O diretor da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia (Ufba), João Carlos Salles, foi nomeado como presidente da Sociedade Interamericana de Filosofia, no recente XVII Congresso Interamericano de Filosofia, em Salvador, evento que há mais de 40 anos não é realizado no país, tendo a participação de cerca de 1.500 inscrições e mais de 1.000 trabalhos apresentados, atraindo profissionais de renome internacional em diferentes áreas da Filosofia.
Em entrevista, exclusiva para a Tribuna da Bahia, o filósofo fala sobre o novo desafio como presidente da Sociedade Interamericana de Filosofia, que congrega associações de países com diverso grau de consolidação das suas instituições acadêmicas, convidando os leitores a conhecê-las na página: www.sif2013.org; também traça um perfil atual de uma das mais antigas instituições universitárias de ensino do país, que hoje dirige, e mostra, em uma visão geral, como está o desenvolvimento da filosofia no país.
Tribuna da Bahia - No XVII Congresso Interamericano de Filosofia, realizado recentemente em Salvador o senhor foi eleito para presidir a Sociedade Interamericana de Filosofia (SIF) para os próximos anos. Como o senhor recebeu este novo desafio?
João Carlos Salles - O desafio é grande, sem dúvida, mas talvez ainda maior tenha sido o de realizar o próprio Congresso. Estávamos trabalhando para essa realização desde 2008, quando se decidiu que seria realizado em Salvador, cabendo-me a coordenação do evento. Por outro lado, o de agora é um desafio diferente. Enquanto o Congresso é um evento pontual, marcado para ocorrer em uma semana, cabe-nos agora articular onze sociedades científicas nacionais da área de filosofia, contribuindo para aproximar nossas comunidades filosóficas, muitas vezes afastadas pela diferença das línguas e, também, pela diferença de estilos filosóficos. A Sociedade Interamericana de Filosofia congrega afinal associações de países com diverso grau de consolidação das suas instituições acadêmicas, e já convido os leitores a conhecê-las, visitando nossa página: www.sif2013.org
Enquanto presidente da SIF, alguns projetos se apresentam. Primeiro, a publicação dos melhores resultados do Congresso. Segundo, o fortalecimento dos laços entre nossas comunidades, a começar pela divulgação de eventos dos nossos respectivos países, possibilitando com isso um maior intercâmbio. Para isso, uma página web eficiente será decisiva. Enfim, temos já programado um próximo colóquio da SIF, que deve se realizar em Salvador no primeiro semestre de 2015, com a presença de grandes nomes da filosofia e também dos presidentes das associações membros da SIF. Nesse momento, por sinal, decidiremos o local do próximo Congresso da SIF.
TB- Como diretor de uma das mais antigas instituições do país, a Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, gostaria que o senhor falasse das metas atuais desta instituição.
J.C.S - A Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Ufba tem mais de 70 anos, sendo um polo regional da pesquisa de qualidade na área de Ciências Humanas, além de estar instalada no mais belo campus da Ufba, em São Lázaro. Temos um ambiente bastante favorável à pesquisa, ao ensino e à extensão, realizando constantes eventos, palestras, minicursos, colóquios, etc. Além disso temos cursos de graduação e pós-graduação, com 5 cursos de graduação e 7 programas de pós-graduação, seis deles com mestrado e doutorado. E, na Faculdade, cerca de 40 grupos de pesquisa desenvolvem atividades de formação, que começam na iniciação científica e em outras formas de trabalho orientado.
TB - Em uma visão geral como está o desenvolvimento da filosofia no Brasil?
J.C.S - A filosofia no Brasil se consolidou nas últimas décadas como atividade universitária, com uma produção que, hoje em dia, em grande parte, pode se colocar em linha de contar com o melhor da produção internacional. Para isso, certamente teve grande importância o crescimento da pós-graduação, crescimento vinculado à Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e a seus processos de avaliação. Hoje, são mais de 40 programas de pós-graduação em filosofia no país, e temos trabalhado por um padrão de qualidade elevado, procurando superar desigualdades regionais. Nesse sentido, para dar um exemplo, tem grande importância o portal de periódicos da Capes, que em muito diminuiu as dificuldades crônicas de acesso ao melhor da produção mundial. Também a internet possibilitou a diminuição do nosso déficit bibliográfico, de modo que podemos nos debruçar sobre os textos clássicos e contemporâneos, praticamente, em pé de igualdade com os melhores centros. Certamente, há muito por fazer e, sobretudo, por fazer dialogar em nossa comunidade, mas já avançamos bastante. E esse adensamento das instituições, essa elevação do seu padrão, que nos faz cobrados como membros da comunidade científica, tudo isso nos faz também sonhar com uma maior presença da reflexão filosófica no debate intelectual em nosso país, fazendo-nos crer também que seja factível cumprir a contento a tarefa de implantação da filosofia no ensino médio.
TB- E a Bahia como tem se posicionado em relação a trabalhos filosóficos nestes últimos anos?
J.C.S - A Bahia apresentou excepcional crescimento do trabalho filosófico na última década. Não só o Departamento de Filosofia conseguiu implantar um mestrado e depois um doutorado em filosofia, como também o reconhecimento do trabalho dos colegas do Departamento é significativo. Realizamos aqui, além do Congresso Interamericano, dois Encontros Nacionais de Filosofia. Entretanto, não são apenas esses eventos, mas sim um cotidiano de realizações (em eventos, parcerias, projetos, etc.) que coloca nosso Departamento com grande destaque no cenário nacional.
TB- Sobre este último congresso, com a participação de 1.500 inscritos e mais de 1 mil trabalhos apresentados, qual foi o saldo positivo?
J.C.S - O Congresso foi um sucesso de público e de crítica. Primeiro, o congresso foi um evento muito bem organizado. Essa é a voz geral, e temos orgulho disso. E cumpre destacar um diferencial, qual seja a participação extraordinária de estrangeiros, cerca de 40% dos que apresentaram trabalhos, bem como a presença de muitos grandes nomes da filosofia no Brasil e no exterior, e isso nas mais diversas áreas temáticas da filosofia, contemplando da filosofia antiga à filosofia contemporânea, da ética à lógica, da filosofia da linguagem à estética, da filosofia política à epistemologia. Não temos dúvida de que tivemos aqui, por uma semana, uma amostra generosa do melhor da filosofia desenvolvida em todo mundo. O maior saldo, porém, se verá com o tempo. Penso que está no contato de colegas, que doravante se tornam colaboradores. Está também na renovação de temas, nos bons frutos da crítica e do confronto bem argumentado de posições. Com isso, tenho certeza, o evento se desdobrará em publicações e em novos eventos, dando vida à nossa comunidade. Em particular, o Congresso deixa como saldo o fortalecimento do programa de filosofia da Ufba e da Faculdade de Filosofia, que o abriga. O programa certamente teve a oportunidade de mostrar, diante de uma reunião de nível tão elevado, a qualidade do trabalho que ora desenvolve.