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Pelegrino considera governo Michel Temer "totalmente desastroso"

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Tribuna da Bahia - Como aconteceu o processo de sua substituição na Secretaria de Turismo?
Nelson Pelegrino
 - Desde que eu fui comunicado pelo governador sobre a pretensão do PR, eu coloquei para ele duas coisas. A primeira é que eu não seria empecilho para que o governo consolidasse sua base. Eles já estavam na base, mas essa era uma pendência que precisava ser resolvida. Então eu disse que eu não seria empecilho e que se buscasse um nome que desse continuidade ao trabalho que nós iniciamos. Quando eu assumi a secretaria, nós iniciamos um processo de reorganização da pasta, de recolocação da importância que tem o turismo no estado. Eu reorganizei e botei orçamento na secretaria. Botei o Prodetur para andar, que é o carro-chefe da secretaria, com investimento de US$84,7 milhões. Deixo a obra do centro de convenções engrenada, para que ele possa ser reaberto em novembro, e deixo um planejamento estratégico feito em parceria com o trade turístico.

Tribuna - Teve desgaste interno? Ficou alguma mágoa?
Pelegrino
- Da minha parte, não. Comuniquei ao governador que eu não seria empecilho para essa recomposição. Mas eu penso que fica uma pendência em relação ao espaço do PT no governo. O PT precisa buscar o espaço perdido no governo Rui. É nesse sentido que penso que o partido deva, no momento adequado, conversar com o governador qual será a compensação do partido pela perda desse espaço.

Tribuna - Qual a maior dificuldade que você encontrou na secretaria?
Pelegrino
- Orçamento. Acho que a secretaria tinha pouco orçamento. Na minha opinião, havia uma distorção, que era a relação da secretaria com a Bahiatursa. Acho que há uma desproporcionalidade em relação ao tamanho da Bahiatursa e o da secretaria. Se eu estivesse na frente da secretaria quando a última reforma foi implementada com a extinção da Bahiatursa empresa... Eu já diria ao governador e ao novo secretário que eu acho que é preciso fazer uma nova reformulação da secretaria, onde a área de promoção do destino vá para a secretaria e a gente transforme a superintendência Bahiatursa numa empresa mais enxuta, uma empresa apenas operacional, para dar diretrizes que têm que ser geradas na secretaria, e a Bahiatursa seria apenas uma empresa do baixo operacional. Eu realmente tive dificuldades nesse aspecto fundamental, que é o aspecto da do marketing do destino.

Tribuna - Como explica a queda do turismo no estado e o fechamento de hotéis?
Pelegrino
- O fechamento de hotéis em Salvador ocorre por dois fenômenos. Primeiro, nós tivemos um boom com expectativa em relação à Copa do Mundo de construção de hotéis na cidade. Estima-se que talvez nós tenhamos hoje uma rede hoteleira que está superdimensionada para o tamanho da cidade neste momento. Nós temos 39 mil leitos e Porto Seguro tem 40 mil. Olhe o tamanho de Porto Seguro e olhe o tamanho de Salvador. Novos equipamentos foram feitos e Salvador nos últimos oito anos experimentou uma degradação muito grande da sua infraestrutura. A cidade estava abandonada, sem atrativo. Acho que a perda da orla, aquela decisão de acabar com as barracas de praia foi muito ruim para o destino Salvador. Nossa capital tem uma dimensão cultural, gastronômica, histórica e arquitetônica muito forte, e isso vem sendo tratado tanto pelo governo do Estado quanto por parte da prefeitura... mas o fato é que hoje o turista faz muito turismo de praia e ele quer os chamados hotéis com pé na areia, que é aquele equipamento que tem toda a estrutura de um hotel, mas você passa do portão e está na praia. Só temos dois equipamentos desse em Salvador, que é o Stella Maris e o Catussaba. Então, com a perda da barraca de praia, aquela cultura do baiano, do soteropolitano, do turista que vinha para Salvador e passava o dia todo na praia... depois ele podia ir para o Pelourinho, no Bonfim, no Mercado Modelo, ele podia fazer outras coisas, sem contar na concorrência com outros destinos importantes, que têm esses equipamentos de pé na areia. Você vê que o litoral norte tem vários equipamentos com pé na areia, não só em Praia do Forte, como Imbassaí, Sauípe. As obras que o governo do Estado e a prefeitura vem fazendo vêm requalificando o destino turístico, mas agora isso é uma reclamação que é justa por parte do trade e a gente tentou trabalhar isso, que é preciso comunicar para o mundo que nós temos uma nova Salvador. Uma Salvador atrativa. E nesse sentido, minha preocupação foi de criar roteiros para fixação do turista, para ele ter o que fazer em Salvador. E por conta da crise, os hotéis não investiram em sua modernização e muitos fecharam.

