Famosos / Música

Beyoncé lamenta morte de Elza Soares e presta homenagem

Quando Elza estava prestes a completar 91 anos, Beyoncé a homenageou também por meio da BeyGOOD

Elza Soares e Garrincha

A cantora Beyoncé usou o site oficial de sua organização, a fundação BeyGOOD, para homenagear Elza Soares, que morreu nesta quinta-feira, dia 20, aos 91 anos, no Rio de Janeiro.

"Descanse em paz, Elza Soares. Sua música entreteve e inspirou muitos no Brasil e ao redor do mundo. Somos muito gratos", escreveu Beyoncé.

Em junho do ano passado, quando Elza estava prestes a completar 91 anos, Beyoncé a homenageou também por meio da BeyGOOD. O nome de Elza apareceu com destaque na conta do Instagram, com os seguintes dizeres: "celebrando o brilho e a criatividade dos músicos negros que influenciaram o mundo por meio de sua arte". Artistas como Bob Marley, Cassper Nyovest e Mary J. Blige também foram celebrados no perfil da fundação.

Tornou-se um hábito da cantora americana usar suas redes sociais para homenagear ou parabenizar personalidades de todo o mundo cujo trabalho seja de seu agrado. Em maio do ano passado, por exemplo, Beyoncé lamentou a morte do ator e humorista Paulo Gustavo, vítima da covid-19.

"Isso não se faz"

Em outubro de 1967, Elza Soares [1930-2022] estava em São Paulo para intepretar o samba 'Isso não se faz" no histórico festival de música popular brasileira da Record. Mas a música a ser defendida por ela e o próprio festival ficaram em segundo plano na entrevista da cantora às vésperas da competição. O assunto era a notícia de que ela iria abandonar a carreira.

"Eu? Abandonar a minha carreira, nunca. Ainda não me sinto estabilizada na vida. Além disso gosto de cantar a nossa música, o samba é lógico.  Existe outra música brasileira que não seja samba? Você conhece?"  Elza Soares fingia-se de irritada com a notícia publicada de que ela estava disposta a abandonar a sua carreira, "coisa que não posso fazer porque tenho cinco filhos e preciso educá-los. Talvez daqui uns três anos, se estiver bem de situação, poderei traballhar menos, mas não parar" frisa com humor."  

A estabilidade mencionada pela cantora na entrevista era algo que nunca viria. E mais de 50 anos depois Elza continuaria cantando. Não apenas samba, como defendia naqueles dias. Com seu estilo, energia e voz inconfundíveis, cantou bossa, jazz, blues, rock, funk, soul e qualquer ritmo que lhe despertasse uma nova fome de viver e de cantar.

"Todo o tempo tentam me empurrar de volta ao passado. Não quero ficar presa a um só estilo. Quero cantar muito e de tudo. Assim como sou Ella Fitzgerald e Sarah Vaughan, também sou Jovelina Pérola Negra, e é isso que eu quero que vejam, todas as minhas faces", declarou para Vânia Toledo no Caderno 2 em 1988. 

Com essa sede de renovação constante, Elza Soares continuaria nos palcos até os 91 anos. 

Quem foi Elza Soares

Elza Soares, nome artístico de Elza Gomes da Conceição nasceu no Rio de Janeiro, dia 23 de junho de 1930.

Em 1999, foi eleita pela Rádio BBC de Londres como a cantora brasileira do milênio. A escolha teve origem no projeto The Millennium Concerts, da rádio inglesa, criado para comemorar a chegada do ano 2000. 

Além disso, Soares aparece na lista das 100 maiores vozes da música brasileira elaborada pela revista Rolling Stone Brasil.

Ela nasceu em uma família muito humilde, composta por dez irmãos, na favela da Moça Bonita, atualmente Vila Vintém, no bairro de Padre Miguel, e ainda pequena mudou-se para um cortiço no bairro da Água Santa, onde foi criada.

Em sua infância, vivia a brincar na rua, soltar pipa, piões de madeira, até brigar com os meninos. Era uma vida pobre, porém feliz para uma criança, apesar de ter que ajudar a mãe nos serviços domésticos, levando latas d'água na cabeça.

Aos doze anos de idade (outra fonte informa que foi aos treze) foi obrigada pelo pai a abandonar os estudos e casar-se com Lourdes Antônio Soares, um amigo de seu pai conhecido como Alaordes, que havia tentado abusar de Elza - o pai acreditava que "a honra de sua filha só estaria limpa com o casamento". Elza sofreu muito neste matrimônio arranjado, por conta da violência doméstica e sexual a qual era constantemente submetida. Aos treze anos de idade (outra fonte informa que foi aos catorze[9]) deu à luz seu primeiro filho.

