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"O PT vai ter que refazer o seu caminho", diz Walter Pinheiro

Tribuna da Bahia - Como o senhor avalia esse início do governo Rui Costa na Bahia? 
Walter Pinheiro - Eu diria que bom até demais, porque Rui começou num ritmo muito interessante, a partir de um patamar consolidado nos últimos oito anos. Na realidade, em um processo de mudanças profundas na infraestrutura e nos serviços. Ao mesmo tempo ele começa o governo entregando muitas obras, muitas dessas ele teve a oportunidade de participar de seu início. Aliado a isso, ele começa muito bem na forma de se relacionar. Aproveitando muito bem o patamar consolidado por Wagner, ele faz as mudanças e os ajustes que já havia anunciado em sua plataforma de campanha.

Tribuna - Como o senhor avalia as críticas de que foi um começo de governo muito mais político do que de cuidado com a gestão?
Pinheiro
- Não vejo dessa forma. Pelo contrário. Rui começou, inclusive, promovendo uma redução da máquina, do número de secretarias e ao mesmo tempo reestruturando também os pontos centrais para podermos ter políticas de ação, de governo para promover melhorias na educação, para promover a reestruturação da área de recursos hídricos, com uma política mais arrojada na área de geração de energia e na atração de investimentos. Ele está aproveitando exatamente o patamar que foi aberto pelo governo Wagner, melhorando a infra, a logística, dando incentivos e tentando estabelecer um processo de desconcentração na economia do estado da Bahia. Eu diria que houve menos política, até porque muita gente tem reclamado que não houve um intenso loteamento dos espaços e que Rui concentrou muito mais a sua energia em tentar arrumar o estado, no ponto de vista da arrecadação, em um ano que todos sabem que será difícil.  Ao mesmo tempo ele está melhorando a máquina pública para enfrentar essas dificuldades e produzir até muito mais do que foi produzido com o governador Jaques Wagner juntamente com ele.

Tribuna - Muitos aliados estão reclamando do espaço concedido ao PT. Como o senhor vê essa reclamação dentro da própria base, já que pessoas fora e dentro do partido não foram contempladas?
Pinheiro –
Olha, o PT tem, inclusive, a coisa máxima que é o governador. Acho que historicamente o PT se acostumou a um processo de ocupação de governo, na experiência com Lula na presidência e Wagner na Bahia, só que à medida que vamos ampliando e atraindo mais gente para a base, é natural que isso mude. Você vê que na campanha de Rui houve um número muito maior de partidos do que nas outras campanhas para a eleição do governador Jaques Wagner. É natural que esses espaços sejam cada vez mais compartilhados com os aliados da gestão, portanto acho que o PT está muito bem representado.  Não tenho o que reclamar. Talvez tenha um ou outro, aqui ou acolá, que por ventura poderia ter um processo de contemplação e está achando que não foi coberto, mas acho que o governador está tocando isso com muita sabedoria. Ele evitou essa coisa do loteamento, fez uma coisa positiva com o PT, não tratou com as tendências, mas sim com o partido, o que é algo muito legal. Acho que o PT tem mais é que contribuir com o programa. A ocupação do espaço é uma consequência da coalizão. Acho que o PT tem que ser cada vez mais um partido que busque chegar junto ao governo, até para compartilhar com o governo o que ele apresentou enquanto programa e garantir nesses próximos quatro anos algo a mais, até porque foi isso que anunciamos na campanha de Rui.

