Mesmo antes do início do período eleitoral de 2024, iniciado em 16 de agosto, o Brasil já registrava um alto número de ocorrências de violência política contra políticos em exercício, pré-candidatos, ministros ou secretários de governo, e assessores parlamentares.
Na 3ª edição da pesquisa “Violência Política e Eleitoral no Brasil”, desenvolvida pelas organizações sociais Terra de Direitos e Justiça Global e lançada nesta quinta-feira (03), é possível identificar a forte tendência de crescimento de violência política no país em comparação aos anos anteriores.
A pesquisa identificou 299 casos de violência política entre 1 de novembro de 2022 e 15 de agosto de 2024 – 145 casos somente este ano, sendo 14 assassinatos. Foram mapeados casos de violência política nas categorias de agressões físicas, ameaças, assassinatos, atentados, invasões, ofensas e criminalização. Foram considerados apenas os casos de violência que tenham indícios de motivação política.
O dado total revela que a cada um dia e meio em 2024 houve um caso de violência política no Brasil. Nas eleições presidenciais de 2018 uma pessoa era vítima de violência política a cada 8 dias. Em 2020, uma a cada 7 dias.
Ao considerar o último pleito municipal de 2020, o ano de 2024 também se revela mais violento. O período pré-eleitoral (janeiro a 26 de setembro) de 2020 registrou 63 casos de violência política, entre eles 14 assassinatos, 15 atentados e 10 ameaças. Já entre janeiro e 15 de agosto deste ano ocorreram 14 assassinatos, 24 atentados e 67 ameaças, totalizando 105 ocorrências.
A variação de casos de violência política para estes tipos de violência (assassinato, atentado e ameaças) entre os dois pleitos municipais é de quase 170%, e considerando o conjunto das violências a variação foi de 130%.
Considerando o período de 01 de janeiro de 2024 a 15 de agosto, o país registrou mais ocorrências que todo ano de 2023, quando totalizou 130 casos.
“Desde a primeira edição da pesquisa é possível identificar que em anos eleitorais há um acirramento da violência política. Nos casos registrados percebemos uma naturalização da violência política dado os altos índices de assassinatos, atentados e ameaças. A pesquisa ainda identifica que a violência política atinge partidos de diferentes espectros políticos e afeta as mulheres de maneira desproporcional”, destaca a coordenadora de Incidência Política da Terra de Direitos, Gisele Barbieri. “Precisamos de respostas institucionais à altura, com legislações não só de caráter punitivista mas de caráter pedagógico, com ações coordenadas de enfrentamento por parte dos órgãos de Estado”, complementa.
Com disputas em todos os municípios do país, o período eleitoral – iniciado em 16 de agosto – já revela a intensificação dos casos de violência política. Os dados completos de violência durante o período eleitoral serão revelados pelas organizações na semana após o encerramento do 1º turno, nesse domingo (06).
Destaques de violência
Com objetivo de analisar o contexto político-eleitoral, a partir do monitoramento de como a violência política tem permeado as disputas a cada eleição, interferindo no processo democrático, a série histórica revela que, de 1º de janeiro de 2016 e 15 de agosto de 2024, foram identificados 1.168 casos de violência política no Brasil. O número já contabiliza os dados da nova edição.
Ameaças são a forma mais recorrente de violência política nesta 3º edição (novembro de 2022 a 15 de agosto de 2024), seguidas por atentados e ofensas. Neste período foram mapeadas 153 ameaças, o que corresponde a 51,2% dos casos de violência política do período analisado. Em 29,4% destas ocorrências houve ameaça de morte.
Tem sido o ambiente virtual o principal espaço de ocorrência das ameaças: em 52,3% dos casos, principalmente pela manifestação em redes sociais (67,4% dos casos de ameaça em ambiente virtual). Na sequência a residência da vítima (17%) e ambiente parlamentar ou atividades de campanha (14,7%) são os espaços que também ocorrem significativo número de ameaças.
Mesmo subrepresentadas em cargos eletivos, as mulheres foram alvos de 46% das ocorrências de violência política no período analisado. As violências mais frequentes foram ameaças (73 ocorrências) e ofensas (34 casos).
