqui na Bahia, o senhor disse que não acreditava que a Operação Lava Jato fosse chegar ao ex-presidente Lula. Só que muita coisa aconteceu e chegou muito perto dele. Acredita que, de alguma forma, com a investigação do filho dele, o próprio ex-presidente será atingindo?
Pedro Simon – Lula sempre me pareceu uma pessoa de respeito. Eu tinha até carinho por ele. Mas, lamentavelmente, hoje é uma realidade. O Supremo autorizou o procurador fazer uma investigação do filho dele. As coisas aconteceram com tal gravidade e intensidade que não tem como fugir. É triste dizer. A Petrobras era uma grande companhia, uma das poucas coisas boas que deu certo no Brasil. E no governo Lula ela viveu seu melhor momento, quando se descobriu petróleo a sete quilômetros do fundo do mar. Lula fez um carnaval e foi aos países produtores e era o mais badalado no mundo. De repente, aparece esse fato e, aonde você vai, todos dizem que nunca se viu no mundo moderno um escândalo absurdo como esse. E o que aconteceu? O Lula primeiro, e depois a Dilma, montaram os quadros de administração da Petrobras, mas na hora de montar fizeram um fato novo. De um modo geral, na história do Brasil, eu não me lembro de quem está na Petrobras está na política. A Petrobras era uma espécie de órgão técnico e era preservado. Quem era presidente da Petrobras, era presidente da Petrobras. De repente o governo começou a nomear. A diretoria tal foi entregue ao PMDB, a diretoria tal para o PT, a diretoria tal ao PP. Aí as denúncias começaram a aparecer. Entre os empreiteiros e a Petrobras não dá para dizer quem é o mais culpado. Um queria pegar o dinheiro e o outro queria pegar o dinheiro.
Tribuna - A corrupção é um mal entranhado no Brasil e parece vir da própria civilização. O que fazer para acabar com ela, senador?
Pedro Simon – Estamos vivendo um dos momentos mais importantes da história do Brasil. Nunca tinha acontecido isso. Os procuradores da Operação Lava Jato em um debate mostraram a história da máfia italiana, que é conhecida mundialmente. É o requinte da perfeição da roubalheira. E os procuradores mostraram como fizeram. E lá foi duro. Setecentos presos, três primeiro-ministros se suicidaram, o presidente da Fiat foi para a cadeia. Foi um processo doloroso, mas eles fizeram. O Partido Democrata Cristã, a Democracia Cristã, assim como o PT no Brasil, nasceu no mundo como o grande partido social, da caridade, cristão, mas desapareceu da Itália. Se desmontou porque estava metido nessa roubalheira. Quando Itamar [Franco] assumiu a presidência da República baixou um decreto criando uma comissão especial diretamente ligada a ele e, qualquer denúncia de escândalo, agia com autonomia total. Os ministros tinham que responder imediatamente e ele tinha liberdade para entrar em qualquer canto. Aquilo funcionou e foi adiante. No governo Itamar, eu fui líder dele, e desafio ter saído um escândalo que não se tenha tomado providência. Itamar nomeou uma engenheira na Secretaria de Transporte. Três dias depois aparece a informação que o marido dela era o advogado da empresa que fazia a ponte Rio-Niterói. Ela foi demitida por telefone. Essa comissão funcionou. Agora, o Fernando Henrique quando assumiu a presidência da República, a primeira coisa que fez foi extinguir essa comissão. Fui lá briguei com ele, mas não teve jeito. Já o Lula e a Dilma nunca criaram. O Jorge Hage, que era o presidente da comissão para cuidar disso, mas Dilma não deixou criar, inclusive ele se demitiu e não foi criado. O fato novo, e que a gente deve tirar o chapéu, é Procuradoria e a Polícia Federal.
Tribuna – Como o senhor viu a prisão do senador Delcídio Amaral e a decisão do Senado de ter mantido a prisão?