Tribuna - Mais um ano eleitoral se aproxima. Em 2016 existe alguma possibilidade de representar o partido nas urnas novamente?
Pinheiro -
Olha, essa história de dizer que serei ou nunca serei, podem ser palavras ao vento. Eu tenho dito que em 2016 eu gostaria de contribuir até mais com o partido no estado, acompanhando as eleições, como eu fiz em 2012, mas que de certa forma depois tivemos que voltar as batérias para Salvador com Nelson (Pelegrino). Eu acho que será muito importante a gente se consolidar no estado como um todo. Óbvio que Salvador tem um peso fundamental, mas precisamos parar com essa história de achar que tudo é a capital. A capital é muito importante, o governador está fazendo investimento de mais de R$8 bilhões em mobilidade em Salvador e ainda vai fazer muito mais. Porém, precisamos de uma política mais ampla para ajudar outras regiões, e eu queria me colocar à disposição disso, para garantir que possamos debater um programa de governo para cada município, consolidando e firmando a nossa gestão na Bahia com o processo de vitória dos nossos aliados e do nosso partido em 2016.

Tribuna - Alguns aliados falam em lançar suas próprias candidaturas.  O senhor acha que o PT vai ter maturidade política e abrir mão de encabeçar a chapa?
Pinheiro -
É outra coisa que nós fomos aprendendo. É óbvio que quem está no terceiro mandato no estado e no quarto mandato no cenário nacional diga que o PT não abre, mas, talvez 2016 seja o ano de experimentar, ver as boas parcerias. É claro que é natural que o PT pleiteie isso, mas também não pode ficar como um manto sagrado essa história de que a gente só disputa a eleição com um nome nosso. Se for sempre assim, os aliados vão dizer: - O PT só chama a gente para votar neles e na hora que é pra votar na gente o PT não topa. Chegou a hora de a gente fazer outro tipo de debate. Caso seja feito assim, talvez consigamos até juntar mais dentro da cidade de Salvador. O PT tem que entrar nessa disputa pensando que pode ter nomes de fora do partido.
 
Tribuna - Como vê os escândalos envolvendo a Petrobras? O senhor acredita que isso pode prejudicar a estabilidade do país?
Pinheiro -
No ponto de vista da economia não é fácil tratar de uma área que é decisiva. Eu vou falar em números para que a gente possa entender o que é isso. Se você pegar os quatros anos do PPA em nível nacional vai encontrar um orçamento de investimento que todo mundo ficou conhecendo como PAC, algo em torno de R$165 bilhões. Desses, as estatais ficavam com R$ 101 bilhões. Desses mais de R$100 bilhões, a Petrobras entrou com R$78 bi, portanto essa empresa desde o início da Operação Lava Jato está numa completa retração. Veja aí a situação do Estaleiro na Bahia (Paraguaçu), o não pagamento dos serviços que estão sendo feitos, a própria paralisação. Imagine o que é do investimento de R$165 bilhões, você retirar R$75 bilhões. Isso impacta na economia, no mercado, na geração de postos de trabalho, na distribuição de renda, no consumo, consequentemente você cria um ambiente de dificuldade para qualquer governo. Essa é, além de uma crise política, algo extremamente incisivo para a economia.

Tribuna - O senhor acha que esses escândalos podem atingir o ex-presidente Lula?
Pinheiro -
Eu acho que nem o presidente Lula, nem a presidente Dilma. Você tem uma ação de figuras que na realidade durante anos e anos a fio se acostumaram a lidar com uma coisa muito clara hoje que é tentar fazer pressão aos fornecedores e ou às empreiteiras que prestavam serviço à Petrobras, casos até meio estranhos de alguém pegar e devolver de uma hora para outra quase R$100 milhões guardados e dizer que fazia essa operação para atender partidos políticos. Então, na realidade, essas pessoas agiam muito em seus nomes pessoais e buscando, inclusive, amealhar fortunas. Essa coisa da gestão da Petrobras tem erros e você pode dizer que o presidente Lula e a presidente Dilma poderiam cobrar mais. Na realidade, a Petrobras é uma empresa que tinha uma direção e todo mundo entendeu que houve falhas de gestão, ausência de controle interno, um processo mais rigoroso, a publicização maior dos atos. A forma de você inibir é colocar mais transparência e quebrar essa autonomia que diretores tinham para fazer mais relações. Em um dos depoimentos, algumas empresas dizem que determinados diretores alegavam que se não fossem atendidos no seu pedido que não passariam adiante aditivos e ajustes de contrato. Esse é o fio da meada que nós temos que pegar. Temos que aproveitar essa apuração da Polícia e do Judiciário para tirar lições não só para coibir, mas para prevenir desvios de dinheiro público.