“Na pesquisa, ao analisar o tipo de violência política cometido contra as mulheres, é possível identificar que existe um componente que se diferencia que é a ameaça de estupro, que está relacionada a sua condição de gênero. O levantamento não mapeou nenhum caso de ameaça de violência sexual contra os homens”, destaca a Diretora-executiva da Justiça Global, Glaucia Marinho.
No período analisado houve 15 casos de ameaça de estupro à parlamentares mulheres.
Em 73,5% dos casos de ofensas contra mulheres ocorreram em ambientes parlamentares, local de atuação profissional ou atividades de campanha. E nesta parcela 80% das ofensas foram proferidas por homens cisgênero que também eram parlamentares à época dos fatos.
Os dados evidenciam uma reincidente intimidação à presença de mulheres em cargos eletivos. Uma das consequências é o desestimulo de que mulheres cis e trans venham a ocupar o espaço público, em cargos de representação e poder.
Ainda que no período tenha sido aprovada a Lei Federal 14.192/2021 que tornou crime a violência política de gênero e considera violência política contra a mulher toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir ou restringir os direitos políticos femininos, a reincidência de casos e desproteção às mulheres revela um ambiente político violento e pouco alterado.
Violência por região
Ao observar o tipo de ocorrência e cargo para o período é possível verificar a violência é principalmente direcionada a políticos em exercício do mandato (77%). No entanto, a violência mais extrema é direcionada com maior frequência a candidatos ou pré-candidatos (68%). Dos 22 assassinatos, 15 foram contra quem ainda pleiteia um cargo eletivo.
A violência política e eleitoral foi registrada em 24 estados e no Distrito Federal. As três regiões do Brasil que mais abrigam casos de violência política e eleitoral são: Sudeste, que contabiliza 38,1% das ocorrências; a região Nordeste, que soma 29,8% dos episódios; seguida pela região Centro-Oeste, que registra 15% do total.
O estado com maior número de ocorrências é São Paulo (53), seguido de Rio de Janeiro (32) e Bahia e Minas Gerais, ambos com 25 ocorrências.
Violência por cor e raça
A população branca responde por mais da metade (52%) dos casos de violência política no período analisada. Os homens brancos foram alvos de 84 casos de violência (28%) e mulheres brancas em 71 casos (23,7%).
Em 23,7% dos casos de violência política foram os homens negros as vítimas (71 casos). Mulheres negras cisgêneras e transexuais foram alvo de 63 casos, totalizando 21% dos casos. Considerando a baixa representação de mulheres negras em cargos eletivos, o alto número de ocorrências contra elas é visto com preocupação pelas organizações.
Para coleta de dados, as organizações realizaram busca ativa de notícias em buscadores de internet, nas redes sociais, veículos de notícias e o rastreamento automatizado de notícias em código Python.
Números da violência
-- Entre 1 de novembro de 2022 a 15 de agosto de 2024 foram identificados 299 casos de violência política
-- Em 2024 (01 janeiro a 15 de agosto) já são 145 casos de violência política
-- Os tipos de violência mais frequentes no período analisado são ameaças e atentados, 153 e 41, respectivamente.
-- No período ocorreram 22 assassinatos, 26 agressões, 153 ameaças, 41 atentados, 15 criminalizações, 4 invasões e 38 ofensas.
-- Foram registrados casos de violência política em 24 estado e Distrito Federal
-- As regiões com maior número de ocorrências são Sudeste (38,1%), seguido de Nordeste (29,8%) e Centro-Oeste (15%).
-- O estado de São Paulo teve maior número registrado de casos: 53. Rio de Janeiro (32) e Bahia e Minas Gerais, ambos com 25 ocorrências.
-- Em 77% dos casos de violência política registrados neste levantamento as vítimas exerciam mandatos.
-- Os dados destacam o alto número de violência em nível local: vereadores (pré-candidatos ou em exercício) foram os principais alvos (51% dos casos), seguido de prefeitos (23%).
-- Partidos de esquerda foram os alvos mais frequentes: PT (56) e PSOL (33).