Brasil / Política

13% dos brasileiros estão perdendo dinheiro para os sites de apostas

27% dos apostadores estão desempregados

Foto: Pixabay/Creative Commons
Só usuários do Bolsa Famílai estão perdendo R$ 2 bilhões por mês

Uma pesquisa do Instituto DataSenado revela que homens até 39 anos com ensino médio completo são os maiores usuários de aplicativos de apostas esportivas no país.

De acordo com a publicação Panorama Poli?tico 2024: apostas esportivas, golpes digitais e endividamento, 13% dos brasileiros com 16 anos ou mais — o equivalente a 22,13 milhões de pessoas — declararam ter participado de “bets” nos últimos 30 dias. A análise foi divulgada nesta terça-feira (1º).

Entre os entrevistados que realizaram apostas esportivas, 62% são do sexo masculino. As mulheres representam 38%. A maioria dos apostadores (56%) tem entre 16 e 39 anos, seguidos das faixas entre 40 e 49 (17%), 50 e 59 (13%) e 60 anos ou mais (14%).

Em relac?a?o a? escolaridade, 40% têm o ensino médio completo. Outros 23% têm o ensino fundamental incompleto e 20% têm o ensino superior incompleto ou mais.

Desempregados

Do ponto de vista econômico, a maioria afirma exercer atividade remunerada (68%). Outros 27% estão fora da força de trabalho e apenas 5% se declaram desocupados.

A maior parte dos apostadores recebe ate? dois sala?rios-mi?nimos (52%) por mês. A fatia que ganha entre dois e seis mínimos é de 35%, enquanto 13% afirmam receber uma remuneração superior.

Entre os brasileiros que realizaram apostas, a maior parte afirma ter gasto ate? R$ 500 em aplicativos ou sites na internet. Apenas 3% declararam ter desembolsado um valor maior.

De acordo com a pesquisa, 12% dos brasileiros, em média, declararam ter feito algum tipo de aposta esportiva nos últimos 30 dias. A proporção é similar em quase todas as regiões do país, exceto em três estados: Roraima e Para? apresentaram percentual de 17%, acima da média nacional, enquanto Ceará ficou abaixo, com 8%.

O analista do DataSenado José Henrique Varanda, coordenador da pesquisa, explica que o “Panorama Político” investiga os temas em debate pelos parlamentares nas comissões do Senado. Segundo ele, o impacto das apostas esportivas “está na ordem do dia do Congresso Nacional” e por isso foi incorporado nesta edição do estudo.

— Além de mostrar que quase 13% da população fez apostas esportivas nos últimos 30 dias, a pesquisa joga luz sobre algumas características dessa população. Há uma proporção maior de homens que fizeram apostas esportivas, 62% [...]. Pessoas mais jovens apostaram mais, e pessoas idosas, menos. [...] Pessoas com ensino médio completo apostam mais, enquanto pessoas com menor e com maior escolaridade apostam menos. Em relação à renda, pessoas de baixa renda apostam menos em proporção a este grupo na população em geral. Porém, como é o maior grupo populacional, ainda é a maior parte dos apostadores — explica.

Dívidas

O Instituto DataSenado apurou ainda o percentual de apostadores com dívidas em atraso há mais de 90 dias. Eles representam 58% das pessoas que gastaram com bets por meio de aplicativos ou sites na internet.

A pesquisa foi realizada entre os dias 5 e 28 de junho. Por telefone, foram entrevistadas 21.808 pessoas com 16 anos ou mais. O “Panorama Poli?tico” é aplicado desde 2008. A pesquisa avalia a opinião dos brasileiros para indicar prioridades para a atuação parlamentar e quantificar percepções em relac?a?o a? democracia e aos principais temas em debate no pai?s.

O que diz a lei

Permitidas pelo governo de Michel Temer por meio da Medida Provisória (MP) 846/2018, convertida na Lei 13.756, de 2018, as apostas esportivas on-line ficaram sem nenhuma regulamentação até o ano passado. Somente vieram a ser reguladas pela Lei 14.790, de dezembro de 2023. A norma trata das apostas de quota fixa, em que o usuário sabe a taxa de retorno no momento de jogar.

