Um aluno de 15 anos da Escola Municipal Manoel Cícero, na Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, tentou agredir na tarde desta terça-feira (28), com golpes de faca, outros estudantes dentro da unidade de ensino. De acordo com a Polícia Militar (PM), uma unidade da Patrulha Escolar do Batalhão do Leblon foi enviada para a escola, localizada na Praça Santos Dumont, após o ocorrido.
A PM informa ainda que “o aluno foi contido por funcionários da unidade". Nesta ação, o agressor se feriu na cabeça, sem gravidade, e foi levado pelos policiais militares ao Hospital Municipal Miguel Couto, no bairro da Gávea, onde passa por atendimento. A investigação está em andamento.
Testemunhas estão sendo ouvidas na 15ª Delegacia Policial (DP), na Gávea. Os alunos da escola foram liberados com o acompanhamento dos responsáveis.
O Corpo de Bombeiros informou que foi acionado às 14h35 para a escola e encaminhou o aluno ferido para o hospital.
O secretário municipal de Educação do Rio, Renan Ferreirinha, publicou informações sobre o caso nas suas redes sociais. Segundo o secretário, após perceber um comportamento estranho do aluno, a diretora o abordou. Foi quando o adolescente puxou a faca em direção aos colegas da sala. A diretora conseguiu evitar que ele ferisse alguém.
'Em seguida, ele foi imobilizado por outros profissionais. "A escola conseguiu acionar a polícia rapidamente e o aluno está sendo interrogado na delegacia. Nosso agradecimento à diretora Jaqueline e sua espetacular equipe escolar”, escreveu Ferreirinha.
O secretário informou ainda que a unidade de ensino será acompanhada pelo Programa Interdisciplinar de Apoio às Escolas (Proinape), que conta com psicólogos, assistentes sociais e educadores "para amenizar o trauma deste acontecimento". “Não podemos normalizar atos de violência em nosso país. Precisamos fazer com que a saúde mental seja uma pauta prioritária de discussão nacional”, defendeu na publicação.

Ataque a escola em São Paulo
O caso ocorreu um dia depois do ataque com faca na Escola Estadual Thomazia Montoro, no bairro Vila Sônia, em São Paulo. A professora Elizabeth Tenreiro, 71 anos, morreu após ser esfaqueada. Um adolescente de 13 anos, responsável pelo ataque, foi apreendido. Elizabeth foi socorrida, mas não resistiu aos ferimentos e morreu. Outros três professores e dois estudantes ficaram feridos no ataque.
Os primeiros relatos ouvidos pela equipe da Agência Brasil apontam que, na semana passada, houve uma discussão entre o jovem responsável pelo ataque e outro estudante. Na discussão, o agressor proferiu ofensas racistas e, desde então, passou a dizer que faria um massacre na escola. Foi decretado luto oficial de três dias no estado, a escola ficará fechada e será avaliada a reabertura gradual.
Representantes da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes) e da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (Umes-SP) fizeram, na manhã desta terça-feira (28), vigília em solidariedade às vítimas do ataque de um adolescente de 13 anos na Escola Estadual Thomazia Montoro, no bairro Vila Sônia, em São Paulo.
Alunos e pais de alunos participaram do ato que homenageou as vítimas e pediu mais atenção e acolhimento aos alunos para que comportamentos fora do normal sejam percebidos antes de culminar em tragédias.
Segundo a presidente da Upes, Luiza Martins, o objetivo do ato desta terça-feira foi prestar solidariedade e mostrar indignação com o ataque a professores e alunos da escola. A estudante destacou que esse tipo de ataque tem sido recorrente e citou o exemplo da Escola Raul Brasil, em Suzano, no interior paulista, há quatro anos. Para Luiza, fatos como esse vêm se repetindo por falta de acolhimento e de psicólogos em número suficiente para atender a todos os alunos.
"Além disso, nos preocupamos muito com o discurso que vem sendo feito sobre colocar a Polícia Militar dentro das unidades, porque acreditamos que isso mais assusta do que resolve o problema. A solução é ter um acompanhamento efetivo com os estudantes. Neste caso mesmo, ele [agressor] vinha dando sinais nas redes sociais e tinha histórico de problemas em outras escolas. Se houvesse um acompanhamento de fato, isso poderia ter sido evitado", afirmou Luiza.
Perda para a educação
O presidente da União Municipal dos Estudantes de São Paulo (Umes), Lucca Gidra, enfatizou que as escolas têm sido cenário de diversas formas de violência. Para Lucca, a escola precisa ser um ambiente de contraponto ao que acontece do lado de fora dos muros, mostrando que a sociedade também pode ser diferente.
"Esta semana é inteira de perda para a educação brasileira, porque não queremos que as escolas sejam reflexo do que acontece na sociedade que está cada vez mais violenta. A escola precisa ser um ambiente acolhedor, seguro, de escuta e de combate à violência. Os jovens estão muito expostos à diversas ondas de violência na internet, na sociedade e acabam reproduzindo isso. Por isso, é importante a discussão constante e a prevenção, porque todos são casos que poderiam ser evitados", afirmou o estudante.
