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Unir artesanato e tecnologia é um grande desafio para o designer

Um dos designers italianos mais festejados, Alessandro Mendini esteve no Brasil e revelou detalhes sobre o processo criativo em seu estúdio

Foto: Divulgação
A poltrona \'Proust\' é um clássico de Alessandro Mendini. A peça foi produzida em 1978

Um dos vanguardistas do design neomoderno, consagrado pela criação de peças icônicas, como o abridor de vinhos “Anna G” e a poltrona “di Proust”, o trabalho do italiano Alessandro Mendini é alegre, irreverente, despojado, intenso e vibrante. Mendini valoriza a expressão no desenho e abusa de cores e formas inusitadas.

Em uma passagem pelo Brasil, a convite da Vitrine e da A Lot Of Brasil, o designer ressaltou a influência do artesanato brasileiro na conquista de uma identidade. “Propostas artesanais são muito interessantes e marcantes. O grande desafio, no entanto, é conectar ideias arcaicas e alta tecnologia. O Brasil é um grande espaço de pesquisa neste sentido”, revela.

Nem arquiteto, nem designer, nem artista. Alessandro Mendini acredita ser de tudo um pouco. E não exagera. Aos 82 anos, o mestre italiano já se viu envolvido em projetos arquitetônicos – da torre Paraíso, no Japão, ao museu Groninger, na Holanda, por exemplo –, e na direção de conceituadas revistas italianas (Casabella, Modo e Domus). Sua linha artística varia entre o pós-moderno, o surrealismo e o pontilhismo, com presença marcante de cores intensas. Tamanha de

senvoltura foi reconhecida, em 1979 e 1981, com a conquista do “Compasso d’Oro”, um dos prêmios mais antigos e importantes do design italiano. Mendini e seu irmão Francesco fundaram em 1989 um estúdio próprio e, hoje, desenvolvem peças únicas para empresas como Swatch, Alessi, Swarovski, Philips e Bisazza.

Em entrevista ao iG ele fala sobre os desafios do design, tendências e a importância da cor:

iG: O design brasileiro ainda está muito arraigado a técnicas antigas de produção. Como isso é percebido no mundo?
Alessandro Mendini: 
Unir tradição e alta tecnologia é sempre um grande desafio. Talvez o artesanato brasileiro seja elementar demais para permitir uma sofisticação cultural. Os irmãos Campana foram os primeiros a dar início a uma transformação no design , mas ainda é preciso avançar.

iG: Qual é a tendência na criação de móveis?
Mendini: 
Prever o futuro é muito difícil (risos). Mas acredito que nos próximos anos os designers irão investir na produção autoral. Isso implica organizar laboratórios próprios, criar produtos mais simples e remodelar técnicas de venda direta. A tendência será um móvel de boa qualidade, custo reduzido e rápida instalação.

iG: Como podemos entender o uso de cores fortes em suas peças?
Mendini: 
Penso que as cores sejam fundamentais no desenho. Elas trazem emoção, vida e tornam as criações mais vibrantes. Os países do hemisfério Sul têm a alegria das tonalidades tropicais, ao contrário do branco e preto usado no Norte. Certa vez, um crítico comparou meu trabalho à Carmem Miranda... Eu gostei.

iG: Criar uma peça nova é algo sempre exaustivo?
Mendini: 
Sim. O processo criativo é longo, metódico e repleto de cuidados. Leio livros, busco conceitos na filosofia e procuro recuperar histórias antigas. Preocupo-me ainda em transmitir boas energias e usar referências artísticas como em um patchwork. Gosto de trabalhar comdiferentes materiais e sensações , unindo, sempre que possível, o novo e o velho.

iG: A linha artística do pontilhismo o influência ao desenvolver um projeto?
Mendini: 
Gosto de entender meu trabalho de modo semelhante ao pontilhismo: pequenas partes revelam a obra. Se o pequeno tiver qualidade, o todo também terá. E isso vale inclusive para o urbanismo.

iG: O antropomorfismo é uma teoria sempre marcante em suas obras. Como devemos entender a proposta?
Mendini:
 Eu adoro esta ideia. Quando a arquitetura tem formas parecidas às nossas, é mais fácil criar empatia. Objetos como o abridor de vinho “Anne G.” seguem esta linha. O desenho tem que “olhar” nos olhos. E caso a peça já os tenha, a amizade será quase certa (risos). Propostas que oferecem sensações ao consumidor são melhores.

iG: O saca-rolha “Anne G.” é um clássico produzido há 20 anos. De onde surgiu a inspiração?
Mendini: 
Quando era criança, meu avô abriu uma garrafa de vinho com um saca-rolha que mexia a cabeça e movimentava os braços. Foi o primeiro estímulo . Abrir garrafas é um ritual, uma performance. E meu trabalho tem esta proposta. Finalizei a peça trazendo características de uma amiga que gostava de dançar. O objeto é um “best-seller” e ganhará até uma nova releitura em comemoração à data.

iG: O que podemos esperar dos Mendini agora?
Mendini: 
Estamos com trabalhos na Coreia, no Japão e na China. Além disso, há muitas experimentações em vidro e alumínio acontecendo no estúdio agora.