Tribuna - Depoimentos de delação colocam o PT em uma situação muito delicada, pois um dos delatores afirmou que foram repassados mais de R$200 milhões para os cofres do partido. Como o PT vai se defender caso haja provas reais?
Pinheiro -
Uma coisa que está sendo debatida no Congresso é o financiamento de campanha. Historicamente, todo mundo foi financiado, candidatos, partido, e agora alguém tenta estabelecer que essas doações ainda que legais e com devidas prestações de contas, que isso é vínculo de retirada de dinheiro para depois passar legalmente para os partidos. É obvio que o PT terminou sofrendo muito esse processo. O Partido vai ter que se debruçar cada vez mais junto ao Congresso Nacional para repensarmos esse modelo. Eu, inclusive, apresentei propostas de mudanças na legislação eleitoral, na formação de partidos, precisamos reconstruir essas questões da própria organização partidária. Precisamos ter regras mais rígidas em relação ao financiamento e à organização partidária. Eu não sou contra a criação de partidos, mas acho que tem que ter regras, tem que se ter a obrigação para que partidos tenham diretórios, acabar essa história de donos de partido, ter uma coisa muito mais clara do ponto de vista da contribuição, acabar essas contribuições e a forma com que elas são feitas, o que tem tornado as campanhas caríssimas. É preciso estabelecer outro nível de processo eleitoral, o que vai ajudar a banir essas situações. O PT vai ter que refazer o seu caminho para continuar sendo um partido que busque cada vez mais a questão da gestão pública, e o PT busque resgatar algo que sempre foi a nossa marca e que hoje eu diria que está extremamente arranhada. 
    
Tribuna - O senhor era líder do governo no Congresso Nacional e a presidente Dilma hoje passa pela pior crise desde que o PT chegou ao poder. Qual a saída estratégica para que ela tenha estabilidade para governar o país?
Pinheiro -
Olha, eu acho que aí tem vários fatores que precisam ser reconsiderados. Tem que ter também por parte do governo uma mudança de atitude, não uma mudança na renegociação de cargos, mas uma mudança de atitude, inclusive no diálogo. Tem que ter por parte do governo uma definição de rumos. Para dialogar com o Congresso não basta só ir lá conversar. Não é essa história de vou lá pra dialogar, pra pedir para votar, mas é ouvir o Congresso para que ele seja parte do projeto. Eu não concordo com essa coisa de só levantar a mão e apertar o botão. Eu quero ser parte do programa, então tem que discutir conosco. Só se ganha o Congresso quando se envolve o Congresso. A presidente falou ao final da eleição em mais diálogo, mas eu diria que além do diálogo deve haver a escuta, tem que ser algo compartilhado, tem que se discutir os rumos, mandar para o Congresso Nacional pontos importantes da educação, da economia, saúde, segurança, postos de trabalho, definindo uma pauta consequente, uma pauta que resgate a vida nos municípios que estão quebrados, assim como os estados que também estão quebrados. É importante que se estabeleça uma pauta e é dessa forma que acho que é possível ganhar a governabilidade. Além disso, a presidente não pode se manter numa lógica de que os ministros vão lá e até conversam com o Congresso Nacional, mas tem que ser aquela história do futebol, em que pênalti é tão importante que deve ser batido pelo presidente do clube. Com isso era importante que ela fosse para essa ação mais direta, dialogar, receber, conversar. Antes de lançar pacotes e medidas tem que chamar os congressistas para conversar, para que eles possam inclusive opinar, portanto acredito que é possível retomar, mas retomar, mudando, inclusive, a forma de governar como foi praticada nos últimos quatro anos. 
 
