Opinião

Joana Angélica, mártir da Independência

À medida que o tempo passa e as noções de civismo estão sendo relegadas ao esquecimento, nada melhor do que recordar os vultos históricos que ajudaram a construir o sentimento e o orgulho nacionais.

Não se vê mais, em nossos dias, tributar-se homenagens aos nossos heróis, tal como se fazia há alguns anos.

Releio, entre os meus guardados, um amarelado convite impresso em 1972, lá se vão, portanto, 37 anos, em homenagem à Sóror Joana Angélica de Jesus, quando se celebrou o sesquicentenário do seu martírio, ocorrido a 20 de fevereiro de 1822.

Joana Angélica nasceu, em Salvador, na Freguesia da Sé, a 19 de dezembro de 1761. Era filha de José Tavares de Almeida e Maria da Silva, tendo sido batizada na Igreja da Sé, infelizmente destruída em 1923. De acordo com Bernardino de Souza, Joana Angélica era uma jovem de "fina estirpe e educação esmerada. Os atrativos de sua alma culminavam na bondade e na virtude e, conforme a tradição, sempre se revelava de forte ânimo e varonil resolução".

Em 1782, aos 20 anos de idade, ingressou no noviciado do Convento de Nossa Senhora Conceição da Lapa. No dia 18 de maio de 1783 fez sua profissão solene no mesmo convento.

Decorridos alguns anos, em 1814, com apenas 31 anos, foi eleita Abadessa do Convento da Lapa, para o triênio 1814 a 1817. É eleita para o mesmo cargo, pela segunda vez, para o triênio 1820 a 1823.

Morreu assassinada pelos soldados portugueses, na defesa da sua fé e da sua pátria, entre 11e 12 horas da manhã, com 60 anos, dois meses e 9 dias de idade. "O local em que caiu, tombada em sangue, vítima de uma baionetada de um dos bárbaros assaltantes, foi em frente à porta da clausura, que dá para o pátio murado, paralelo à Rua da Lapa, porta de entrada para o Convento".

O Convite a que me refiro está redigido nos seguintes termos: "A ordem das Irmãs Concepcionistas Franciscanas, a Universidade Católica do Salvador e o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, comemorando a 20 de fevereiro próximo o sesquicentenário do martírio de Sóror Joana Angélica, a primeira heroína da Independência do Brasil, têm a imensa satisfação de convidar as Exmas. Autoridades Civis, Militares e Eclesiásticas, e o povo baiano para as seguintes solenidades: 20h - Missa de ação de graças na Igreja do Convento da Lapa, celebrada pelo Exmo. e Revmo. Sr. D. Avelar Brandão Vilela, Arcebispo da Bahia e Primaz do Brasil que, ao Evangelho, falará sobre o martírio da heroína baiana; 20h30 – Inauguração das lápides comemorativas, colocadas pelo Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e pela Universidade Católica do Salvador, junto ao histórico portal onde tombou a heroína baiana, as quais serão descerradas respectivamente pelos Exmos Srs. Dr. Antonio Carlos Magalhães, governador do Estado, e Dr. Cleriston Andrade, Prefeito Municipal…."

Consta que o Instituto Geográfico e Histórico possuía um crucifixo que pertencera a Joana Angélica. Nunca o vi e, se existia, foi subtraído por algum larápio de "casaca", como muitos que desfalcaram o seu patrimônio.

Conheci, porém, bela e inspirada tela a óleo de Presciliano Silva, reproduzida em vários livros, que foi emprestado ao Governo do Estado, há alguns anos, e jamais devolvido.

A instituição "perdeu" muitos objetos de valor do seu valioso museu, que chegou a possuir 3.000 objetos, muito deles "desaparecidos" na reforma feita na Casa da Bahia, em 1993, outros tantos, inclusive joias e medalhas, em data imprecisa.

Tempo houve em que o IGHB coordenava as comemorações do 2 de Julho e as reuniões preparatórias eram realizadas em sua sede.

Todavia, o seu natural empobrecimento e o surgimento das instituições oficiais ligadas à cultura, relegaram a Casa da Bahia a posição secundária nos festejos.

Talvez muitos baianos desconheçam que os carros do caboclo e da cabocla foram entregues ao IGHB pelo major Cosme de Farias, em 1918.

O 2 de Julho é uma construção coletiva da nossa gente e um mito vinculado à história do Instituto Histórico. Não é sem razão, portanto, que dois dos seus associados mais ilustres, os historiadores Braz do Amaral que, além de escrever "História da Independência da Bahia", anotou a obra de Inácio Accioly e o nosso Luis Henrique Dias Tavares, autor da obra "Independência do Brasil na Bahia", são responsáveis pelo que de melhor se produziu, até os nossos dias, sobre a grande epopeia baiana.

Por tudo quanto aqui foi referido, fica muito claro que o IGHB sempre teve lugar especial nas comemorações do 2 de Julho. Sua sede monumental foi inaugurada em 2 de julho de 1923, a fim de celebrar o 1º centenário da maior data baiana. Em sua sede estão preservadas magníficas telas de alguns dos heróis daquela saga.