O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, propôs a Vladimir Putin uma negociação, segundo a agência de notícias russa RIA. Em dois pronunciamentos diferentes nesta sexta-feira, 25, Zelenski afirmou que a invasão russa é como um ataque da 2ª Guerra, que está disposto a dialogar e até mesmo adotar um “status neutro” - o que, na prática, significaria o abandono da ambição de entrar na Otan.
“Não temos medo de falar sobre nada. Sobre garantias de segurança para nosso país. Não temos medo de falar sobre o status neutro, e não estamos na Otan no momento”, disse, antes de ressaltar que essa condição tornaria seu país vulnerável a futuras agressões. “Mas que garantias e, mais importante, quais países específicos nos dariam garantias?”
Em outro pronunciamento na tarde de sexta-feira em Kiev, o presidente ucraniano pediu negociações com a Rússia. “Eu quero mais uma vez fazer um apelo ao presidente da Federação Russa. Vamos sentar na mesa de negociações e parar as mortes.”
Adotando sua política usual de morder e assoprar, a Rússia deu respostas em direções contraditórias. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que Putin iria analisar a declaração de Zelenski, mas que ela seguia “um movimento numa direção positiva”.
"Vladimir Putin está disposto a enviar uma delegação russa de alto nível a Minsk para negociações com uma delegação ucraniana”, disse Peskov a agências russas.
Minsk, capital de Belarus, já era a cidade em que conversações e acordos de paz foram realizados anteriormente entre Rússia e Ucrânia, depois da ocupação da Crimeia pela Rússia, em 2014.
Já o chanceler russo, Sergei Lavrov, disse que a Ucrânia “perdeu a oportunidade das negociações de segurança” e está “simplesmente mentindo” ao mostrar disposição para discutir um status neutro.
“O presidente Zelenski não disse a verdade, ele simplesmente os enganou”, disse Lavrov. “Ele está mentindo quando diz quer discutir o status neutro da Ucrânia. Ele perdeu a oportunidade das negociações de segurança”.
Lavrov afirmou que a diplomacia só terá lugar quando a Ucrânia depuser armas e se render. “Estamos prontos para negociações, a qualquer momento, assim que as Forças Armadas ucranianas ouvirem nosso chamado e depuserem suas armas”, disse o chanceler. “Ninguém irá atacá-los, ninguém irá feri-los, poderão voltar para suas famílias.”
Conversa com a China
O presidente chinês, Xi Jinping, conversou nesta sexta-feira, 25, com o líder russo, Vladimir Putin, sobre a guerra na Ucrânia e se mostrou favorável a uma resolução do conflito pela via diplomática.
A China "apoia a Rússia na resolução (do conflito) por meio de negociações com a Ucrânia", informou a televisão estatal chinesa CCTV, ao apresentar um resumo do telefonema entre os dois.
Durante a ligação com Putin, Xi disse que era importante "abandonar a mentalidade da Guerra Fria, dar importância e respeitar as preocupações de segurança razoáveis de todos os países e formar um mecanismo de segurança europeu equilibrado, eficaz e sustentável por meio de negociações".
Segundo a imprensa chinesa, Putin explicou as razões pelas quais a Rússia lançou uma "operação militar especial" e disse a Xi que tanto a Otan quanto os Estados Unidos "ignoraram por muito tempo as preocupações de segurança razoáveis da Rússia".
O líder russo também afirmou a Xi que está disposto a manter conversas de "alto nível" com a Ucrânia.
À medida que a crise se aprofundava, a China foi forçada a fazer um difícil equilíbrio entre seus laços estreitos com a Rússia e seus grandes interesses econômicos na Europa.
A ofensiva de Moscou contrasta com a posição de política externa de longa data da China de não interferir nos assuntos internos de outros países.
Quem é o presidente ucraniano
Zelenski chegou ao poder como um lutador anticorrupção, confiante na época em sua capacidade de alcançar a paz no duradouro conflito com os separatistas apoiados pela Rússia, então confinados no leste do país. Ele venceu de lavada, com 73% dos ucranianos o apoiando em detrimento do então presidente, Petro Poroshenko, um rico empresário que havia assumido uma posição dura contra Moscou.
Zelenski não tinha experiência anterior na política além de encenar o papel de um presidente na TV. Ele venceu com base em uma agenda populista, combatendo uma abastada classe de oligarcas, e prometeu ser um presidente pragmático, cuja visão para a Ucrânia não era nem de “uma parceira corrupta do Ocidente” nem de uma “irmã mais nova da Rússia”.
Seu apoio mais consistente veio do sul e do leste da Ucrânia, incluindo as regiões de Donetsk e Luhansk, afligidas pelo conflito, parte das quais são controladas por dois enclaves separatistas, cuja independência foi reconhecida por Putin na segunda feira.
Desde então, dúvidas surgiram a respeito de sua capacidade de conduzir a Ucrânia por estreitos tão perigosos e da competência dos conselheiros dos quais ele se cercou, muitos vindos de seu estúdio de comédia, Kvartal 95.
Ainda que seu pessoal militar e de defesa seja bastante respeitado e ele tenha gradualmente constituído uma equipe meritocrática, muitos dos que o cercam chegaram com pouca experiência de governo, ainda mais em se tratando de diplomacia de guerra.
A trajetória de Zelenski espelha a de seu país, que está em guerra contra separatistas apoiados pela Rússia há oito anos. A década passada testemunhou uma dramática ascensão do orgulho nacional ucraniano e do uso da língua ucraniana, juntamente com a confiança na democracia e a orientação pró-Ocidente. A confiança na Rússia e o respeito pelo governo autoritário de Putin diminuíram.
“Ele se transformou porque, basicamente, a sociedade ucraniana se transformou”, afirmou Volodmir Yermolenko, filósofo que edita a revista Ukraine World.
O presidente era “um cidadão do leste ucraniano, de fala russa, que fazia negócios em língua russa”, afirmou ele, referindo-se ao canal de TV de Zelenski, o Kvartal 95. “Os russos teriam esperado políticas pró-Rússia de sua parte, mas ele entende que os russos querem fazer tudo segundo seus próprios termos e dominar a Ucrânia, negar a existência da Ucrânia. É evidente que, de maneira gradual, ele se tornou um típico patriota ucraniano.”
E os ucranianos se uniram em torno de Zelenski, mesmo que suas tentativas iniciais de minimizar o prognóstico sombrio do presidente Joe Biden sobre uma invasão total da Rússia tenham causado consternação e custado ao país um tempo crucial para se preparar.