Na infância, eu imaginava os livros como portais que me transportavam a outros lugares e a outras épocas, narrativas que me contavam histórias de vidas tão diversas da minha, mas não havia em mim uma consciência mais profunda sobre isso; era apenas algo incipiente, que só tomaria forma anos depois.
Nessa “imersão”, tinha o hábito de anotar palavras cujo significado eu não conhecia, datas e acontecimentos históricos, para pesquisar depois em dicionários e enciclopédias, já que não havia internet à época. Mal sabia que, no futuro, esse hábito seria condição sine qua non para meu trabalho como editora ou, numa linguagem mais didática, aprimoradora de textos.
O editor é aquele que reúne conhecimento técnico e bagagem cultural diversificada para “lapidar” livros; é curioso, inquiridor, um Sherlock Holmes (impossível não recorrer à literatura para me expressar). Versátil, atenta-se às particularidades e aos conceitos abordados na obra, evitando, assim, ideias equivocadas ou deturpadas.
Essa figura, muitas vezes incompreendida, também aponta incoerências no texto, identifica redundâncias (muito além de subir pra cima e descer pra baixo) e resgata personagens “perdidas” (“Cadê a esposa que existia até o capítulo anterior?”). Essencialmente, o editor se coloca no lugar do leitor ao acompanhar a narrativa com um olhar crítico, fazendo perguntas capciosas, tal como um analista, que provoca uma reflexão mais profunda durante uma sessão de análise.
Como editora, atuo com literatura espiritualista, que contempla a produção de livros espíritas psicografados — processo no qual o médium escreve com o auxílio de um espírito desencarnado. Muitas pessoas acreditam que essas obras, pela forma como foram concebidas, já estão prontas e não necessitam de retoques. Ledo engano, porque a criação literária vai muito além de colocar no papel uma narrativa; requer esforço, pesquisa, uma combinação de múltiplos saberes. Portanto, as obras psicografadas são também coproduzidas por pessoas de carne e osso.
Autores — encarnados ou desencarnados — contam com bons parceiros de diversas áreas (mercado inclusivo é o que precisamos no mundo!) para dar vida às suas histórias. Assim, o editor atua como um facilitador, mostrando caminhos possíveis e preocupando-se com a qualidade, algo que vai muito além das correções gramaticais e ortográficas. O processo de edição de um livro requer disciplina e esforço intelectual até que o escritor insira o ponto final.
Na etapa final, com o livro já impresso, tê-lo nas mãos traz uma sensação de dever cumprido. Capa, gramatura, cheiro do papel, costura dos cadernos formam o corpo do livro; as histórias são a alma.
Livros têm o poder de transpor dimensões, sejam elas físicas ou extracorpóreas. Inspiram, emocionam e derrubam fronteiras, muito além, lá e cá.
Tânia Lins é graduada em Administração de Empresas e pós-graduada em Língua Portuguesa; Comunicação Empresarial e Institucional; e Jornalismo Digital. Atua há quatorze anos na área editorial, com experiência profissional e acadêmica voltada à edição, preparação e revisão de obras, gerenciamento de produção editorial, leitura crítica e coaching literário. Atualmente, é coordenadora editorial na Editora Vida & Consciência.