Artes Visuais

Chico Mazzoni abre exposição com retratos inspiradas na afetividade

Mostra marca o início das comemorações pelos 40 anos de exposições individuais do artista plástico

Foto: Saulo Kainuma
Chico Mazzoni

O artista plástico baiano Chico Mazzoni volta à cena com um trabalho instigante, em que reúne pinturas de retratos que atrelam a aparência real com certos personagens inspirados na personalidade dos retratados. Marcando o início das comemorações pelos 40 anos de exposições individuais, Mazzoni inaugurou a mostra Retrato Falado, no Museu Náutico da Bahia, apresentando 18 pinturas - sendo 12 inéditas, em uma narrativa de rostos, formas, almas e afetos.

Artista plástico, arquiteto e professor, Chico Mazzoni chega à sua 20ª exposição individual concretizando um sonho antigo de trabalhar com retrato, tema que ele experimentou bem jovem, quando ainda não atuava profissionalmente. Entretanto, em Retrato Falado, o artista traz uma série que vai muito além de um projeto de pintura de retratos. Em vez disso, Chico procurou, como ele diz, “capturar um sentimento, uma afetividade, um viés importante da alma dos modelos escolhidos”.

“Estive menos preocupado com a verossimilhança física e mais preocupado com um clima, uma atmosfera, uma característica, um desejo dos meus retratados. O projeto no seu cerne, colocou para mim, de início, um desafio: buscar um personagem para cada eleito, acreditando que ele se identificaria com este personagem, ou pelo menos, tentar convencê-lo desta potencialidade. Numa espécie de realismo fantástico, pintei cada um como se fosse o seu próprio alter ego”, conta Chico.

Os retratados de agora são pessoas do convívio do artista, como amigos, colegas e alunos da faculdade onde leciona, que revelam algo da sua personalidade ou desejo através de personagens como Princesa Egípcia, Imperador da Mata, Dançarino de Pavana, Infanta Margarita de Bourbon e Cigana. “A escolha dos modelos não obedeceu a nenhum critério, nenhuma lógica inicial, aconteceu pela simples razão de eu conseguir ver neles personagens que eu gostaria de pintar, e neles encontrei essa motivação. Obviamente que estas intenções foram dialogadas com os retratados, para que o consentimento do jogo fosse pleno, sendo esta interação primordial na composição do projeto”, explica.

Criadas ao longo do ano de 2022 e início de 2023, as 12 pinturas inéditas de Retrato Falado se juntam a seis trabalhos que retratam personalidades e personagens como a modelo Gisele Bündchen, o cantor Mick Jagger e o papagaio Zé Carioca, e que já haviam sido integrados a mostras anteriores de Mazzoni - Tramas Sinceras (2014), e Pop-up (2006), recortes que dão uma dimensão complementar e fascinante neste novo contexto. Os trabalhos têm formato quadrado, com dimensões variando entre 50 x 50 cm e 80 x 80 cm, todas em pintura acrílica sobre tela. Com produção da Expoart e apoio do Museu Náutico da Bahia, a exposição é aberta ao público e poderá ser visitada até 21 de maio de 2023.

O artista

Chico Mazzoni (Salvador) é graduado em arquitetura pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) e mestre em Restauro dos Monumentos pela Universidade de Nápoles, Itália, mas pinta desde garoto. Aos 13 anos já colocava pinturas (óleo sobre tela) em uma mostra coletiva intercolegial, no Gabinete Português de Leitura. Mais tarde chegou a elaborar cenografias para o teatro baiano, período em que experimentou uma nova linguagem: desenho sobre papel (várias técnicas, especialmente pastel a óleo).

No fim dos anos 1970, enquanto fazia o mestrado em Restauro dos Monumentos, na Itália, participou de uma mostra coletiva em Florença e de uma Bienal de Arte em Nápoles, e visitou vários centros de arte europeus buscando aprimorar a técnica do desenho. Ao longo de sua trajetória alternou suas atividades artísticas com o trabalho de arquiteto, restaurador, cenógrafo e designer.

Sua primeira exposição individual, Chico Mazzoni - Desenhos, foi em 1983, na galeria da Aliança Francesa, em Salvador. A partir daí inicia a trajetória profissional que inclui mostras coletivas e salões na capital baiana e cidades como São Paulo, Viena e Londres.

