Na semana passada falamos sobre a implantação das primeiras linhas de bondes sobre trilhos em Salvador e sobre a estrada de ferro. Hoje falaremos sobre a eletrificação dos bondes e como as linhas se distribuiram pela cidade.
Em 1886 foi criada, no Rio de Janeiro, como sociedade anônima, a Companhia Circular de Carris da Bahia que tinha à sua frente o engenheiro baiano João Ramos de Queiroz.
A proposta era criar duas linhas-tronco e o percurso ligaria vários bairros da cidade alta e da cidade baixa até o Bonfim com obras de rebaixamento de leitos de ruas e passeios, construção de muros de sustentação de casas, aterros; rebaixamento da Ladeira do Bonfim e calçamentos.
Em 1894, com a fusão da Veículos Econômicos com trecho da Companhia Circular, o coronel Antônio Brandão criou a Companhia Carris Elétricos da Bahia, que instalou bondes elértricos a partir de 1896 quando a firma Siemens & Halske foi contratada para eletrificar a nova linha, que funcionava na cidade baixa, cujo percurso ia do bairro do Comércio ao Bonfim.
Em 1898 a Carris Elétricos da Bahia passou para o domínio da Siemens & Halske com sede em Berlim.
Viagem inaugural da linha do Bonfim na Dendezeiros, 1897
A instalação dos bondes elétricos no Brasil ocorreu praticamente na mesma época que em várias grandes cidades no mundo. Contudo, as cidades brasileiras não possuíam a infraestrutura correspondente, fato que não permitia o bom funcionamento e a expansão das linhas de bonde.
Em Salvador isto transparece na fotografia registrada por fotógrafos da época, na qual bondes disputam o espaço das ruas, no bairro do Comércio, com carroças, lixo, pessoas e poças de lama.
Bondes da linha do Bonfim no Cais do Ouro, 1898
Fato interessante, e que está em consonância com as iniciativas realizadas em outras cidades (Londres, 1863, Recife, 1867 e Nova Iorque, 1868), foi a tentativa de instalar uma pequena locomotiva a vapor em Salvador.
Foram os irmãos Ariani, em 1866, que instalaram a primeira locomotiva a vapor ligando um pequeno trecho da Península de Itapagipe; a Companhia Transportes Urbanos introduziu a segunda, na linha do Campo Grande ao Rio Vermelho.
A máquina se chamava maxambomba, uma corruptela da expressão inglesa machine pumb (bomba mecânica), e substituía os animais que puxavam os bondes.
As dificuldades para a instalação foram muitas: aspectos administrativos; desconforto com a fumaça; topografia da cidade; avanço dos particulares sobre terrenos do município; deslizamento de encostas; o custo alto das desapropriações de chácaras e sítios dentro da cidade. Essa aventura não durou muito.
Modelo de maxambomba utilizada em Recife, c. 1867
Apesar das dificuldades com a falta de infraestrutura e pela topografia acentuada, as linhas de bonde foram ampliadas para ligar os bairros mais distantes do centro da cidade. Para isso, viadutos, pontes e pontilhões foram construídos.
A rede elétrica pública também acompanhou o bonde. Diversos modelos transitaram pela cidade, mas eles se caracterizavam por serem abertos ou fechados.
Os bondes abertos circulavam em bairros e zonas mais pobres, enquanto que os melhores bondes, geralmente fechados, circulavam nas linhas da cidade alta, principalmente entre os Barris e o Corredor da Vitória.
Modelos dos bondes abertos e fechados que circulavam em Salvador
Para cada atividade existia um modelo de bonde. Havia o bonde-salão, para eventos importantes, oficiais ou privados.
O bonde mortuário era o carro fúnebre que poderia conduzir apenas o morto enquanto os familiares iriam em outro vagão, mas havia o bonde misto no qual viajavam juntos o morto e os familiares, geralmente para pessoas mais modestas de posses.
Havia o bonde sanitário que transportava doentes até o hospital de isolamento, o Couto Maia no alto do Monte Serrat. E quando se tratava da circulação e transporte de mercadorias, utilizavam-se os troles e pranchas, tanto a tração animal como elétricos.
O último bonde elétrico transitou pelas ruas de Salvador em 1961, o ônibus tomou o seu lugar.
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Para saber mais
SAMPAIO, C. N. 50 anos de urbanização: Salvador da Bahia no século XIX. Rio de Janeiro: Versal, 2005.
SANTIAGO, C. C.; CERQUEIRA, K. M. de A. F. Sobre arcos e bondes: resgatando a memória urbana de Salvador. Salvador: EDUFBA, 2019.