A Câmara dos Deputados manteve, por 364 votos a favor, 130 contra e 3 abstenções, a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ). O parlamentar está preso desde terça-feira (16) após divulgar um vídeo com discurso de ódio e ataques aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com a Constituição Federal, deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por opiniões, palavras e votos e não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nestas situações, os autos são remetidos à Câmara ou ao Senado para que a maioria absoluta da Casa (no caso 257 deputados) decida, em voto aberto, sobre a prisão.
Daniel Silveira foi preso no inquérito aberto em 2019 para apurar ameaças contra os ministros do STF após ter divulgado um vídeo em que, segundo decisão do ministro Alexandre de Moraes, “ataca frontalmente” os ministros da Corte.
“As manifestações do parlamentar Daniel Silveira, por meio das redes sociais, revelam-se gravíssimas, pois, não só atingem a honorabilidade e constituem ameaça ilegal à segurança dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como se revestem de claro intuito visando a impedir o exercício da judicatura, notadamente a independência do Poder Judiciário e a manutenção do Estado Democrático de Direito”, escreveu Moraes em sua decisão.
A deputada Magda Mofatto (PL-GO) apresentou parecer favorável à manutenção da prisão do deputado Daniel Silveira. A congressista leu a transcrição do vídeo pelo qual o ministro Alexandre de Moraes baseou a decisão para prender Silveira. Para Magda Mofatto, “é preciso traçar uma linha e deixar clara entre uma crítica contundente e um verdadeiro ataques às instituições democráticas”.
"Não se trata apenas de concordar ou não com o conteúdo ou considerar que o discurso do parlamentar deva ser tolhido por se entender por demais chulas as suas palavras. A liberdade de expressão protege o discurso que nos desagrada e incomoda, mas não alcança aqueles voltados a incitar a verdadeira prática de atentados contra autoridades públicas", argumentou a relatora Magda Mofatto.
Defesa
O deputado Daniel Silveira participou da sessão de forma remota, direto do Batalhão Especial Prisional (BEP), em Niterói, onde está preso. O parlamentar se manifestou em três ocasiões durante a votação e em todas disse que exagerou em sua fala, mas que respeita o STF.
"Eu assisti ao vídeo três vezes e precisei perceber, com critério absoluto de calma e cautela, que realmente ali as minhas palavras foram duras o suficiente até para mim mesmo. Eu compreendi, vi que eu tinha outros modos para que eu pudesse expressar a minha fala", disse. "Eu gostaria de ressaltar que, em momento algum, consegui compreender o momento da raiva que ali me encontrava e peço desculpas a todo o Brasil. Foi um momento passional e me excedi de fato na fala”.
Silveira afirmou ainda que a repercussão da decisão em manter a sua prisão terá repercussões futuras – tanto para os parlamentares quanto para sociedade.
“A relativização da nossa imunidade poderá trazer consequências catastróficas para todos nós. A imunidade parlamentar pela fala não pode ser relativizada jamais”, disse. “As consequências, a partir de decisão de hoje, jamais vão se limitar à minha vida, não se limitam de maneira alguma. As consequências serão impreterivelmente sentidas por toda a população brasileira, que confiou, através da nossa eleição, talvez uma rigidez, e às vezes, a rigidez pode ter passado muito daquilo que nós queríamos”.
O advogado de defesa do deputado Daniel Silveira, Maurizio Rodrigues Spinelli, argumentou que há ilegalidades e falhas técnicas na decisão que mandou o parlamentar para a prisão. “Tudo — absolutamente tudo — envolvendo a prisão do deputado, até o presente momento, mostra-se inconstitucional. Não há nada no ordenamento jurídico que seja capaz de sanear as ilegalidades encontradas até agora”, disse.
Ao abrir a sessão, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), anunciou a criação de uma comissão para construir e propor uma regulamentação do dispositivo da Constituição Federal que dispõe sobre a imunidade e a inviolabilidade dos mandatos parlamentares.
“Em nome da responsabilidade, o alicerce da democracia, quero anunciar a criação de uma comissão pluripartidária para propor alterações legislativas para que nunca mais Judiciário e Legislativo corram o risco de trincarem a relação de altíssimo nível das duas instituições por falta de uma regulação ainda mais clara e específica do Artigo 53 da nossa Carta Magna”, afirmou Lira.
Em um pronunciamento de pouco mais de dez minutos, o presidente afirmou que a análise da prisão de Daniel Silveira esteve ancorada em dois princípios: a livre manifestação de pensamento e a inviolabilidade do mandato parlamentar. “Até que ponto essa inviolabilidade pode ser considerada se ela põe a democracia em risco? Essa é a avaliação que vossas excelências irão realizar”, ressaltou.
Sem mencionar seu posicionamento a respeito da situação de Silveira, Arthur Lira ressaltou que o caso do parlamentar preso é “um ponto fora da curva” e que o exercício da liberdade de expressão não pode violar a democracia.