Pedro Simon – As duas coisas foram certíssimas. Primeiro, a prisão tinha que ser decretada e, segundo, o Senado fez o que tinha que fazer, que é confirmar. Veja a capacidade da Procuradoria e da Polícia Federal. Há muito tempo que os fatos estavam enrolados, só precisando arrumar. Essas coisas estão acontecendo pela capacidade de organização, e quero fazer justiça, respeito muito o atual ministro da Justiça, porque ele tem sido pressionado pelo PT e até pelo Lula. Querem que ele demita, mas ele não. Sou ministro da Justiça e cumpro os preceitos do PT e os preceitos que aprendi no PT são esses. E até agora está sendo firme e correto e precisa ser respeitado. Hoje eu sou apaixonado pelo [Sérgio] Moro, uma pessoa mais impressionante que não tinha visto há muito tempo. Rezo a Deus todas as noites pelo Moro e pelo Papa Francisco. O procurador-geral da República é outra pessoa excepcional na firmeza, dignidade e correção, mas sou obrigado a reconhecer que o ministro da Justiça tem tido uma atuação correta. Ele está atuando e agindo, mas não colocando debaixo do tapete.
Tribuna - O PT agiu certo nesse processo, já que a posição foi diferente da prisão do ex-secretário do partido, João Vaccari. Dois pesos e duas medidas?
Pedro Simon – O problema não é o PT, mas o Lula. Quando o Itamar era presidente, venceu cinco anos de prazo da Constituição e ela dizia que, passasse cinco anos, o Congresso faria uma revisão da Constituição. Revisão onde as mudanças não precisavam de 2/3, mas apenas da maioria absoluta. E veio a revisão e a emenda da reeleição. Eu era líder e perguntei ao presidente qual seria a nossa posição e Itamar respondeu: ‘Eu era senador quando se votou a Constituinte e na Constituinte eu votei contra a reeleição. Logo, hoje tenho que ser contra a reeleição’. Fernando Henrique falou: ‘Eu também. Eu era senador e votei contra a reeleição’. Saí dali e fui para a tribuna do Congresso e defendi a não reeleição. A grande verdade é que foi muito difícil para nós conseguirmos. A reeleição não passou por nove votos, porque os governadores queriam a reeleição, os prefeitos queriam a reeleição. Então, apesar da palavra do governo, quase passou. Entra Fernando Henrique e manda uma emenda criando a reeleição. E a emenda foi comprada porque ela não iria passar. Muita gente ganhou dinheiro. Esse foi o primeiro caso. O segundo caso foi a venda da Vale do Rio Doce. Se formou um grupo para ficar com a empresa formado pelos grandes mineradores brasileiros. Quando estava tudo pronto, um mês antes vem um grupo que ninguém sabia de onde vinha. Entregaram a Vale para um grupo que está aí até hoje fazendo bobagem. Com essas duas eu saí e comecei a ter simpatia com as conversas do Lula, tanto é que ele me convidou para participar do governo, mas eu não podia participar, porque iriam cobrar muito de mim. Assim como não aceitei ser ministro de Itamar, mas ajudei ele no Senado, eu poderia ajudá-lo no Senado, e ele concordou. Mas, no primeiro caso, aquele dos Correios, com o Cachoeira, fui ao Lula e disse: ‘demite hoje’. Mas ele não demitiu. Como não demitiu, criamos uma CPI. O Sarney presidente do Congresso e o Lula presidente da República não deixaram criar a CPI. Fomos ao Supremo e o Supremo mandou criar a CPI. O Lula foi se deixando levar, no início por omissão, foi ali que se começou a se organizar todo esse esquema, e chegou aonde chegou.
Tribuna - Como o senhor viu a carta que o Michel Temer enviou à presidente Dilma?
