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Alcoolismo pode ser uma resposta à sensação de perigo

Estudo associa doença aos mecanismos do cérebro que regulam nossa resposta a situações de risco

Foto: Phxere.com/Creative Commons
Homem bebendo
Fatores como predisposição genética e as condições psicológicas do indivíduo podem desencadear o alcoolismo

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), três milhões de mortes por ano no mundo estão associadas ao consumo nocivo de álcool. Fatores como predisposição genética e as condições psicológicas do indivíduo podem desencadear o alcoolismo.

Agora, um novo estudo publicado no periódico Science Advances revela que o surgimento da doença também está associado aos mecanismos do cérebro que regulam nossa resposta ao perigo.

A pesquisa, conduzida pelas universidades de Warwick, Cambridge e Fudan, analisou o funcionamento da relação entre duas áreas do cérebro: o córtex orbitofrontal e a substância cinzenta periaquedutal. Quando a primeira estrutura detecta um cenário desagradável ou de emergência, ela envia uma mensagem para a segunda, que avalia se é preciso escapar dessa situação.

Os cientistas constataram que os riscos de desenvolvimento do alcoolismo são intensificados quando há um desequilíbrio na transmissão dessas informações, que pode ocorrer de duas maneiras.

Em uma delas, o álcool inibe a ação da substância cinzenta periaquedutal, de modo que o cérebro não consegue processar os sinais negativos. Assim, a pessoa sente apenas os benefícios do consumo de bebidas, ignorando seus efeitos nocivos.

Em um segundo cenário, essa mesma região é hiperativada, levando o indivíduo a pensar que está constantemente sob condições de perigo e adversidades.

Ele, então, sente a urgência de recorrer ao álcool para escapar dessa situação. “Nós descobrimos que o mesmo mecanismo pode falhar de duas maneiras completamente diferentes, e ainda assim levar a um comportamento semelhante no abuso de álcool”, afirma Tianye Jia, coautora do estudo.

Para chegar a essas conclusões, foram analisadas imagens de ressonância do cérebro de 1.890 adolescentes enquanto faziam tarefas específicas, e também durante o repouso – ou seja, quando não há nenhuma ação explícita sendo desempenhada. Os participantes também responderam um questionário sobre consumo de álcool e comportamentos impulsivos.

Quando os jovens não recebiam recompensas pelas atividades – o que gerava sentimentos negativos de punição –, a transmissão de informações entre o córtex orbitofrontal e a substância cinzenta periaquedutal era interrompida de forma mais intensa entre aqueles que demonstravam sinais de alcoolismo.

Nos momentos de repouso, os participantes que apresentavam uma hiperativação na regulação entre essas duas áreas do cérebro — o que leva ao sentimento de querer escapar de uma situação o quanto antes — também tinham níveis mais altos no consumo de bebidas alcoólicas.

A equipe de pesquisadores já havia observado padrões semelhantes em testes com roedores. Para Jianfeng Feng, um dos autores do estudo, “é empolgante ver que nós conseguimos replicar esse modelo em humanos e, claro, ir um passo além na identificação do sistema de duas vias que conecta o abuso de álcool a tendências de comportamento impulsivo”. Os cientistas acreditam que o estudo pode levar a intervenções mais efetivas na hora de tratar casos de alcoolismo.