Candidato à prefeitura de Salvador pelo PSOL, Fábio Nogueira segue à risca os preceitos de seu partido ao defender uma gestão norteada pela participação popular. Crítico ferrenho dos adversários, sobretudo do atual prefeito ACM Neto (DEM), o sociólogo acredita que Salvador é uma cidade cada vez mais cara e que atende apenas aos interesses da classe média.
Nesta entrevista, o socialista fala ainda sobre as prioridades de sua eventual gestão e sobre os desafios de governar sem depender da iniciativa privada.
tribuna da Bahia - Muitos consideram a disputa pela prefeitura de Salvador um duelo entre Davi e Golias. Você se considera capaz e com força suficiente para vencer essa batalha?
Fábio Nogueira - Davi ganhou Golias, né? Essa imagem se coloca porque temos uma desproporção eleitoral que não tem só a ver com a aprovação do prefeito. Acho que tem a ver com o uso da máquina pública e das forças econômicas da cidade. E todos os setores da esquerda democrática, popular e progressista estão na luta. Uma luta desigual, mas justa, decente e coerente. É um absurdo Salvador ser a capital nacional do desemprego e o prefeito ser um dos que mais aumentaram o patrimônio, e o custo social da gestão de ACM Neto está sendo percebido nas ruas. Então estamos caminhando com a convicção de que o processo político se define no corpo a corpo, no diálogo com as pessoas, e que essa insatisfação que percebemos nas ruas vai se expressar nas urnas.
Tribuna - Que experiência administrativa você e o PSOL têm e que colocam à disposição da população de Salvador?
Fábio Nogueira - Uma coisa que a gente não tem é a experiência administrativa da velha política. É essa experiência administrativa da velha política que faz a corrupção; que faz um candidato como Claudio Silva, que à frente da Sucom teve as contas rejeitadas, apesar de todo o conhecimento técnico que ele diz ter. Então acho que esse debate sobre experiência administrativa tem que ser colocado em relação à democratização da máquina pública com participação popular. Nossa experiência é a partir da relação com a população, no sentido de aperfeiçoar os mecanismos democráticos. Temos pessoas qualificadas para administrar a cidade de Salvador sob outra lógica, e não a atual, que é a lógica dos ricos e dos empreiteiros.
Tribuna - Qual a lógica que vocês defendem?
Fábio Nogueira - A lógica popular, ouvindo as pessoas, setores que estão organizados. Na cidade, nós negros somos 80% da população e nem metade do secretariado é composta por negros e mulheres. É um processo de segregação, de falta de representação da população negra. Isso é uma coisa para ser pensada. A velha política é isso e essa é a experiência administrativa de ACM Neto e de outros candidatos. Então a nossa proposta é governar com os movimentos sociais, com o cidadão comum, com os indignados e aqueles que não aceitam isso. Hoje o prefeito governa ouvindo os empresários e a Câmara, na base da caneta, troca de favores e troca de cargos. Além disso, queremos aperfeiçoar a democracia ouvindo a cidade, promovendo referendos para resolver coisas simples, do nosso cotidiano. Por exemplo, a construção do hospital de Cajazeiras agora, dentro de uma área de proteção ambiental, e a empresa que ganhou a licitação tem relação com o prefeito ACM Neto. Isso é justo, as pessoas participaram dos critérios de licitação?
Tribuna - O que lhe desagrada na gestão do prefeito ACM Neto e que gostaria de mudar caso fosse eleito?
Fábio Nogueira - O que me desagrada é a forma de governar. O prefeito ACM Neto pegou Salvador após oito anos de administração de João Henrique. Nesse cenário, o que acontece muito é o efeito comparativo. As pessoas ficam falando que ele organizou a prefeitura, que a prefeitura retomou serviços essenciais. Tudo isso é verdade, mas a questão é: qual a lógica por trás disso e que cidade nós temos? Uma cidade desigual, na qual direitos básicos como saúde e educação não são respeitados. Ele diz que foi o prefeito que mais fez creches, isso não é verdade. Este ano a prefeitura vai gastar R$600 mil em creches, é a previsão do orçamento. Só de Casa Civil e Gabinete de Governo são mais de R$300 milhões. Todos os vícios da velha política se refletem na atual gestão de ACM Neto. Tivemos secretários que saíram pela porta dos fundos porque havia fortes indícios de esquemas de corrupção dentro das secretarias de saúde e educação. Ele mais que dobrou o seu patrimônio comparando com 2012. A cidade de Salvador hoje, apesar das obras na tentativa de organizar a cidade, requalificar, ela gasta mal o seu dinheiro em setores como saúde, educação, transporte e cultura. ACM Neto não conseguiu convencer a população que esses serviços estão melhores.
Tribuna - Como autuar sem a iniciativa privada, sem PPP, em uma cidade tão carente como Salvador, principalmente em um cenário de crise?
Fábio Nogueira - Em vários lugares do mundo você tem experiências de relações com empresários que não são baseadas em relações que prejudicam o erário público e a população em geral. Posso dar um exemplo. As empresas de ônibus devem milhões à prefeitura e não pagam essa dívida, então defendemos a contrapartida dos empresários. Ônibus é uma concessão pública. Além da melhoria do serviço, defendemos que eles abram o custo de planilha de ônibus para termos o controle efetivo disso e assim por diante. Garantir gratuidade para estudantes e desempregados é uma contrapartida. Garantir a gratuidade para idosos a partir dos 60 anos é uma contrapartida. Então os empresários precisam ser parceiros da prefeitura e entender que o lucro não é o único objetivo. Então a gente propõe uma relação transparente, independente, baseada em acordos com os empresários para que todos ganhem.
Colaborou: Guilherme Reis