“Sou ferrenho defensor da inviolabilidade do exercício da atividade parlamentar, mas acima de todas as inviolabilidades, está a inviolabilidade da democracia. Nenhuma inviolabilidade pode ser usada para violar a mais sagrada das inviolabilidades, a do regime democrático”, disse.
Opiniões divididas
O deputado Fábio Trad (PSD-MS) afirmou que a liberdade de expressão não pode ser utilizada para violar a própria liberdade. “Foi um libelo, uma exposição raivosa e virulenta pregando a morte da democracia”, disse ao defender a manutenção da prisão do deputado Daniel Silveira na sessão virtual do Plenário que vai decidir se a prisão será mantida ou não.
“Esta não é uma boa sessão, mas é necessária para resguardar a imagem deste Parlamento”, disse Trad. A Câmara dos Deputados pode colocar o deputado em liberdade se a prisão não for aprovada pela maioria dos deputados.
Silveira foi preso na terça-feira, em flagrante, após divulgar um vídeo nas suas redes sociais. O vídeo traz ofensas a ministros do Supremo Tribunal Federal, elogio à ditadura militar e ao Ato Institucional nº5, que reduziu as liberdades individuais e endureceu o regime.
Ele é investigado no âmbito do inquérito das fake News e foi preso em flagrante por crimes contra a segurança nacional. Ele já foi denunciado ao STF pelo Procurador-Geral da República e também sofre processo no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
Para a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), a prisão é legal já que houve ameaça a um dos poderes. “Nós defendemos a imunidade parlamentar. O que houve foi uma conspiração contra a democracia”, avaliou. Ela destacou que a decisão de prender Oliveira foi referendada pelo STF por unanimidade.
Contrário à manutenção da prisão, o deputado Vitor Hugo (PSL-GO) afirmou que a votação é “histórica” e que Silveira será julgado pelos seus atos nas esferas cabíveis. “Essa prisão é inconstitucional porque não há flagrante caracterizado. Da mesma forma, transformar todos os crimes previstos nas leis penais em inafiançáveis é também um avanço muito forte”, disse. O deputado destacou ainda que Daniel Oliveira já se retratou pelas palavras.
Para o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), a votação terá repercussão em casos futuros. “Num ato arbitrário e autoritário – à margem do que diz a Constituição e a lei – faz uma prisão ilegal e inconstitucional. Não se trata de defesa corporativa, trata-se de defesa da democracia”, disse.
Líderes marcam posição
A maioria dos líderes declarou voto favorável á manutenção da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ). Enquanto os deputados votam, líderes aproveitam para marcar posição sobre o tema na sessão virtual do Plenário que vai decidir se a Câmara mantém ou não a prisão do deputado.
O líder do PCdoB, deputado Renildo Calheiros (PE), afirmou que os atos praticados pelo deputado Daniel Silveira não podem ser cobertos pela imunidade parlamentar ou pela liberdade de expressão.
Calheiros afirmou que o partido defende as imunidades parlamentares, a separação dos poderes, o uso da Lei de Segurança Nacional, e a liberdade de opinião. “Esses institutos não podem ser usados para desconstituir, pelos atos praticados pelo deputado, a democracia”.
O líder do Pros, deputado Capitão Wagner (CE), afirmou que o deputado precisa ser julgado no Conselho de Ética e defendeu a liberdade de Daniel Silveira. “O ato praticado pelo STF não encontra amparo jurídico em lugar nenhum. Aqui ninguém está julgando os excessos cometidos pelo deputado, mas abrindo mão do nosso poder de revisar um ato do STF”, afirmou.
O líder do PSB, deputado Danilo Cabral (PE), afirmou que a imunidade parlamentar não é absoluta e defendeu o voto favorável à manutenção da prisão do deputado Daniel Silveira.
“Não resta duvidas que as ameaças feitas ao Supremo Tribunal Federal, aos seus membros, bem como a incitação da ruptura da ordem democrática não podem ser cobertas pelo manto da imunidade parlamentar.
Não é a avaliação do líder do PSL, deputado Vitor Hugo (GO). Ele disse que a prisão do deputado Daniel Silveira ataca as prerrogativas do Parlamento. “Estamos atacando a capacidade de representação à vontade da população que não pode defender uma posição por não ter imunidade material e se volta para nós. A Câmara dos Deputados não está defendendo o que é mais sagrado”, afirmou. Vitor Hugo criticou ainda o inquérito do STF sobre as Fake News que chamou de “frágil” e “sem amparo na legislação”.
A deputada Carla Zambelli (SP) também defendeu a manutenção das prerrogativas dos deputados. “O povo brasileiro quer a liberdade de Daniel Silveira. Nós somos representantes do povo e o povo quer que a gente continue falando por ele com a nossa plena imunidade parlamentar”, disse. Ela disse ainda que Silveira “não é bandido”.
Para a líder do Psol, Taliria Petrone (RJ), liberdades democráticas não podem ser violadas por ninguém. “Direito à fala é parte do nosso exercício parlamentar, mas essas ideias não podem violar a Democracia. Deputado não pode tudo”, afirmou.