Pedro Simon – Reconheço que o Michel é uma pessoa séria, nunca vi nada contra ele. É um homem sério, de bem. Errou na condução do partido para fazer essas alianças. Há três eleições que não tem um candidato. Quem não joga não tem torcida, mas nós tínhamos todas as condições, inclusive para ganhar as eleições, mas foi ficando nisso. Agora, não vi nele nenhum ato fora da sua dignidade e seriedade. Se fala um bolo de coisas do PMDB, mas nunca se falou com relação ao Michel. Ele é uma pessoa que merece o respeito. A maneira como é feito as coisas, na base do toma lá, dá cá, esse troca-troca. A carta diz uma série de críticas que são verdade. Não sei se era a hora de dizer ou publicar. Foi um desabafo pessoal, mas no contexto de realidades. A coisa é muito delicada. O que vejo negativamente é que continua o toma lá, dá cá. Para montar a comissão do impeachment foi na base do troca-troca. A presidenta, que estava em diálogo com o vice-presidente, larga e pega um líder [Leonardo Picciani] e faz um racha no PMDB, demitindo o ministro indicado pelo partido e colocando o indicado pelo líder. E o que aconteceu? O líder foi destituído e deu essa confusão toda, mas o triste disso tudo é que, no primeiro ato, na criação da comissão, a presidente usa do diabólico esquema de que é dando que se recebe, o toma lá, dá cá, e quis fazer o que eles fizeram sempre, que é dá um cargo em troca de alguma coisa.
Tribuna – O senhor aposta em um possível rompimento do PMDB com o PT?
Pedro Simon – Não dá para dizer. É muito delicado. Mas volto a dizer o que disse antes. Estamos vivendo um momento muito importante e não podemos deixar que nada desmoralize esse governo. Hoje, ladrões estão indo para a cadeia. Hoje, os grandes empresários que roubaram estão indo para a cadeia. Isso nunca aconteceu em 500 anos de Brasil. Só ia para a cadeia ladrão de galinha. Agora não. Agora, a coisa está sendo feita para valer. Se esse movimento for levado adiante, será muito importante para a vida do país. Se esse movimento estiver lá em cima no comando onde tem que estar e os corruptos forem embora e se as empreiteiras entenderem que elas têm que ter ética e serem sérias, se isso der certo, vem para baixo do Brasil. O medo que tenho nessa hora é que essa confusão que está dando lá em Brasília sirva para derrubar esse movimento de dignidade e seriedade que a Polícia e a Procuradoria, e o Supremo Tribunal Federal, também estão colaborando, para que a coisa vá adiante. Isso é que tem que ser dito em primeiro lugar.
Tribuna da Bahia – O que fazer para conciliar tantos interesses dentro do PMDB?
Pedro Simon – Infelizmente, não há no mundo moderno um país onde os partidos são tão desprezados, sem personalidade, sem atividade e firmeza que nem no Brasil. O MDB foi o momento que a ditadura tinha vindo para ficar. O MDB, através das Diretas Já, sem o radicalismo, sem a violência, sem a guerra civil, com o povo e os jovens na rua. Nós elegemos um presidente e abrimos, está aí a democracia. Agora, infelizmente, ali foi um momento magnífico. O mundo estava ali. O que aconteceu é que Tancredo foi levado da gente. Ele não poderia morrer. Nosso acordo era ele ficar vivo. Pelo menos deveria ter levado o Sarney junto, mas deixou Sarney no lugar dele.
Mas nunca colocaríamos o Sarney na presidência. Mas ele na presidência, vou até fazer justiça. As grandes bandeiras como Diretas Já, Assembleia Nacional Constituinte, fim da tortura, liberdade de imprensa e anistia. Essas cinco Sarney deu. Mas dali por diante rachou. Sarney e Ulisses se desentenderam. E foi ali que nasceu o troca-troca e o toma lá, dá cá. O que vai acontecer não saberia responder. Mas, hoje, o partido mais negativo é o PT.
Tribuna – Até quando acredita que Eduardo Cunha vai se sustentar na presidência da Câmara?
