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"Era só o prefeito ter falado que eu não seria a vice", diz Célia

Confira entrevista exclusiva à Tribuna

Atual vice-prefeita e candidata ao Thomé de Souza, Célia Sacramento (PPL) faz uma breve avaliação de sua atuação como coadjuvante do prefeito ACM Neto, a quem não poupa críticas e ressentimentos.

De acordo com Célia, eram constantes as discordâncias com o ex-aliado, mas suas ponderações nunca foram consideradas. Se for eleita, a saúde estará em primeiro lugar em sua lista de prioridades. “E para cuidar da saúde vamos fazer um mutirão de limpeza e saneamento na cidade.

Acabar com os focos de dengue, zika, chikungunya e leptospirose. Aí já resolvo uma demanda. […] A nossa cidade tem 80% de habitantes afrodescendentes e temos um problema real, nunca tratado na saúde municipal, de anemia falciforme”. Confira entrevista 

Tribuna da Bahia - A senhora foi uma figura constante ao lado do prefeito ACM Neto ao longo desses três anos e meio de gestão. De repente, a senhora passa a ver nele uma série de defeitos. Esses defeitos não haviam sido percebidos antes?
Célia Sacramento -
Eu estava candidata a prefeita pelo PV e o prefeito ACM Neto me convidou para ser vice-prefeita com ele, e eu aceitei com algumas condições: promover a igualdade racial, ter compromisso com o desenvolvimento sustentável, o respeito a todo o tipo de diversidade, cultural, religiosa, sexual, e a educação como base de transformação. Nunca assumi nenhum cargo, nenhuma secretaria. Começamos a desenvolver um trabalho muito intenso porque a cidade estava completamente destruída. Em geral, os políticos no Brasil não trabalham, e em Salvador foi diferente. Por isso a nossa gestão foi considerada por quatro vezes a melhor gestão pública do Brasil. Entendo que o político é um empregado do povo, e na condição de empregado ele precisa se dedicar. Eu não peguei a minha empresa e coloquei dentro da prefeitura, não fiquei trabalhando nas universidades, pedi licença e me dediquei à prefeitura, com uma renda menor para o meu padrão. E sempre desenvolvi uma relação parceira com o prefeito. Mas nem tudo o que eu encaminhei foi resolvido. No dia que o prefeito me convidou para participar da instalação do Conselho Municipal do Turismo, tomei um susto. Tiveram a coragem de compor sem uma entidade negra. Falei na frente de todo mundo e o prefeito nunca me passou o microfone em vários eventos, eu era a antepenúltima voz. Não estou tecendo críticas negativas ao prefeito, mas quero dizer que farei uma gestão para os que mais precisam, principalmente para as classes D e E, para as quais falta até alimento. E por isso as classes A e B não conseguem andar pela cidade por falta de segurança, e tentam resolver colocando mais polícia. Precisamos cuidar dos bairros periféricos. Gastamos mais de R$ 1 milhão por dia para recolher o lixo e a cidade continua suja. Sabe quantas pessoas morrem com dengue, zika, leptospirose? Muitas, e por causa de lixo, problemas de esgoto. Como vou ter coragem de fazer uma quadra ao lado de esgoto? Eu continuo a mesma Célia. A nossa gestão é sucesso porque a cidade estava destruída, mas precisamos fazer mais.

Tribuna - Para ter feito as recentes denúncias, a senhora deve ter alguns elementos reunidos. O que mais lhe chamou a atenção nesses anos da gestão ACM Neto?
Célia Sacramento -
Vou repetir o que já disse inúmeras vezes, sou contadora. Eu nunca assinei documento durante esse tempo na prefeitura. Deixo claro que tenho competência para fazer com custos menores, de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas os políticos do Brasil preferem ter valores muito altos em suas obras, isso é da política brasileira. Vou trabalhar de forma inversa, e gerando emprego e renda nos bairros através de ações com a prefeitura e com as pessoas que trabalham.

Tribuna - É verdade que o prefeito lhe ofereceu uma eleição assegurada para a Câmara de Vereadores ou um mandato de deputada daqui a dois anos e a senhora declinou da oferta por preferir o Executivo?
Célia Sacramento -
O PPL ficou aguardando o posicionamento do prefeito durante todo o tempo. Fui a primeira pessoa dos pré-candidatos a vice-prefeito com quem Neto conversou, e depois conversou outras duas vezes, e em nenhum desses momentos o prefeito me ofereceu qualquer coisa semelhante. Na última conversa, faltando 14 horas para a convenção, ele me disse que preferiu o PMDB por causa do tempo de televisão. Eu disse que tinha um partido ficha limpa, mas ele disse que precisava do tempo de televisão. Assegurar a eleição ele não tem condição porque não manda no voto de ninguém. E ele já foi candidato uma vez e não ganhou. E ele só ganhou a eleição na segunda vez porque muita gente votou nele por minha causa. Isso vai ser constatado na próxima eleição. Então essa oferta não existe. O prefeito não tem poder para mandar no voto de ninguém.

Tribuna - Por ser mulher e negra, a senhora acha que pode ter sido usada politicamente pelo prefeito na última eleição?
Célia Sacramento -
Eu não acho, a população de Salvador tem certeza, as pessoas me falam isso nas ruas. Que ele vingou porque só votaram nele por causa de mim. É o cúmulo do absurdo, isso está bem claro. Sou fundadora da Associação de Pesquisadores Negros, uma entidade que tem mestres e pesquisadores. Sou fundadora do Movimento Negro Unificado aqui em Salvador, sou fundadora da Juventude Negra Soteropolitana. Faço parte da Associação Nova Aliança no bairro de Praia Grande há mais de 30 anos. Então eu tenho uma história. Todo mundo me disse que eu seria usada e depois traída, mas nunca acreditei. Nunca imaginei que o prefeito fosse ter coragem de fazer isso. Foi covarde. Ele decidiu pelo PMDB a 14 horas da convenção. Eu não coliguei, estou sem poder ter material de campanha. Eu poderia ter coligado. Era só o prefeito ter falado comigo na primeira vez que eu não seria a vice novamente. Mas não briguei com ele, disse que iria levar o assunto para discutir dentro do partido. Quem decidiu pela candidatura não fui eu, foi a convenção.

Tribuna - Quais os pontos que a senhora colocaria como destaques de sua eventual gestão?
Célia Sacramento -
Prioridade para mim é a saúde. E para cuidar da saúde vamos fazer um mutirão de limpeza e saneamento na cidade. Acabar com os focos de dengue, zika, chikungunya e leptospirose. Aí já resolvo uma demanda. Segundo, vou ter uma parceria com os agentes de saúde, que têm 150 famílias para atender. Eles foram retirados de seus lugares, as pessoas estão desassistidas. Já pensou o que é um agente de saúde que há 18 anos frequenta a casa de uma pessoa de idade? A nossa cidade tem 80% de habitantes afrodescendentes e temos um problema real, nunca tratado na saúde municipal, de anemia falciforme. Precisamos ainda resolver o problema da falta de creches na cidade, colocando todas as crianças em idade de creche na creche. Para mim é fundamental implementar ações que potencializem a educação em tempo integral porque precisamos cuidar dos nossos jovens. E quero fazer parcerias na área do esporte e da cultura, e desse modo vamos reduzir o problema da segurança. Vou trabalhar intensamente nas comunidades, fazendo uma gestão com participação popular, transparência e redução de custos. Vamos mostrar que nós que somos da periferia na origem podemos fazer uma administração para todos e uma cidade mais humana. E vou criar a Secretaria da Cultura.

Colaboraram: Fernanda Chagas e Guilherme Reis