Em 1984 inaugurou sua fase de pintura acrílica sobre papel e papelão com as exposições Imaginália, Arte-de-Cor (1985) e Cena & Ótica (1987). No fim da década mostra Dezenho, no Museu de Arte da Bahia, em busca do traço nas formas simplificadas, ou seja, do zen na arte. A preocupação com o ponto de equilíbrio permaneceu em Par ou Ímpar (1990).

Alternando atividades, ele foi professor dos cursos de Especialização em Restauro e da graduação em Arquitetura, na Ufba e Universidade Salvador (Unifacs). Enquanto isso, na arte pesquisou a luminosidade na pintura, resultando nas exposições Por Esta Luz que Me Alumia (1995), Estação da Luz (1997) e Milênios no Ar (2000), sua maior exposição individual, montada no Bahia Design Center.

Artista selecionado para compor a 6ª edição da Southward Art – Latin American Art Review (2002), comemorou seus 20 anos de carreira com Brasiliana, seu trabalho de maior repercussão. Em 20 telas, Chico refletiu e reinterpretou as identidades brasileiras em uma produção que sintetizou todo seu longo aprendizado do manejo das linguagens plásticas. Dois quadros desta mostra, representando os “caboclos do 2 de julho baiano”, foram incorporados à Southward Art Collection, em Buenos Aires, Argentina.

Dando continuidade à exploração do figurativo, realizou Pop Up (2006), lançando um olhar sobre a cultura de massa e imagens universais, iniciando sua pesquisa com a pintura em baixo relevo. Já na exposição Vinte e Cinco - Artes de Chico Mazzoni desde 1983, na Art-Factory, Consulado da Holanda, em 2008, mostrou desenhos, pinturas, material de cenografia e outros materiais que remontam sua trajetória sem, entretanto, apresentar trabalhos inéditos. Em 2010, Mazzoni traz uma proposta inovadora na carreira com a exposição Cidades Invisíveis, apresentando  uma trama de linhas, ângulos e perspectivas numa leitura plástica dos centros urbanos.

Comemorando 31 anos de arte na mostra Tramas Sinceras, em 2014, no Palacete das Artes, o artista apresenta tramas imaginárias, frequentadas ao longo de sua trajetória, numa síntese das linguagens artísticas que foram da ultra-figuração adotada em algumas das suas mostras à quase-abstração, a que chegou na mostra anterior. Em Retratos do Mundo Flutuante, em 2017, no MAM, o artista imprime a influência da cultura japonesa em seus trabalhos, “numa busca da paisagem improvável, dos retratos do mundo que flutua na nossa imaginação”.

Na série Excelsos Excessos (2021), apresentando-se pela primeira vez no modo virtual, Chico se inspira no estilo barroco, com seus excelsos excessos, a serviço de sua missão religiosa, contra reformista, que também se estende às demais zonas laicas da cultura, incluindo novas técnicas de expressão plástica que incorporam, inclusive, a reciclagem de materiais descartáveis.

Depoimentos

“A criação dos artistas durante a catástrofe da Pandemia é muito importante, principalmente porque os artistas, pela formação e capacitação técnica podem expressar, materializar através de formas artísticas, o que bilhões de seres humanos sentem e se emocionam. Essa obra contextualizada demonstra a maestria artesanal e estética que o artista Chico Mazzoni possui”.

Juarez Paraíso, artista plástico, professor emérito da Universidade Federal da Bahia, membro da Academia de Ciências da Bahia, membro da Associação Brasileira de Críticos de Arte

“Conheci Chico ainda na década de 80, através de um amigo em comum, Júlio Valente, que me falava de um artista plástico jovem, o qual ele admirava muito na época e iniciava a exposição dos seus trabalhos.

Me chamou muito a atenção o trabalho exposto, pela técnica e a criatividade dos assuntos apresentados, além de ter uma conexão instantânea, pois após um breve bate papo tive a sensação de uma amizade de muito anos.

A partir daí comecei a me interessar pelo trabalho de Chico e fiz questão de ir a todas as suas exposições.

Após algum tempo me ofereci para fazer as reproduções de seus quadros tendo a chance de apreciar suas obras em "Avant-Premiere".

Sempre me impressionando o fato das suas obras nunca serem repetitivas e sua técnica ser primorosa, mesmo que alternando características dentro de uma mesma série.

Minha admiração pelo seu trabalho só cresceu nestas mais de três décadas que convivo com sua obra, me surpreendendo sempre com o perfeccionismo e a verve que ele imprime ao seu trabalho, transformando temas muitas vezes singelos em grandes representações artísticas”.