O conselheiro do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) Severino Honorato ressaltou a surpresa com o caso e a percepção de que já havia indícios de que uma tragédia como essa poderia acontecer novamente, uma vez que o aluno já havia sido denunciado sobre visitas a sites de violência e de discurso de ódio sem que nenhuma providência fosse tomada.
"Acreditamos que isso tem relação com a violência da sociedade, de forma geral, que afeta também a escola. Nossa reivindicação é que o Estado tome medidas concretas para evitar casos assim. Não basta colocar câmera, é necessário contratar mais funcionários, psicólogos e ter mais estrutura", alertou.
Jorsany Gabriela, mãe de um aluno de 12 anos, lamentou a morte da professora e elogiou seu trabalho e dedicação na escola. "Ela era um exemplo, já estava aposentada, mas tinha amor pelo que fazia". Jorsany pediu que todos, escola, professores e pais prestem mais atenção no que está acontecendo com os alunos e diz que agora se sente insegura para mandar o filho para a escola. "Ele nem quer vir. Não só ele, como outros alunos não querem voltar."
O Apeoesp informou que vem realizando campanhas como Paz nas Escolas e Livros Sim, Armas Não, cujos resultados aliam-se aos dados colhidos em sucessivas pesquisas sobre violência nas escolas. Como parte dessas campanhas, o sindicato tem mostrado a necessidade de medidas eficazes do Estado, tanto no sentido de prevenir quanto de combater casos de violências nas unidades escolares.
O sindicato diz que é preciso pensar na prevenção à violência nas escolas de forma mais ampla, principalmente considerando a disseminação de mensagens que promovem o uso de armas e como isso afeta os jovens. São necessárias iniciativas de conscientização sobre a violência e formas de evitá-la. “Também é fundamental que tenhamos em cada unidade escolar psicólogos para dialogar com os estudantes e demais segmentos da comunidade escolar, além de um maior número de funcionários”, reforça o sindicato.
23 ataques em escolas
Desde 2002, o Brasil já registrou 23 ataques em escolas, de acordo com levantamento de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Após ataque mais recente ocorrido nesta segunda na escola da Vila Sônia, na capital paulista, o governador de São Paulo anunciou a presença mais ostensiva de policiais militares dentro das instituições de ensino. No entanto, para o secretário Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente, Ariel de Castro Alves, medidas como essas não ajudam a resolver o problema
"Nós precisamos ver com certa cautela esse tipo de medida, assim como ter detectores de metais em todas as escolas. A educação não pode estar vinculada à repressão. Então, é necessário tratar com certa cautela essas situações para que a gente não tenha também abusos e maiores violências, inclusive casos que possam ser de violência policial. O que precisamos é de medidas para investigar essas situações logo que elas acontecem", disse o secretário.
O ataque ocorrido segue um mesmo padrão dos anteriores levantados pelo estudo da Unicamp, de meninos ou homens, quase sempre brancos, atraídos por discursos de ódio e racismo dentro de grupos da internet, conforme explicou Cleo Garcia, mestranda em educação na Unicamp e especialista em justiça restaurativa.
"Discurso de ódio, misoginia principalmente, talvez baseada em baixa auto estima, em ter sido rejeitados por meninas, mas todos eles tem um discurso muito forte contra meninas. Outra coisa é essa questão de frequentarem esses chats que a gente considera que fazem especificamente discursos de ódio voltados para esse público, e fazem uma cooptação e engajamento desse adolescentes", defende a mestranda.
Dessa forma, Ariel de Castro Alves falou da necessidade de haver nos currículos escolares conteúdo a respeito de cultura de paz e direitos humanos para prevenir as situações de violência dentro das escolas. Cleo Garcia por sua vez, trouxe reflexão a partir do caso de violência ocorrido na segunda-feira, de qual deve ser o caminho trilhado pela sociedade.
"Eu sei que as pessoas olham muito para essas questões sobre se parece que vai haver uma impunidade, o adolescente vai sair em três anos, mas precisamos pensar o que a gente quer para o adolescente que foi internado, ou sabemos que ele vai sair e a gente vai ter que ressocializar. A gente quer vingança ou uma justiça que traga uma transformação dessa pessoa?", questionou.
Um dos caminhos propostos para a resolução de conflitos dentro das escolas é a Justiça Restaurativa, a de resolução dos conflitos sem, necessariamente, envolver punição e com o foco voltado a reparar danos às vítimas.
Desde 2010, o estado de São Paulo regulou a figura do professor mediador nas escolas estaduais, no entanto, Cleo Garcia avalia que não é o suficiente, sendo necessário o envolvimento de todos da comunidade escolar, alunos, professores e pais para que os conflitos sejam resolvidos dentro da lógica da justiça restaurativa.