Escritos

Crenças limitantes

Como eu não me sentia tão gata, mesmo sendo?

Que bom que os terapeutas nos ajudaram a dar nome as coisas. Ontem, ao receber uma foto num grupo de amigas, consegui compreender com uma clareza assustadora o que significa ter uma crença que nos limita, que funciona como um obstáculo para que experenciemos toda a potência de que dispomos, isso quando não nos causa dores maiores. 

Para esse mal, os antídotos se chamam consciência e resistência.

Minha primeira reação ao ver essa foto de quando eu tinha 20 anos a menos foi pensar: “nossa, como eu era gata!!!!”. E a que veio na sequência foi: “nossa, como eu não me sentia tão gata, mesmo sendo?”, como atesta a foto para o meu olhar de hoje.

E aí, na sequência, veio a revolta pesada, ao me dar conta de que nessa época (na verdade, desde a pré-adolescência), eu procurava esconder ou disfarçar a barriga, mesmo ela sendo daquele jeito. Eram raríssimas as vezes (até então continuam sendo) em que eu tirava uma foto de biquíni com a barriga à mostra. Pensei “que absurdo o que levam a gente a acreditar” e compartilhei com as amigas do grupo para o qual a foto havia sido enviada.

Uma amiga respondeu: “surreal esse seu corpo, Cris, se você se achava gorda, puta que pariu!”.

Aí outra amiga comentou que essa amiga, que era ainda mais magra do que eu, naquela mesma foto, está fazendo um esforço visível para murchar a barriga, igualmente, inexistente.

“Eu vi, muito ridícula, aff!”, disse a amiga que havia questionado como eu podia ter aquela visão sobre meu próprio corpo e reconhecendo que fazia exatamente o mesmo.

Será que as ridículas somos nós?

E a minha criança ferida continua gritando indignada como a menina do meme “Que Xou da Xuxa é esse?”: “Que sociedade é essa que fez isso com a gente? Com TODOS nós, sem exceção. E com as mulheres de forma, infinitamente, mais cruel, em relação a nossos corpos, peitos, peles, lábios, rostos e cabelos”.

Só que agora, com a idade, a pressão, em vez de diminuir, é muito pior, uma vez que a expectativa é de que tenhamos o mesmo corpo de há 20 anos. 

Em meio a esses pensamentos, me lembrei que, dois dias atrás, ouvi, de quem poderia ter me protegido desse tipo de crença, que eu não deveria usar um determinado vestido, porque ele era colado e marcava a barriga: “Fica horrível em você!”.

Na hora, argumentei que eu tinha 48 anos e tive duas gestações depois dos 37, fora isso nunca fiz nenhuma intervenção cirúrgica nem quero ser escrava de academia, dieta e suplementos, embora tenha uma alimentação saudável e faça exercícios regularmente desde os 13 anos de idade.

Mas por que não usar algo que esconda a barriga? Esse era o questionamento, que, para quem o faz, se apoia numa certa razoabilidade.

Mas também não seria razoável se submeter a um procedimento estético ou a uma intervenção cirúrgica, uma vez que temos a nosso alcance (o que se aplica, na verdade, somente a uma parcela restrita da população) toda sorte de produtos e tecnologias para eliminar aquilo que nos incomoda e nos gera infelicidade?

E a solução, em vez de esconder e disfarçar, passa a ser suprimir a barriga, preencher a ruga, imobilizando a expressão, inchar os lábios, alisar os cabelos etc. etc., quando o foco deveria ser acabar com as crenças que minam a autoestima, fomentam as relações de opressão e provocam toda a sorte de dependências: nos produtos e procedimentos estéticos, nos antidepressivos e ansiolíticos, nos relacionamentos abusivos etc. etc.

Em vez de ficar apontando algozes, melhor reconhecer que todos somos vítimas, e que, se não exercemos o papel de algozes em relação aos outros, o fazemos contra nós mesmos. Portanto, quem nunca se julgou que atire a primeira pedra!!! E no espelho distorcido, de preferência!!!

Se é para deixar de mimimi, melhor botar nossos croppeds e ir à luta. Se fere nossa existência, sejamos resistência!!! Amar o próprio corpo também é revolucionário!!!