Ciência

Como era o réptil voador que teve fóssil encontrado no Ceará

O fóssil foi encontrado na Formação Crato da Chapada do Araripe

Foto: Victor Beccari
Representação de como seria o réptil cearense

O fóssil mais completo encontrado no Brasil do pterossauro Tupandactylus navigans, um réptil voador que povoava os céus há 115 milhões de anos, é descrito em estudo com participação de pesquisadores da USP.

O fóssil foi encontrado na região da Chapada do Araripe, no Ceará, e estava em poder de contrabandistas.

Após ter sido apreendido pela Polícia Federal, foi doado em 2013 para a USP, onde se encontra em exposição no Instituto de Geociências (IGc). A descrição do fóssil é feita em artigo da revista científica Plos One, na edição de 11 de agosto.

De acordo com Beccari, a espécie pertence ao grupo dos tapejarídeos, que são pterossauros conhecidos por terem bocas sem dentes e grandes cristas cefálicas. “Ele era animal de médio porte, com 2,5 metros de envergadura, que viveu onde hoje é o Nordeste do Brasil, durante o Cretáceo Inferior, há aproximadamente 115 milhões de anos”, relata.

“Apesar de o Tupandactylus navigans não ser uma espécie nova para a ciência, pois foi descrita pela primeira vez em 2003, os exemplares conhecidos até o momento preservavam apenas o crânio do animal”, explica Victor Beccari, do Instituto de Biociências (IB) da USP, que faz parte do grupo de pesquisadores que descreveu a espécie. “O material que nós descrevemos conta com a maior parte dos ossos, inclusive crânio e pós-crânio associado, ainda em articulação, e com preservação de tecidos moles, nesse caso, a crista cefálica e o bico de queratina.”

O fóssil foi encontrado na Formação Crato da Chapada do Araripe, no Ceará. “Nessa localidade são encontrados inúmeros fósseis de insetos, plantas, peixes e outros vertebrados, mas fósseis de pterossauros ainda são raros”, aponta o pesquisador. “Pterossauros dessa localidade são, em sua maioria, incompletos, contando apenas com o crânio ou o pós-crânio, mas dificilmente ambos em associação.”

Beccari aponta que os pterossauros, parentes dos dinossauros, eram répteis voadores que já povoavam os céus antes do aparecimento das primeiras aves. “A partir do estudo de sua anatomia e comparações com outras espécies conhecidas de pterossauros, concluiu-se que este animal não voava bem e passava a maior parte do tempo se alimentando em terra firme”, aponta. “Especula-se que tanto sua enorme crista cefálica quanto sua crista dentária, isto é, da mandíbula, podem ser características associadas ao dimorfismo sexual, ou seja, das diferenças entre machos e fêmeas.”

Segundo o pesquisador, o fóssil foi interceptado pela Polícia Federal em 2013, em uma operação que apreendeu mais de 3.000 fósseis que seriam contrabandeados para Europa, Estados Unidos e outros países do Hemisfério Norte. “Uma vez depositado na USP, parte do material apreendido, incluindo o pterossauro, encontra-se na exposição Fósseis do Araripe do Museu de Geociências do IGc”, conta. “Os pesquisadores tiveram acesso ao fóssil pela primeira vez em 2016, quando começamos esse estudo.”


Fóssil do Tupandactylus navigans, como foi encontrado na Formação Crato - Foto: Victor Beccari 

“Esse é um entre inúmeros exemplares submetidos ao tráfico de fósseis, mas a maioria deles é perdida para o exterior, seja em coleções privadas, ou museus no mundo inteiro”, ressalta Beccari. “Com isso, parte do patrimônio paleontológico brasileiro não é acessível à comunidade científica brasileira ou à sociedade, não trazendo retorno financeiro, turístico e científico para as comunidades locais.”

“A descrição do fóssil vai ajudar a trazer novas informações sobre a anatomia e ecologia de um dos grupos mais peculiares de pterossauros”, conclui o pesquisador. O trabalho teve a participação de Victor Beccari, do IB, da NOVA School of Science and Technology, em Portugal, Luiz Eduardo Anelli, do IGc, Felipe Lima Pinheiro, da Universidade Federal do Pampa, Ivan Nunes, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Octávio Mateus, da NOVA School of Science and Technology, Portugal, e Fabiana Rodrigues Costa, da Universidade Federal do ABC (UFABC).