Fontes de segurança do Líbano informam que as duas explosões ocorridas nesta terça-feira (4 de agosto) na área portuária de Beirute deixaram dezenas de mortos e milhares de feridos.
Segundo o jornal The Sun, o barulho foi tão alto que pôde ser ouvido a uma distância de 250 quilômetros.
"Os contêineres explodiram, os gigantescos silos de grãos foram explodidos, os guindastes estão no chão. De Dora, nos subúrbios de Beirute, até o porto, a estrada está cheia de detritos de todos os tipos", descreve o jornal L'Orient-Le Jour, do Líbano. Segundo o relato, "carros foram esmagados como papel. Um homem foi visto sentado no chão, os dois braços arrancados pela explosão".
Um fotógrafo da agência norte-americana Associated Press, que trabalha perto do porto de Beirute, disse ter visto pessoas feridas no chão e uma destruição generalizada no local.
O governador de Beirute, Marwan Abboud, disse que a situação o lembra de Hiroshima e Nagasaki, cidades japonesas onde foram lançadas as bombas atômicas.
De acordo com o jornal The Guardian, o ministro da saúde libanês, Hamad Hasan, contabiliza pelo menos 70 mortos. A uma rede de televisão, Hamad Hasan disse que há cerca de 3 mil feridos. Já o chefe do escritório local da Cruz Vermelha falou em 2,2 mil feridos, embora tenha alertado que o número "deve ser ainda maior".
A imprensa árabe noticiou que vários membros do Departamento de Inteligência do Exército foram mortos na explosão.
Uma das vítimas é Nazar Najarian, secretário-geral do partido Falanges Libanesas. Uma fonte oficial das Falanges Libanesas, citada pelo jornal Observador, de Portugal, confirmou a morte do secretário-geral.
Vídeos postados nas redes sociais mostram que haviam fogos de artifícios nos locais das explosões.
O motivo
O ministro do Interior libanês confirmou que a explosão foi causada por toneladas de nitrato de amônio armazenado na zona portuária de Beirute. Esse produto químico, normalmente utilizado em foguetes e explosivos, foi apreendido há vários anos de um navio atracado no porto.
Abbas Ibrahim, diretor da Direção-Geral da Segurança Geral do Líbano, disse que o produto é nitrato de sódio - que pode ser usado na produção de nitrato de amônio, que por ser oxidante pode interagir com outros produtos. Quando contaminado com produtos orgânicos ou materiais oxidantes, aquecido, confinado, e ainda sob ação de agentes iniciadores, pode detonar. Há risco de ignição ou detonação ao expor o produto ao calor e a materiais incompatíveis.
A explosão causou uma onda de choque que causou danos em prédios da área, destruindo janelas em diferentes partes da cidade.
O ministro da Saúde do Líbano, Hamad Hassan, confirmou milhares de feridos nas explosões, informou a emissora Al Jazeera. Conforme a publicação, o incidente causou uma "onda de choque que causou danos em prédios da área, destruindo janelas em diferentes partes da cidade".
Imagens nas redes sociais já mostram diversas vítimas próximas ao local da explosão, mas ainda não há confirmação de mortos até o momento.
"Estamos tendo que deixar centenas de feridos às portas dos hospitais", disse um membro das equipes de defesa civil que estão trabalhando na área.
Barcos ajudaram no resgate de pessoas que foram jogadas ao mar. A emissora libanesa LBCI informou que o hospital Hôtel-Dieu de France, no centro da capital libanesa, atende mais de 500 feridos e fez um pedido de doação de sangue.
A explosão ainda provocou o desabamento de um prédio de três andares e, de acordo com os relatos, existem pessoas presas sob os escombros.
Segundo Fouad Aoudi, presidente da Associação de Médicos Estrangeiros da Itália (AMSI), citando fontes médicas locais, há pelo menos 75 pessoas hospitalizadas.
O Ministério das Relações Exteriores da Itália, por sua vez, informou que já tomou medidas para prestar toda a assistência possível aos compatriotas no Líbano e continua a monitorar a situação.
As explosões foram ouvidas em toda a cidade e ao menos uma delas teria ocorrido nas proximidades da residência do ex-premiê Saad Hariri.
O primeiro-ministro do Líbano, Hassan Diab, decretou que a próxima quarta-feira (5) será um dia de luto nacional.
Após o anúncio, o presidente libanês, Michel Aoun, pediu uma "reunião urgente" do conselho superior da Defesa.
Israel e Hezbollah
O incidente ocorre na mesma semana em que a Justiça julgará a morte do ex-premier Rafik Hariri, em um atentado a bomba em 14 de fevereiro de 2015. Os réus, todos membros do movimento xiita do Hezbollah, estão sendo julgados à revelia pelo Tribunal Especial do Líbano (TSL), com sede em Haia, encarregado de ditar a sentença 15 anos após o atentado com um carro-bomba no centro de Beirute. Nele, morreram o bilionário sunita e outras 21 pessoas.
Há uma semana, Israel informou ter frustrado um ataque "terrorista" e haver atirado contra homens que cruzaram a "Linha Azul" entre o Líbano e Israel.
O governo de Israel "não está envolvido" com a devastadora explosão na região portuária de Beirute registrada nesta terça-feira (4), informaram fontes políticas oficiais, citadas pela TV pública do país. A declaração foi dada após as tensões dos últimos dias entre os países.
Veja os vídeos:
Stunning video shows explosions just minutes ago at Beirut port pic.twitter.com/ZjltF0VcTr
— Borzou Daragahi ???? (@borzou) August 4, 2020
#Beirut #Lebanon ???? pic.twitter.com/pFXvDeKAgF
— Best Tweet (@BestTweet___) August 4, 2020
A Fragata Liberdade, da Marinha do Brasil, está no mar do Líbano, mas distante do local da explosão. A Marinha publicou uma nota na qual informou que os militares estão bem e não há feridos.
Crise econômica e corrupção
O Líbano, que já foi chamado de "a Suíça do Oriente Médio", está em meio à sua maior crise econômica. A dívida externa atinge 170% de tudo o que é produzido em um ano no país, e o governo não consegue nem mesmo pagar as contas de telefone, internet e luz. Como o combustível para isso é importado, várias cidades libanesas encontram-se sem energia.
Segundo um relatório da consultora internacional McKinsey, o Líbano tem a quarta pior rede elétrica do mundo.
Para agravar a situação, a pandemia do novo coronavírus paralisou o turismo, responsável por 20% de todos os bens e seerviços finais produzidos no país.
O Banco Mundial prevê que metade da população está sendo levada para a pobreza extrema.
Nesta terça-feira foram registrados confrontos entre a polícia antimotim e manifestantes que tentaram tomar de assalto o Ministério da Energia libanês.
A população sofre com o racionamento de energia, a hiperinflação, saques bancários limitados e demissões em massa, além de uma queda de 90% no poder de compra. Mil reais compram um milhão de libras libanesas. Há um ano seriam necessários R$ 3.500.
O próprio governo admite que 75% dos libaneses precisam de ajuda humanitária para se alimentar.
A classe política é acusada de corrupção e má administração dos recursos públicos. O Líbano é um dos países mais corruptos do mundo, segundo a organização não-governamental Transparência Internacional (TI). Entre 180 países está na 137ª posição (o Brasil na 105ª).
O Líbano fica na costa leste do Mar Mediterrâneo e faz fronteira com Israel e Síria. Sua população é de 6,2 milhões de habitantes, espremidos em 10.452 quilômetros quadrados (a Bahia tem quase 15 milhões de habitantes, mas ocupa uma área de 567.295 quilômetros quadrados).