Tocando por puro amor

No relógio 23 horas.

Ouvem-se as últimas notas e os instrumentos se calam.

Os integrantes da banda conversam, riem, abrem a pesada porta do estúdio e então chega ao fim um dia que começou em uma mesa de escritório, na direção de um carro, balcão de loja, etc e terminou regado a música em mais um ensaio.

Uma vaquinha rápida para pagar o aluguel do estúdio enquanto os instrumentos são guardados e daí é voltar para casa e se preparar para o próximo dia de trabalho.

Essa descrição que trouxe para abrir nosso bate-papo de hoje é uma rotina que acontece todos os dias em diversos cantos de nossa cidade com dezenas de músicos amadores que resolvi batizar como “aqueles que tocam por puro amor”.

Quero deixar bem claro aqui que nem de longe penso que os músicos profissionais não toquem por amor, claro que tocam, mas não é por “puro” amor, afinal vivem disso.

Os amadores, entre os quais me incluo há mais de 15 anos, são pessoas que amam mas não vivem de música; que deixam suas famílias para fazer um som; que empurram a compra daquela roupa, de um sapato, etc. para poder investir o dinheiro em um instrumento, uma pedaleira, baquetas novas ou simplesmente pagar os ensaios.

Amigos de zoada

Hoje, por exemplo, temos show e ensaiamos duas noites atrás.

No grupo de whatsapp a gente troca músicas que gostaríamos de colocar no repertório, detalhes para ajustar na apresentação, mas também muita amizade e gozação.

Na foto, The Broadcasters

Cá estava eu começando a pensar nesse texto quando uma mensagem do amigo Beto, guitarra base da banda, pipocou e emocionou colando diretamente em tudo o que estava pensando.

Beto desejava sorte aos “amigos de zoada”.

Caramba, ele resumiu nessas palavras um dos motores dessa loucura que é tocar por puro amor.

O prazer de fazer zoada juntos, de ver as pessoas dançando e cantando, se divertindo com o nosso som.

Nós, por exemplo, já tocamos em casamentos, churrascaria, festas de empresa, bares, boates, rapaz haja estrada viu?

Com certeza gastamos mais do que ganhamos.

Diversas vezes acabamos acordando no outro dia quebrados para trabalhar, estudar, cuidar dos filhos, mas sempre com a energia renovada afinal, eita coisa boa é fazer zoada com os amigos!

Pedindo perdão aos profissionais

Músicos como a gente, que existem às pencas por aí, acho que acabam atrapalhando um pouco quem é profissional.

Eu explico.

Como vamos na maior parte das vezes apenas pelo prazer de tocar sem querer alimentamos, com baixo custo, a indústria cultural da cidade.

Por conta disso só nos resta pedir desculpas a quem vive de música, mas também deixar aqui do fundo do coração, e me arvoro a ser porta-voz dos “que tocam por puro amor”, a nossa inveja de quem vive da música, e também claro toca por muito amor.

Sabem amigos profissionais, e olha que conheço vários, nós sonhamos em poder um dia viver de fazer som, ter tempo para aprender a fundo um instrumento, entender partituras e escrever músicas com perfeição.

Sabemos, repito, que acabamos bagunçando um pouco a festa dando para quem explora comercialmente a noite o poder de atrair a clientela pagando bem pouco e às vezes até nada, clientela essa muitas vezes composta por nossos amigos e por gente da família, mas creiam... é por puro e real amor à música.

Lembrete para quem vai só ouvir

E você que não faz parte das bandas mas vai aos bares atraído pelo som delas, tente lembrar da luta que cada músico travou para estar ali iluminando sua alma através da música, principalmente na hora de pagar o famigerado couvert e não esqueça de, entre uma cerveja gelada e outra, dar aos artistas apaixonados que ali estão, profissionais ou não, o prêmio que dinheiro nenhum pode pagar mas que enche o coração deles de alegria e energia para seguir lutando pela música... um caloroso aplauso.

Se divirta, dê um grito, peça pra tocar Raul, olhe para eles de vez em quando, mostre que está curtindo e alegrando a alma com o som que estão ali esmeradamente fazendo porque, afinal, é por essa troca de energia que os “que tocam por puro amor”, profissionais ou não, dedicaram cada minuto da sua luta pela música...

Hugo Brito "faz zoada" com a “The Broadcasters” hoje (14), no Ronchus Pub, Rio Vermelho. Muito rock dos anos 80, 90, 2000. Na rua Oswaldo Cruz, 122 - Rio Vermelho .

O Ronchus abre às 21h30 e o show começa por volta de 22h. Homem paga 35 reais e mulher 30.

Informações e reservas pelo 99732.6738