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Documentário acusa Vaticano de esconder paradeiro de adolescente

Emanuela Orlandi está desaparecida há 39 anos

Emanuela Orlandi, desaparecida

Roma, 1983. Depois de sair da aula de música, a jovem Emanuela Orlandi nunca mais foi vista. Seu desaparecimento envolve o Vaticano em um mistério até hoje insolúvel.

É o que mostra o documentário "A Garota Desaparecida do Vaticano", em quatro episódios, disponível na Netflix, no que pode ser o maior escândalo envolvendo a Igreja Católica.

Uma frase curta, dita e repetida pelo papa Francisco ao irmão de Emanuela, Pietro Orlandi, sugere que o Vaticano pode ter escondido informações. "Emanuela está no céu", sussurrou o papa.

“Arrepiou-me o sangue ouvir o Papa dizer que Emanuela estava morta. Não sabemos se ela está viva ou morta porque não há provas. Mas para um chefe de Estado dizer que Emanuela estava morta significava que ele sabia mais do que nós”, disse Pietro.

A produção está recheada de conteúdos inéditos: de acordo com a Netflix, a série traz depoimentos e provas nunca apresentados. “Essas novas vozes pintam um quadro de uma rede sombria de segredos que foram mantidos ocultos a qualquer preço”, diz o documento de divulgação da série.

Veja o trailer da série

A produção foi gravada em Roma durante a quarenta da covid-19, o que permitiu que a equipe filmasse em uma cidade vazia após o toque de recolher.

Entenda o caso

Emanuela Orlandi desapareceu em 22 de junho de 1983. A vítima, filha de um cidadão do Vaticano, Ercole Orlandi, funcionário da Prefeitura da Casa Pontifícia, sumiu em circunstâncias misteriosas com a idade de 15 anos.

Isso poderia parecer à primeira vista um desaparecimento "normal" de uma adolescente, mas logo se tornou um dos casos mais obscuros da história italiana que envolvem o Estado do Vaticano, o Estado Italiano, o Instituto para as Obras de Religião (IOR), a Banda della Magliana, o Banco Ambrosiano e os serviços secretos de vários países, pelo que ainda não foi totalmente resolvido.

Em junho de 2008, Sabrina Minardi, testemunha no julgamento contra a Banda della Magliana e ex-namorada do líder da gangue, Enrico De Pedis, afirmou que Emanuela Orlandi teria sido sequestrada, e em seguida, morta e jogada em um misturador de cimento em Torvaianica, pela organização criminosa de De Pedis.

O criminoso, que possuía contatos com o arcebispo Paul Marcinkus através de Roberto Calvi (já que a Magliana injetava dinheiro no banco controlado pelo Vaticano) teria dito a ela que o sequestro foi uma ordem de Marcinkus, que queria enviar uma "mensagem para alguém acima deles". Segundo Sabrina, o pai da jovem Emanuela "terá visto documentos que não devia ter visto", sendo necessário mantê-lo calado.A publicação do depoimento de Sabrina Minardi provocou protestos do Vaticano.


Emanuela Orlandi

Em 14 de maio de 2012, a polícia italiana exumou o corpo do gangster De Pedis, depois de receber uma denúncia anônima de que um túmulo no Vaticano continha pistas sobre o paradeiro de Emanuela. O corpo de De Pedis estava realmente enterrado na Basílica de Santo Apolinário, juntamente com papas e cardeais, entretanto o corpo de Emanuela não foi encontrado.

Segundo fontes, o cardeal Ugo Poletti, em “face a um montante tão conspícuo, deu sua benção” para o sepultamento do criminoso na Basílica.

Em maio de 2012, o padre Gabriele Amorth afirmou que ela foi raptada por um membro da polícia do Vaticano para orgias sexuais, e então assassinada. Amorth diz que o incidente envolveu também os agentes de uma embaixada estrangeira não identificada. 

Outras fontes policiais afirmam que o sequestro foi feito por terroristas extremistas muçulmanos para exigir a libertação de Mehmet Ali Agca da prisão após ele ter atirado no Papa João Paulo II.

Em 11 de julho de 2019, os túmulos de duas princesas mortas no século XIX no Campo Santo Teutonico, Vaticano foram abertos na esperança de encontrar os restos de Emanuela Orlandi. Os túmulos de Carlota Frederica de Mecklemburgo-Schwerin e Sophie von Hohenlohe estavam completamente vazios.

Em 2019 foram localizadas ossadas num ossário do Colégio Teutónico. O acesso aos restos mortais pode ser feito através de um alçapão que foi alvo de uma inspeção em 20 de Julho de 2019, realizada na presença de representantes da família Orlandi.

Os especialistas a tratar do caso consideram que também os esqueletos das princesas podem ter sido transferidos para aquele local, devido às obras de expansão do Colégio Teutônico, realizadas nos anos 1960 e 1970, tendo estas também afetado o cemitério.

Os peritos que analisaram os restos encontrados em dois ossários no Vaticano concluíram que os ossos encontrados são muitos antigos para serem os de Emanuela Orlandi, não sendo encontrada qualquer estrutura óssea de um período posterior ao final do século XIX.

Uma amiga de infância de Emanuela conta que, dias antes do desaparecimento, a adolescente foi abusada sexualmente dentro do Vaticano por “alguém próximo do Papa”.