Aos quinze anos de idade, Elza passa por outro grande trauma: Seu segundo filho morre de fome. Com o marido doente, acometido por tuberculose, passou a trabalhar como encaixotadora e conferente na fábrica de sabão Véritas, no Engenho de Dentro. Elza também trabalhou em um manicômio, o Instituto Municipal Nise da Silveira (atual Museu de Imagens do Inconsciente), onde não só conseguia um salário mas também um pouco de comida, que ela furtava pouco antes do local ser fechado e os funcionários voltarem para casa. Com a recuperação do marido, um ano depois, ele a proibiu de trabalhar fora novamente, e Elza voltou a ser dona de casa.

Aos dezoito anos, oficializou seu matrimônio, passando a assinar Elza da Conceição Soares, seu sobrenome artístico posteriormente,[1] e aos vinte e um, ficou viúva, pois seu marido teve uma nova tuberculose e não resistiu.

Outra fonte diz que ela se separou de Alaordes quando este lhe deu dois tiros ao descobrir que ela trabalhava como cantora e que ela não o viu mais até ele morrer em agosto de 1959, quando ela teria 29 anos.

Em 1950, sua filha recém nascida Dilma foi sequestrada. O casal que tomava conta da menina enquanto Elza trabalhava sumiu com a neném de um ano de idade. Foram trinta anos de busca, com policiais e detetives à procura. Elza, sempre triste e angustiada, só reencontrou a filha já adulta, que não sabia de nada. Com o tempo, se aceitaram como mãe e filha. Como o crime prescreveu, o casal não foi preso. Mesmo com revolta e dor, perdoou os sequestradores de sua filha, já que a criaram muito bem.

Casamento com Garrincha 

Elza conheceu Garrincha em 1962, e iniciaram um romance enquanto ele era casado. Após um ano juntos, ela pediu para que ele tomasse uma decisão: Ou assumiria ela, ou ela o abandonaria. Meses depois, ele veio procurá-la, afirmando ter saído de casa e desquitado-se da esposa. Começaram a namorar, mas sem revelar nada a imprensa, sabendo da repercussão negativa que teria.

Quatro anos depois do namoro, em 1966, decidiram morar juntos. Poucos meses depois, oficializaram a união, quando passou a assinar Elza Gomes da Conceição dos Santos.

O casamento de ambos foi motivo de revolta para os fãs e a imprensa, que acusaram Elza de ter acabado com o casamento do futebolista. Para fugirem do assédio da imprensa, venderam a casa no Rio, e Elza mudou-se com os filhos e o marido para São Paulo. 

A perseguição chegou a tal ponto que Elza foi impedida pela multidão de realizar um show na Mangueira e teve de sair disfarçada para escapar do público.

Ainda no Rio, Elza e Garrincha foram passar uns dias no sítio de Adalberto, então goleiro do Botafogo. Uma noite, ao ouvir tiros, Elza correu pela casa e levou um tombo, após o qual descobriu que havia perdido um bebê que ela nem sabia que estava esperando.

Na nova casa onde moravam na Ilha do Governador, Elza e Garrincha sofriam ataques anônimos como pedras arremessadas contra a residência. O primeiro ataque invasivo foi realizado pelo DOPS em 20 de junho de 1964, que entrou na casa da família à noite, rendeu todos os moradores, revirou o interior do imóvel e executou o mainá de estimação de Garrincha. Elza nunca soube o real motivo da invasão, mas suspeita de sua amizade com Juscelino Kubitschek e/ou do fato de ter se juntado a vários outros artistas para gravar uma música pró-João Goulart.

Os ataques foram aumentando e a família de Elza passou a receber cartas e ligações telefônicas com xingamentos e ameaças. Na mesma época, Elza gravou o samba "Eu Sou a Outra", cuja letra enfureceu ainda mais a imprensa e a opinião pública; radialistas quebravam o disco com a canção no ar, uma medida comum na época para expressar descontentamento com uma nova música.

Um dia, morando em uma nova casa na Lagoa Rodrigo de Freitas, Garrincha decidiu ir visitar suas filhas do casamento anterior. Elza havia tido um sonho na noite anterior e, considerando-o um presságio, pediu que Garrincha não fosse, mas sua mãe Rosária se ofereceu para ir junto, e o trio se completou com a filha Sara. Horas depois, Elza recebeu a notícia de que o Ford Galaxie de Garrincha bateu na traseira de um caminhão na Via Dutra e capotou três vezes, matando sua mãe. Após o acidente, Garrincha entra em depressão.

Mudaram-se para uma casa no Jardim Botânico, mas as ameaças e os ataques se intensificaram, culminando em uma aparente tentativa de sequestro, da qual conseguiram escapar, e um atentado a tiros contra a casa deles. Quando o empresário Franco Fontana convidou Elza para uma temporada na Itália, a família se mudou para Roma.

