Pititinga é um pequeno peixe de escamas, que habita regiões costeiras e costuma formar grandes cardumes. Apesar de ágil, é presa fácil para outros peixes e aves, e para os seres humanos que devoram porções de pititingas fritas.
Longe dos oceanos, há outros seres que, assim como as pititingas, são vistos como “peixes pequenos” e que sem poder nem prestígio têm as suas subjetividades devoradas por uma sociedade repleta de regras e padrões estéticos e morais.
É sobre esses seres que trata o espetáculo “Pititinga – Peixe Pequeno”, uma produção que reúne artistas baianos e brasilienses, e que estreia em Salvador, nos dias 12 a 17 de setembro, no Teatro Gamboa Nova, como parte da programação do mês da diversidade na Bahia.
As sessões começam às 19h (terça a sábado) e 17h (domingo), e os ingressos podem ser adquiridos no Sympla ou na bilheteria do teatro por R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).
No palco, três atores e uma atriz brasilienses – Ellen Gabis, Davi Dias, Jefferson Vieira e João Paulo Machado – interpretam as “criaturas-peixe”, seres que navegam no mar de suas memórias e dores, mas também nas águas da cura, num mergulho interno à procura de respostas. Afinal, como as pessoas que escapam à norma encontram sentido para as suas existências?
O espetáculo reflete sobre as aflições de pessoas atípicas ou corpos marginalizados, sobretudo, no que diz respeito à sexualidade, gênero e racialidade.
As vidas das “criaturas-peixe” costumam ser marcadas também pelo amor não correspondido; pelo abandono, às vezes, dos próprios pais; pela incompreensão e invisibilidade; pelo medo da solidão e da morte.
Por essas linhas passam as histórias costuradas no palco pelas quatro personagens, que buscam encontrar os seus lugares no mundo e entender os seus próprios desejos.
Em diálogo com o Teatro Documentário, gênero criado pelo diretor alemão Erwin Piscator, nos anos 1920, que utiliza documentos e memórias como fontes para a elaboração do espetáculo, “Pititinga – Peixe Pequeno” possui uma dramaturgia autoral e coletiva. Através de experimentos, exercícios e compartilhamentos de depoimentos, fotografias, relatos, entrevistas, cartas e diários, os atuantes produziram relatos autobiográficos para a construção colaborativa da dramaturgia.
Esse processo colaborativo foi orientado pelo ator e diretor baiano Thiago Carvalho, que assina a direção do espetáculo. Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas – PPGAC-UFBA, Thiago esteve como professor substituto na Universidade de Brasília – UnB, quando conheceu os atuantes brasilienses que formam o Coletivo Poéticas da Meia Noite. “Neste trabalho, buscamos radicalizar a linguagem, ou seja, criar mecanismo de contraponto ao que está posto como norma, propondo um novo modo de se expressar”, explica Thiago.
Já a visualidade do espetáculo se inspira na imensidão do mar, através das redes que, por vezes, aprisionam as “criaturas-peixe” e, por outras, as conectam pelas redes da vida e do mundo digital; e também nas escamas, entendidas como sendo as camadas de informações que cada ser carrega, sejam camadas psicológicas, sociais, existenciais.
“Durante o espetáculo, o figurino vai sendo desconstruído, perdendo e ganhando novas camadas para revelar a essência individual de cada ser, até chegar à pele”, explica o figurinista Rino Carvalho. A cenografia e a luz são assinadas por Yoshi Aguiar.
Processo criativo online
Embora o início do trabalho tenha se dado na presencialidade, a maior parte do processo foi desenvolvida através de plataformas e aplicativos online, uma vez que Thiago precisou retornar à Bahia. “Uma das fases prioritárias do processo criativo, em que foram analisadas as construções textuais e definidos os estados emocionais, e a ‘fisicalização’ destes por parte dos artistas/propositores, foi realizada por meio da telepresença”, conta ele.
Thiago lembra que iniciou suas primeiras experiências tanto de criação cênica quanto de apresentação ao público em ambiente virtual durante a pandemia da Covid-19 e, desde então, compreendeu que “este se trata apenas de uma nova ferramenta para a criação do evento teatral”. No período pandêmico, ele dirigiu o trabalho cênico “Entocadas”, do Coletivo das Liliths, e o espetáculo “Corpo Presente” do grupo de Teatro Finos Trapos, solo da atriz Carla Lucena que foi adaptado do virtual para o palco e tem feito apresentações na Bahia.
“No início, o coletivo não achava possível acontecer uma comunicação legítima, mas essa experiência corroborou para compreendermos as potencialidades do meio digital para o teatro”, afirma Thiago. Ele destaca que, mesmo no meio digital, a medida humana não é descartada, permitindo assim diálogos entre pessoas, tecnologias e linguagens.
Fundado em 2021, o Coletivo Poéticas da Meia-Noite desenvolve trabalhos no campo da pesquisa, produção e formação, buscando aproximar tradição e contemporaneidade, seja a partir dos temas do imaginário que evoca em suas obras cênicas, seja pelo diálogo da dramaturgia canônica e discussões e procedimentos da criação, como é o caso do processo colaborativo de criação dramatúrgica.
Partindo de uma pesquisa da intersecção entre memória e alteridade na construção dramatúrgica, o coletivo busca provocar o atravessamento “no outro” através da performance art.
Dentro da telepresença, o campo da memória tem sido explorado pelos membros do coletivo na construção de uma ética individual provocada por uma ética coletiva.
Anote
Espetáculo “Pititinga – Peixe Pequeno”
Datas e horários: 12 a 17 de setembro – 19h (terça a sábado) e 17h (domingo)
Local: Teatro Gamboa Nova
Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)
Duração do espetáculo: 60 minutos
Classificação cndicativa: 14 anos