Tribuna - Como o senhor vê as investidas do ministro Aloizio Mercadante para limitar a atuação do ministro Jaques Wagner?
Pinheiro -
Eu diria que tem muito folclore em relação a isso. Todo mundo está tentando estabelecer uma guerra, e aí vai criando, não vou dizer mentiras, mas verbalizando coisas que não são verdadeiras. Não é da índole do ministro Jaques Wagner fazer disputas e outra, cada um tem um papel na estrutura do governo. Eu particularmente acho que o certo cada vez mais é que a gente amplie mais o núcleo de governo para que se tenha, como eu já disse, a participação de membros do Congresso. Eu acho que esse ajuste é possível, mas ele não pode ser feito nem por Wagner nem por Mercadante. Esse ajuste tem que ser feito por Dilma Rousseff.

Tribuna - Em 2018, Lula é o candidato natural à sucessão de Dilma ou Jaques Wagner vai se viabilizar até lá?
Pinheiro -
Esse é um dos problemas do Brasil, porque a gente sai de uma eleição e já está pensando em outra. 

Estou propondo por isso que tenhamos eleições gerais. Eu acho que temos uma responsabilidade muito grande para resolver o caminho. Se formos debater 2018 agora, talvez a gente aumente a briga entre os ministros, acirre a disputa entre os partidos da base e aí, consequentemente, o povo vai dizer à gente em 2018: - Ora, vocês ficaram o tempo inteiro só discutindo eleição e eu quem fiquei aqui amargando o dissabor da crise. Se a gente quiser em 2018 apresentar nomes que tenham efetivamente condições de continuar tocando a política no Brasil, a gente tem que fazer uma boa gestão é agora. Se a gente fizer uma boa gestão na época e no momento certo, o nome aparecerá.

Tribuna - Para finalizar, quais são as prioridades do seu mandato?
Pinheiro -
Olha, eu estou trabalhando uma lógica de que nós vamos promover mudanças profundas. Primeiro é promover mudanças profundas na estrutura política. Não dá mais para continuar mantendo eleições dessa forma, tendo partidos constituídos com donos. Precisamos resolver isso. Precisamos acabar com a reeleição, acabar com a eleição de dois em dois anos, acabar com essa história de financiamento como é feita hoje. É preciso colocar o dedo nessas feridas. Fiz uma emenda constitucional e estou brigando por isso. Chego a arriscar que se essa condição não mudar em 2018 eu não vejo mais nenhum sentido em continuar disputando. Vou fazer 26 anos de mandato parlamentar, acho que minha contribuição até está dada, e portanto posso contribuir em outra frente. Em outro aspecto a minha contribuição deve ser na reforma do pacto federativo. A vida não se processa na União, mas sim no município. Você faz investimento é no município, por isso é preciso quebrar essa lógica de arrecadação centralizada, de governo centralizado, até porque como vamos resolver problemas sérios que a gente enfrenta nos municípios, como os custeios da saúde e da educação, a oportunidade de gerar postos de trabalho. Eu vou voltar as cargas com um projeto que eu relatei, que lamentavelmente  morreu, fazendo uma redistribuição do ICMS, criando novos paradigmas para que possamos ter um novo desenvolvimento local e mexer em três pontos essenciais como a educação com ciência e tecnologia, dando mais inclusão, à saúde – o programa Mais Médicos é bom, mas não está completo. Por que toda vez que eu abro uma unidade do Judiciário em qualquer lugar ou interior do país eu tenho que ter um juiz, mas faço um hospital e não tem médico? Não há fórum aberto no interior sem juiz, mas quando se constrói um hospital não tem médico, então eu defendo uma carreira médica no Brasil. É fundamental isso. Você pode trazer médico de tudo quanto é lugar, mas é importante a gente ter uma carreira; e outra é resolver o problema do financiamento da saúde. E por último é outra coisa da segurança. O governo tem que aportar dinheiro pra aqui, estender o papel para se dar tranquilidade ao cidadão, resgatar essa coisa do sujeito poder andar. 

Colaboraram Fernanda Chagas e Lilian Machado.