Com a morte da esposa anterior de Garrincha, Elza decide adotar as seis filhas do jogador, que vão morar com ela, Garrincha e seus filhos. Em uma viagem ao Rio para gravar um disco, Elza descobre estar grávida de Garrincha. Em 9 de julho de 1976, nasce Manoel Francisco dos Santos Júnior, apelidado de Garrinchinha.

Garrincha havia prometido a Elza que pararia de beber caso ela lhe desse um menino, mas ele quebrou a promessa logo após o nascimento. Um dia, Elza o flagrou alcoolizado segurando o filho deles por uma perna e ameaçando jogá-lo escada e decidiu deixá-lo, mesmo sabendo que era tudo uma brincadeira.

Em 1982, após dezesseis anos de matrimônio, o casamento de Elza e Garrincha chegou ao fim, por conta de constantes agressões físicas, ciúmes doentios, traições e humilhações, onde o alcoolismo de Garrincha tornou-se insuportável. Durante todos estes anos, Elza tentou ajudar o marido a parar de beber, mas ele e os amigos dele a chamavam de bruxa, por acharem que ela não queria que ele bebesse na rua por ciúmes. No mesmo ano divorciaram-se. Elza voltou a usar o nome de solteira, abrindo mão da pensão a qual tinha direito, só lutando na justiça pela pensão do filho. Por um tempo lutaram pela guarda do menino, favorável a Elza.

Em 1983, Garrincha morreu de cirrose hepática. Mesmo separada, Elza sofreu muito, e teve que consolar o filho pequeno, que não entendia a ausência do pai. Manteve outros relacionamentos após o divórcio, mas não quis casar-se novamente.

Em 2002, conheceu Anderson Lugão e ambos iniciaram um relacionamento romântico e musical, por meio do qual Elza começou a conhecer o hip hop, a música eletrônica e outros movimentos contemporâneos da música brasileira.

Em 2008 rompeu com Lugão e conheceu seu mais recente marido, Bruno Lucide, em Itabira, Minas Gerais. Os dois oficializariam o casamento numa grande festa produzida pela revista Caras, mas abortaram o projeto e fizeram apenas uma cerimônia discreta no civil. Em 2012, os dois romperam, término que só foi oficializado em 2018.

Discografia

  • Se acaso você chegasse (Odeon, 1960)
  • A bossa negra (Odeon, 1960)
  • O samba é Elza Soares (Odeon, 1961)
  • Sambossa (Odeon, 1963)
  • Na roda do samba (Odeon, 1964)
  • Um show de Elza (Odeon, 1965)
  • Com a bola branca (Odeon, 1966)
  • O máximo em samba (Odeon, 1967)
  • Elza, Miltinho e samba (Odeon, 1967)
  • Elza Soares, baterista: Wilson das Neves (Odeon, 1968)
  • Elza, Miltinho e samba - vol. 2 (Odeon, 1968)
  • Elza, carnaval & samba (Odeon, 1969)
  • Elza, Miltinho e samba - vol. 3 (Odeon, 1969)
  • Samba & mais sambas (Odeon, 1970)
  • "Maschera negra / Che meraviglia" (compacto simples / lançado na Itália, 1970)
  • Elza pede passagem (Odeon, 1972)
  • Sangue, Suor e Raça (Odeon, 1972) - c/ Roberto Ribeiro
  • Elza Soares (Odeon, 1973)
  • Elza Soares (Tapecar, 1974)
  • Nos braços do samba (Tapecar, 1975)
  • Lição de vida (Tapecar, 1976)
  • Pilão + Raça = Elza (Tapecar, 1977)
  • Senhora da terra (CBS, 1979)
  • Elza negra, negra Elza (CBS, 1980)
  • "Som, amor trabalho e progresso / Senta a púa" (compacto simples / RGE, 1982)
  • "Alegria do povo / As baianas" (compacto simples / Recarey, 1985)
  • Somos todos iguais (Som Livre, 1985)
  • Voltei (RGE, 1988)
  • Trajetória (Universal Music, 1997)
  • Carioca da Gema - Ao vivo (1999)
  • Do cóccix até o pescoço (Maianga, 2002)
  • Vivo feliz (Tratore, 2003)
  • Beba-me - Ao vivo (Biscoito Fino, 2007)
  • A Mulher do Fim do Mundo (Circus, 2015)
  • Deus É Mulher (Deckdisc, 2018)
  • Planeta Fome (Deckdisc, 2019)

Coletâneas

  • Grandes Sucessos de Elza Soares (Tapecar, 1978)
  • Salve a Mocidade (Tapecar, 1997)
  • Meus Momentos – Volumes 1 & 2 (EMI Brasil, 1994)
  • Elza Soares – Raízes do Samba (EMI Brasil, 1999)
  • Sambas e mais sambas - vol. 2 (Raridades) (EMI Brasil, 2003)
  • Deixa a nega gingar - 50 anos de carreira (EMI Brasil, 2009)
  • Elza Soares & João de Aquino (Deckdisc, 2021)