Tribuna – E aonde está a culpa?
Pelegrino
– O Pestana, por exemplo, não fechou por causa do centro de convenções. O Pestana tem um centro de convenções próprio. O hotel fechou por falta de investimento. Houve uma degradação da sua estrutura. Progressivamente, pessoas que se hospedavam deixaram de se hospedar porque o hotel estava com uma estrutura muito ruim, muito degradada. Os hotéis mais antigos estão perdendo competitividade para os hotéis mais novos. Mas a Bahia ainda é o terceiro maior destino turístico do Brasil. A Bahia é um país. Nós temos 13 zonas turísticas, temos nove polos turísticos consolidados. A Bahia não é um destino monotemático, é um destino muito temático. Temos várias opções. Você tem sol e praia, tem história, cultura, gastronomia, arquitetura, tem turismo de aventura, turismo ecológico, turismo rural, tem vários biomas.

Tribuna - Quando reassume o mandato em Brasília?
Pelegrino
- Já reassumi segunda-feira. Comuniquei meu retorno à Câmara Federal e segunda-feira estarei lá para votar a renegociação da dívida dos estados. O governador inclusive falou na transmissão de cargo que os estados do Nordeste representam apenas 4 por cento dessa dívida. Então, quem fez a farra foram os estados do Sul e do Sudeste, e nós estamos pagando a conta. O problema é que essa conta não só está beneficiando os estados do Sul e do Sudeste, mas também está sobrando para os servidores públicos, porque o governo federal quer impor uma profunda restrição aos estados em relação à matéria dos servidores públicos para poder aprovar essa renegociação. É proibição de concursos, de reajustes e impondo mais uma vez uma pauta de privatizações, o que é pior. Mais uma vez a pauta das privatizações... o passado já demonstrou que privatizando não reduzimos a dívida, mas infelizmente queimamos patrimônio público de forma criminosa. Esse filme a gente já viu e ele não teve um final feliz. Ele fragilizou a infraestrutura do país, desprotegeu o consumidor, ele, de forma irresponsável, queimou o patrimônio público. Nós não vamos aceitar. A bancada do PT votará contrária ao projeto. Quer dizer, já estava contrária ao projeto na época de Dilma, que era muito menos ... do que essa. No governo Temer, as restrições aumentaram mais ainda, e além de aumentar as restrições, ele embutiu no pacote a matéria das privatizações.

Tribuna - Como avalia o momento da política do país? Tenso?
Pelegrino -
Pois é. Eu saí como governo e volto como oposição. Meus quatro primeiros anos foram como oposição no governo de Fernando Henrique Cardoso. Oito anos de governo Lula, inclusive assumi a liderança do partido e a vice-liderança do governo no Congresso. Fui vice-líder também de Dilma no Congresso. Passei lá quatro anos com Dilma no governo. E agora saí como governo e volto como oposição. Voltarei para cumprir minha missão de oposição. Há um golpe parlamentar em curso no Brasil, que eu vejo que há um grande risco de ser consolidado. E o que é mais grave: eu penso que após uma eventual consolidação desse golpe, a agenda de verdade virá. E essa agenda é uma agenda profundamente contra o povo brasileiro. O que está em curso é a destruição do Mercosul, a destruição da Unasul. Eu acho que está em curso a destruição da relação sul-sul, que é uma relação vitoriosa que o Brasil fez ampliando suas parcerias na África, na América do Sul, na América Latina, e também com a China, com a Índia, com a África do Sul. Os Brics na minha opinião estão em risco. Essa agenda é uma agenda de privatizações, de queimar o resto do patrimônio público que restou.

