O gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta terça-feira (13) que foram oficiais e regulares todos os procedimentos realizados para requisitar informações ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no âmbito dos inquéritos que investigam a disseminação de fake news e a atuação de milícias digitais durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A declaração foi divulgada após o jornal Folha de S.Paulo publicar uma reportagem na qual diz que Moraes usou "formas não oficiais" para determinar a produção de informações para investigar aliados de Bolsonaro durante as eleições de 2022, período em que o ministro foi presidente do TSE.
A reportagem afirma que o gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes "escolhia" pessoas a serem investigadas pelo órgão de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – na época, também sob comando do ministro.
Segundo o jornal, o setor de combate à desinformação do TSE foi "usado como braço investigativo do gabinete do ministro no Supremo". Revelam, também segundo o jornal, um "fluxo fora do rito envolvendo os dois tribunais [TSE e STF]".
Conversas em poder da Folha mostram, de acordo com a reportagem, que os relatórios eram ajustados quando não ficavam a contento do gabinete do STF e, em alguns episódios, feitos sob medida para embasar uma ação pré-determinada, como multa ou bloqueio de contas e redes sociais.
As mensagens foram trocadas via WhatsApp por auxiliares de Moraes, entre eles o seu principal assessor no STF, que ocupa até hoje o posto de juiz instrutor (espécie de auxiliar de Moraes no gabinete), e outros integrantes da sua equipe no TSE e no Supremo.
As mensagens foram trocadas entre Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes no STF, Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes durante sua presidência no TSE, e Eduardo Tagliaferro, então chefe da AEED (Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação), órgão que era subordinado a Moraes na corte eleitoral.
Em áudios, o juiz instrutor Airton Vieira demonstrou preocupação com a forma de atuação dos gabinetes do ministro.
"Formalmente, se alguém for questionar, vai ficar uma coisa muito descarada, digamos assim. Como um juiz instrutor do Supremo manda [um pedido] pra alguém lotado no TSE e esse alguém, sem mais nem menos, obedece e manda um relatório, entendeu? Ficaria chato."
Em nota, o gabinete de Moraes disse que o TSE tem poder de polícia e pode realizar as pesquisas.
Leia abaixo a íntegra da nota divulgada pelo gabinete do ministro Alexandre de Moraes no STF:
"O gabinete do Ministro Alexandre de Moraes esclarece que, no curso das investigações do Inq 4781 (Fake News) e do Inq 4878 (milícias digitais), nos termos regimentais, diversas determinações, requisições e solicitações foram feitas a inúmeros órgãos, inclusive ao Tribunal Superior Eleitoral, que, no exercício do poder de polícia, tem competência para a realização de relatórios sobre atividades ilícitas, como desinformação, discursos de ódio eleitoral, tentativa de golpe de Estado e atentado à Democracia e às Instituições. Os relatórios simplesmente descreviam as postagens ilícitas realizadas nas redes sociais, de maneira objetiva, em virtude de estarem diretamente ligadas às investigações de milícias digitais. Vários desses relatórios foram juntados nessas investigações e em outras conexas e enviadas à Polícia Federal para a continuidade das diligências necessárias, sempre com ciência à Procuradoria Geral da República. Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria Geral da República."
O ministro também esclareceu, por meio do gabinete, que os relatórios apenas descreviam postagens ilícitas nas redes sociais e eram enviadas para investigações da Polícia Federal.
"Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República", conclui a nota.
A Folha de S.Paulo teve acesso a mais de 6 gigabytes de mensagens e arquivos trocados via WhatsApp por auxiliares de Moraes entre agosto de 2022, já durante a campanha eleitoral, e maio de 2023, tendo obtido o material, de acordo com o que informou, de fontes que tiveram acesso a dados de um telefone que contém as mensagens, não decorrendo de interceptação ilegal ou acesso hacker.
Senador quer investigar
O senador Cleitinho (Republicanos-MG) chamou a atenção, em pronunciamento na terça-feira (13), para matéria divulgada pelo jornal Folha de S. Paulo que afirma que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), teria utilizado o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para investigar apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. O parlamentar disse que o Senado não pode prevaricar em relação ao caso e pediu que o Casa instale uma CPI para apurar a situação.
— No mínimo, tem que ser apurado isso aqui. Não estou aqui acusando, porque isso saiu agora, mas eu acredito que o Senado, que tem essa competência, essa prerrogativa, tem que fazer a convocação de todas as pessoas que estão nos áudios aqui, inclusive o ministro Alexandre de Moraes. Inclusive, para mim, deveria ter uma CPI da vaza toga.
Cleitinho também afirmou que vai assinar o pedido e impeachment de Moraes e criticou a decisão do ministro em suspender novamente as redes sociais do senador Marcos do Val (Podemos-ES), além de ordenar o bloqueio de R$ 50 milhões do senador. Cleitinho ainda pediu que os parlamentares que se elegeram com o apoio de Bolsonaro se posicionem sobre o caso.
— Todos aqueles que foram [apoiados por Bolsonaro], em 2018 e 2022, eu espero que se posicionem em Plenário, venham à tribuna e falem sobre essa situação ou, no mínimo, assinem para a gente pedir a CPI dessa vaza toga, ou senão esse requerimento sobre a questão do impeachment do Alexandre de Moraes. Quantos bolsonaristas aqui foram apoiados pelo Bolsonaro e foram votados pelos bolsonaristas? Chegou a hora de a gente poder se posicionar e botar certas pessoas nos lugares deles.
O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) discursou no plenário chamando Moraes de "mau-caráter", "mentiroso" e "covarde" que "se esconde atrás da toga".
Na internet, Nikolas disse que vai "requerer ao jornalista @ggreenwald [coautor da reportagem] o acesso completo aos materiais citados, para que possamos utilizá-los na CPI já protocolada na Câmara sobre abuso de autoridade".