Cinema

Um filme para se ver de coração aberto

Na resenha de Nila Costa

Foto: Divulgação
Os Três Cristos

Os Três Cristos é um longa de 2017 dirigido por Jon Avnet ( Cisne Negro) baseado em um livro de Milton Rokeach. Milton, cujo nome original era Mendel Rokicz, foi um psicólogo social judeu nascido na Polônia em 1918 que emigrou para os estados unidos aos 7 anos de idade.

O filme trata do seu trabalho no Hospital Estadual Ypsilanti, em Michigan, quando acompanhou três pacientes esquizofrênicos e paranoicos que portavam transtorno de identidade acreditando todos eles serem Jesus Cristo.

Aqui, o doutor Alan Stone, interpretado por Richard Gere, vai propor um tratamento inovador. Aquela época o tratamento psiquiátrico se baseava em eletroconvulsoterapia, choque insulínico, lobotomia pré-frontal, e drogas antipsicóticas, sendo o espaço para psicoterapia mínimo ou quase inexistente.

A proposta de Stone é estabelecer um diálogo entre eles e acompanhar esta interação de maneira a observar como eles poderão se “rever” a partir de suas crenças identitárias.

O “Eu Dividido”, livro de Ronald Laing, aparece em várias tomadas. Laing foi um psiquiatra britânico que ganhou notoriedade por seus trabalhos com pacientes psicóticos indo de encontro à psiquiatria ortodoxa. Neste livro ele expõe a compreensão subjetiva, verdadeiramente psicológica, dos pacientes classificados como esquizofrênicos. E é justamente isto que o Dr. Alan propõe durante toda a jornada didática, sensível e bem construída do filme.

Mas como tudo que é inovador, oferece resistência, medo e incertezas. É o que diz a Dra Victoria, sua superiora ao citar um poema de Emily Dickinson ( But let a splinter swerve) sobre o poder de uma ideia original, como ele pode mover montanhas e deixar um campo de destroços em seu rastro. “O seu trabalho é inovador, brilhante e perigoso. Decida se as conquistas superam os riscos óbvios".

Ao propor o vínculo terapêutico, a possibilidade de compreender metaforicamente as palavras , respeitar o universo não tangível do desconhecido do outro e sobretudo propor uma medicina empática, o trabalho do Dr. Alan dialoga profundamente com a Dra Nise ( Nise : o Coração da Loucura, 2016).

Por último, mas não menos importante, o quanto explorar lugares desconhecidos nos afeta. Não se trata do processo transferencial mas do quanto de nós se revela e se modifica no espaço entre o eu e o outro.

Definitivamente um filme para se ver com a mente e o coração abertos, e deixar que um fragmento se desvie…

Os Três Cristos está disponível na plataforma da Netflix.

Nila Costa é médica e psicoterapeuta.