Tribuna - Foi a política, a economia ou a roubalheira que derrubou a presidente Dilma?
Pelegrino
- Eu diria que foi uma combinação de uma estratégia bem montada de gerar uma instabilidade política permanente que permitiu a fragilidade do governo da presidente Dilma, permitiu a divisão do país, com um esquema poderoso assentado em grandes meios de comunicação. Mais uma vez, como eles não podiam fazer o debate da agenda econômica, a agenda política com temas da corrupção, que não é novo no Brasil isso... passou a ideia que a corrupção era coisa de um partido só, coisa que não é. A corrupção no Brasil é uma coisa sistêmica, e as investigações estão demonstrando isso, ela perpassa todos os partidos, mas você pode ver estatisticamente que o PT é o que menos... No processo eleitoral, com a Operação Lava Jato, setores da mídia e da oposição tentaram convencer o país que o problema da corrupção era do PT. E o processo de investigação está demonstrando que a corrupção é um problema sistêmico, é um problema do nosso sistema político, é um problema do financiamento de campanhas, isso foi uma armadilha em que todos nós caímos. Mas naquele momento da eleição, isso foi muito direcionado ao PT, e fragilizou a eleição da presidente Dilma, fazendo com que ela ganhasse a eleição com uma margem pequena de vantagem. Talvez tenha sido um erro da presidente Dilma. Diante da fragilidade política, ela adotou uma parte da agenda que foi derrotada na eleição, que foi a agenda do ajuste. O ajuste foi muito rápido e foi muito intenso. Aécio Neves, por sua vez, de forma inteligente, promoveu o terceiro turno com a perda de base do governo. Isso criou as condições para o golpe parlamentar.

Tribuna - A presidente vai conseguir retornar ao poder?
Pelegrino
- Sinceramente, eu vejo muita dificuldade no retorno da presidente Dilma. Acho que só se tiver muita mobilização social até a votação do impeachment e se houver fatos novos que atinjam mais intensamente o núcleo do poder. Se no caso aí Michel Temer for atingido, se houver denúncias que atinjam exatamente o presidente da República e o núcleo do governo. Aí sim isso pode agravar a situação.

Tribuna - Como vê o governo Temer e a divisão de cargos que começa a ser feita?
Pelegrino
- O início do governo Temer é totalmente desastroso. Eles criticaram tanto a presidente Dilma na questão fiscal, que foi inclusive o motivo formal do afastamento dela, que não existe. Dilma não praticou nenhum crime de responsabilidade. Nas chamadas pedaladas, Dilma não só pedalou, como Michel Temer está andando de motocicleta. Comparado ao que Michel Temer tem feito em termo de aumento do déficit público, da gastança... na economia é um governo desastroso, na política também. Agora, há uma grande aliança que foi formada no país em torno da agenda do golpe. E volto a dizer, a agenda do golpe é a agenda que foi derrotada em quatro eleições. Essa agenda não tem condições de se implantar pela via do voto e aí se implanta pela via do golpe parlamentar. Não descarto a possibilidade do golpe dentro do golpe. O que significa isso? Esperar passar este ano, a virada do ano e haver um afastamento do próprio Michel Temer. Ou pelo Congresso ou pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e aí sim uma eleição indireta no Congresso Nacional.