Pedro Simon – Dizem que ele é um homem competente, para o bem ou para o mal. Nesse sentido, ele tem um lado que é interessante. Um dos males do Brasil nesse tempo todo foi a supremacia do Executivo, inclusive com a Constituinte, quando eles cometeram um crime com a emenda provisória. A emenda provisória é um escândalo. O presidente da República numa sexta-feira se reúne no gabinete e decide uma emenda provisória e manda publicar no outro dia no Diário Oficial. E isso não tem como terminar bem. Ou o Brasil faz uma reforma que seja séria, onde tenhamos um pacto federativo para valer, onde o Poder Executivo tenha limitado seus poderes limitados, onde um mar de dinheiro não fique na mão do governo federal para ele comprar prefeito e governador, fazendo aquilo que ele tem que fazer como se fosse caridade em troca de voto. Se nós partimos para isso, temos condições de chegar lá. Agora, se nós não tivermos um movimento onde cada um dê um pouco, nunca chegaremos lá.
Tribuna – O senhor acredita que a presidente Dilma terá fôlego para sair dessa onda de crises em que ela está inserida, como a pior de todas, que é a crise de confiança da população?
Pedro Simon – Lula endeusou a Dilma. E Dilma não era tudo aquilo que ele falava. A mãe do PAC, a gerentona. Mas ela não era tudo isso. Ela era uma mulher dura, ríspida, que não mostrou ter toda essa genialidade como tentaram mostrar. Ela teve nas Minas e Energias durante quatro anos, e a Petrobras estava ligada a Minas e Energia. Ela foi chefe da Casa Civil durante quatro anos e a presidente do conselho da Petrobras era a chefe da Casa Civil. Na realidade, ela foi irresponsável. Para mim, nesses anos todos, apesar de tudo isso, mas não vejo a Dilma metendo a mão no dinheiro. O que vejo nela é uma omissão total e um domínio do governo e o PT, que ela acabou se entregando.
Tribuna – Que fim terá o PT após tantos casos de corrupção mancharem sua história?
Pedro Simon – Eu olho para o PT e me lembro do Partido Democrata Cristão da Itália. Acho muito difícil a sobrevivência do PT. E o Lula está caminhando por um lado errado, querendo fechar os olhos dizendo que querem tirar o dinheiro que eles dão às famílias, mas isso não cola mais, não é por aí, não é verdade.
Tribuna - Qual deveria ser a conduta dele neste momento?
Pedro Simon – A dele é difícil. Não sei até que ponto ele teria condições. Se tivesse seria uma coisa boa. Bater na mesa e fazer mea culpa. Mas aí esse fato novo que é a delação premiada, está todo mundo apavorado.
Tribuna – Poucos homens públicos merecem tantos mandatos como o senhor teve. A limitação do número de mandatos ou o fim da reeleição em todos os níveis contribuiria para uma renovação de ideias e o fim desse monopólio do crime organizado que existe hoje na gestão pública?
Pedro Simon – Eu diria que sim. Não saberia dizer como se dois, três. Deveria se fazer uma renovação profunda. Mas sobre essa questão do mandato eu não tenho autoridade para falar, tive quatro mandatos no Senado. Mas, acho que fazer uma renovação, um troca-troca, um mexe-mexe, alguma coisa para não ter isso que temos hoje seria absolutamente necessário, como é no futebol quando os caras passaram 20 anos no poder e quando se viu era um escândalo atrás do outro. Mas, antes disso, a reforma partidária é muito importante. Não pode ter 30 partidos.
Tribuna - Da atual safra de homens públicos, quais os senhor identifica com capacidade de encabeçar um movimento que possibilite a construção de um novo processo no Brasil?