A lei tributa empresas e apostadores, define regras para a exploração do serviço e determina a partilha da arrecadação. A norma vale para apostas virtuais, apostas físicas, eventos esportivos reais, jogos on-line e eventos virtuais de jogos on-line.

De acordo com a norma, as empresas podem ficar com 88% do faturamento bruto para o custeio da atividade. Sobre o produto da arrecadação, 2% são destinados à Contribuição para a Seguridade Social. Os 10% restantes são divididos entre áreas como educação, saúde, turismo, segurança pública e esporte.

Ainda de acordo com a legislação, as empresas de bets precisam ter sede e administração no Brasil. Uma regulamentação, a ser proposta pelo Ministério da Fazenda, deve prever medidas para prevenir delitos como lavagem de dinheiro e evitar transtornos provocados pelo jogo patológico.

Danos econômicos e sociais

Apesar de, com a regulamentação, as empresas e os ganhadores de apostas virtuais passarem a pagar tributos — o que gerou controvérsia no Congresso —, estudos mostram que o crescimento das bets, alavancado pela propaganda on-line e em eventos esportivos, tem drenado recursos das famílias, provocado endividamento e atrapalhado a economia do país. Isso levou o governo federal a anunciar, na última semana, que prepara um endurecimento das regras relacionadas às apostas. 

Limites para apostas

O debate sobre o impacto social das apostas on-line conhecidas como "bets" ganhou mais um capítulo. O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) apresentou um projeto de lei para limitar — ou até proibir — as apostas feitas por idosos, pessoas inscritas em dívida ativa ou cadastro de proteção de crédito e pessoas inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).

O projeto (PL 3.718/2024) inclui essa limitação na Lei 14.790,de 2023, também chamada de Lei das Bets. Alessandro Vieira argumenta que a medida é necessária para proteger os grupos em situação de vulnerabilidade, que estão entre os mais prejudicados por esse tipo de jogo.

Levantamento do Banco Central divulgado nesta semana aponta que, somente no mês passado, beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões com as bets por meio do sistema pix. O estudo foi feito após pedido do senador Omar Aziz (PSD-AM).

De acordo com o Banco Central, "esses resultados estão em linha com outros levantamentos que apontam as famílias de baixa renda como as mais prejudicadas pela atividade das apostas esportivas. É razoável supor que o apelo comercial do enriquecimento por meio de apostas seja mais atraente para quem está em situação de vulnerabilidade financeira".

Ilusão e endividamento

Alessandro Vieira ressalta que muitas pessoas têm "a ilusão de que os jogos de azar são uma forma de investimento", o que as leva a subestimar os riscos envolvidos, atraídas pela "promessa de ganhos rápidos, mas incertos". Ele reitera que "é preciso deixar claro que aposta não é investimento".

Esse tipo de jogo, alerta o senador, "tem levado um número crescente de pessoas a desenvolver comportamentos compulsivos, com consequências devastadoras para suas vidas financeiras e sociais. A perda de controle sobre o jogo, a busca constante por recompensas e a negação das consequências são características comuns do vício em jogos, que pode levar ao endividamento excessivo, à destruição de relacionamentos e a problemas de saúde mental".

De acordo com o projeto de Alessandro Vieira, a Lei das Bets passaria a limitar as apostas on-line de:

-- Idosos
-- Inscritos em dívida ativa ou cadastro de proteção de crédito
-- Inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico). 

A proposta também apresenta as seguintes opções para a implementação dessa limitação (a escolha ficaria a cargo do Executivo):

-- Limite de perdas em absoluto ou em percentual do valor transferido à plataforma [de aposta]
-- Limite de transferências mensais
-- Limite de valor mensal transferido em percentual da renda declarada
-- Proibição total de transações