Tribuna - Como avalia o governo de ACM Neto?
Pelegrino
- O governo de ACM Neto foi beneficiado pelo paradigma do governo anterior. A cidade estava muito destruída. Qualquer governo que colocasse a cidade em ordem teria um elemento de positividade. O paradigma anterior favoreceu muito o prefeito. Muitas medidas adotadas por ele estavam no nosso programa de governo. Para recuperar a capacidade de investimento do município, recuperar a capacidade de comando, a autoridade pública, reorganizar os serviços da cidade. O governo de ACM Neto é enormemente beneficiado pelas obras do governo do Estado. Lembro de uma pesquisa recente que diz que 28 por cento das pessoas acham que a obra do metrô é da prefeitura, e 36 por cento que a duplicação da Orlando Gomes é da prefeitura. Existe uma confusão muito grande sobre o que é obra do governo do Estado e o que é obra da prefeitura. As principais obras de infraestrutura da cidade estão sendo feitas pelo governo do Estado. Duplicação da Pinto de Aguiar, duplicação da Orlando Gomes, 29 de Março, metrô de Salvador, requalificação da Gal Costa, obras de encostas. Quem investiu em encostas nos últimos anos em Salvador? O governo do Estado. Eu acho que é uma administração mediana. Ela fez o feijão com arroz, fez o que qualquer prefeito deveria fazer: organizar as finanças, organizar a cidade, e organizar a capacidade de investimento. Não fez nada além disso. Qual é a obra estruturante que essa administração entregou à cidade?

Tribuna - Qual deve ser a prioridade do próximo prefeito?
Pelegrino
-O principal problema de Salvador ainda é mobilidade, e o governo do Estado está dando uma mobilização grande nesse sentido. Na saúde, a reorganização da rede básica ainda é um problema. Educação também. Políticas sociais ainda são também um problema importante, porque acabam tendo impacto na violência, e cuidar da periferia. A periferia não foi cuidada. Salvador é uma cidade muito desigual. Qualquer governo tem que ter como prioridade atacar isso aí.

Tribuna - O PT vai sofrer impactos com a crise na próxima eleição?
Pelegrino
- Houve um direcionamento muito forte contra o PT nesse processo todo, isso atinge o partido. Nós temos uma eleição única na história do país onde há proibição do financiamento de empresas, uma coisa que o PT sempre defendeu. Eu diria que a decisão do Supremo ficou no meio do caminho. O sistema eleitoral é um sistema completo. Ou se faz uma reforma como um todo ou se faz uma coisa parcial. A decisão do Supremo foi uma coisa parcial. Proibiu o financiamento por empresas, mas deveria ter instituído o financiamento público, inclusive com mais restrições ainda aos gastos de campanha. Mas ficamos na metade do caminho, porque se estabeleceu uma situação de isonomia. Vamos ter muita dificuldade, o PT vai ter muita dificuldade em relação ao financiamento das suas campanhas. Infelizmente vai ter muito caixa 2 nessa eleição, no interior principalmente. O Supremo deveria ter feito a reforma como um todo, instituindo financiamento público de campanha, instituindo voto em lista, instituindo o patamar mínimo de igualdade entre as campanhas eleitorais. Isso infelizmente não foi realizado.

Tribuna - A candidatura de Alice vai crescer e tomar fôlego? Aposta no segundo turno?
Pelegrino
- A esquerda historicamente sempre teve 30 por cento dos votos em Salvador. A grande discussão são os outros 20 por cento. Alice pode chegar a esse... e as outras candidaturas, a candidatura do PP, a candidatura do PDT, a candidatura do PSOL... as outras candidaturas podem complementar esse patamar e nós podemos ter segundo turno.

Tribuna - Por que não foi Pelegrino o candidato do PT e o que dizer diante da tese de que setores do governo teriam impedido de entrar na disputa?
Pelegrino
- Numa eleição você tem que estar mobilizado, o candidato tem que estar mobilizado. O candidato que não está mobilizado não é um bom candidato. Todas as eleições que eu disputei em Salvador foi com muita vontade de ser candidato. Nessa eleição particularmente eu não estava com vontade de ser candidato. Eu não podia impor ao partido essa falta de vontade minha. Acho que não é minha hora. Acho que eu preciso descansar. São quatro eleições praticamente seguidas. A eleição última gerou um esforço muito grande. Eu acho que existiam outros nomes e eu dei essa liberdade para o partido buscar outros nomes. Mas sou militante partidário e vou continuar lutando.