Pedro Simon - Deixa eu te dizer uma coisa: o mundo vive hoje uma fase nebulosa, digamos assim, em busca de uma nova geração. Os grandes nomes, grandes líderes, como Kennedy, não existem. Hoje, na Europa, a grande líder é a primeira-ministra da Alemanha (Angela Merkel). Essa mostrou que tem capacidade, que tem competência, e quem diria, a Alemanha é quem tem toda força num mercado como o europeu e todo mundo respeita o poder dela. Então, temos uma ausência. E se você me perguntar uma figura, eu digo que seria o Papa Francisco, que é a grande figura, um grande nome, com vivência, com grandes ideias e que eu rezo todos os dias por ele, porque tenho medo que aconteça alguma coisa com ele, já que está tendo tantas ideias na própria Igreja, no núcleo do Vaticano, as coisas que existiam na Igreja e têm que ser mudadas. Então, no Brasil é por aí. Estamos vivendo um período onde as gerações foram lideradas pelo Tancredo, o Ulisses, o Teotônio, o Brizola, o Montoro, o Mário Covas, o Arraes, período de gente notável. Agora esse período que veio depois, veio o PT com o Lula e mais ninguém. O PT, um partido que está no terceiro mandato, vai para 12 anos na presidência da República e me dê um nome? Lula foi o Lula. Foi o nome. A Dilma porque é a presidente. Então, zero. Qual o outro nome? E na oposição estão aparecendo nomes, gente nova que está aparecendo, mas de consolidação, com firmeza, isso que você está dizendo, qual o nome, eu acho que se encontra, mas com facilidade, ao natural, não existe. Não existe esse nome, ao natural, pra você dizer: é esse nome. Vai lá e pega ele e bota. Isso tem um lado positivo. Qual o lado positivo? Se tivesse um Brizola da vida, ele já vinha, já gritava ‘sou eu’, ‘sou o dono de tudo’ ‘sou o dono de tudo’. Hoje não tem ninguém com essa força de gritar que sou eu. A gente pode fazer do coletivo, do conjunto. No coletivo, quando um dizendo, pode-se chegar a um entendimento, desde que se tenha a vontade de fazer isso, e não um grupozinho querendo fazer para proveito próprio.
Tribuna - O que fazer para passar o país a limpo nesse momento de tanta efervescência?
Pedro Simon - Primeiro lugar, nota dez para o trabalho que está sendo feito pelos procuradores e pela Polícia Federal e pelo Supremo também. Isso não pode parar. Meu medo com essa coisa do impeachment é essa confusão, uma briga, daqui a pouco tem um arrego, como fizeram com o Brizola, fizeram aquela confusão toda, se reuniram na madrugada, botaram o Tancredo e depois botaram uma pedra em cima de tudo. No Brasil, todas as fases, todas as confusões, terminaram em um entendimento. Quer dizer, não apuraram coisa nenhuma. Nem o mar de lama do Palácio do Catete, onde o Getúlio morreu. E botaram uma pedra no assunto. É o que vai acontecer agora. E a coisa é tão grande, envolvendo tanta gente. Daqui a pouco vão dizer ‘vamos fazer um acordo aqui’. Eu acho que a primeira coisa que precisa ser feita é deixar o Supremo, deixar os procuradores e deixar a Polícia Federal apurarem, doa a quem doer. A segunda coisa é, o que eu já tinha proposto a Dilma da tribuna do Senado, quando ela demitiu sete ministros: ‘presidenta, bata na mesa, reúna e diga que a situação está mal, está dramática, está difícil e vamos fazer todos um governo de entendimento a favor do Brasil’. Isso é possível. Sinceramente, isso sempre é possível. Fazer uma coisa onde tenha entendimento, se escolha uma fórmula. Assim como nós fizemos, quando a situação era mais grave, quando fizemos as Diretas Já, pedimos as Diretas Já, não tinha eleição; pedimos o fim da tortura porque a tortura era uma realidade, pedimos a anistia, porque tinha um monte de gente cassado, pedimos a liberdade de imprensa porque a imprensa tinha uma censura total e hoje não é isso. Tudo isso já tem. Essas questões institucionais, direitos estão aí. O que tem hoje mesmo é a corrupção, a roubalheira andando e o governo de olho fechado. Tem que ter alguém para mudar isso. Que tope mudar isso. Aí sim, doa a quem doer. Se de repente, Pedro Simon tá falando contigo, tá muito bacana o que eu estou falando, e de repente você diz: ‘Simon, tem um dinheiro seu em algum lugar’, eu que digo que não tenho um tostão, se aparecer é porque é mentira. Então deixa as coisas saírem ao natural. Quem tiver que sair sai e deixa essa gente nova entrar.
Colaboraram: David Mendes e Fernanda Chagas