Há 110 ou 115 milhões de anos, um dinossauro de duas patas do Período Cretáceo, do tamanho de uma galinha, habitava margens de mananciais das terras cearenses. Com um esqueleto semelhante a muitos outros pequenos dinossauros anteriores ao Período Jurássico, por fora, no entanto, era bem diferentão.
O dinossauro Ubirajara jubatus exibia uma vistosa crina ao longo do dorso e duas hastes de cada lado, semelhantes a fitas, provavelmente de queratina, a mesma substância que constitui o cabelo e as unhas, segundo cientistas que publicaram o artigo “A maned theropod dinosaur from Gondwana with elaborate integumentary structures“, em Português mais ou menos “Um dinossauro terópode de juba da Gondwana com elaboradas estruturas tegumentares”, em outubro passado, na revista científica holandesa “Cretaceous Research“.
As estruturas semelhantes a cabelos de Ubirajara jubatus seriam uma forma rudimentar de penas chamadas protopenas. Na realidade, os pássaros evoluíram de pequenos dinossauros com penas há cerca de 150 milhões de anos. O artigo destaca a espécie como um dos dinossauros com aparência mais elaborada já descritos. Segundo os pesquisadores, isso pode ajudar a entender como “aves, como os pavões, herdaram sua capacidade de se exibir”.
“Existem muitos dinossauros estranhos, mas este é diferente de qualquer um deles”, declarou à Agência Reuters, o professor de Paleobiologia David Martill, da Universidade de Portsmouth, da Inglaterra, que ajudou a conduzir o estudo com mais um inglês, dois alemães e um mexicano.
O Ubirajara jubatus faz parte da subordem de dinossauros Theropoda, tendo como parente próximo o dinossauro jurássico Compsognathus, encontrado na Europa. Seu fóssil, que é um holótipo, ou seja, peça única que serviu de base para sua descrição, está no Museu Staatliches für Naturkunde, na cidade de Karlsruhe, na Alemanha.
A descrição do dinossauro recém-identificado, que seria o primeiro do seu tipo com penas na América do Sul, por investigadores europeus, causou um frisson na comunidade científica e polêmica entre os pesquisadores da região de origem do fóssil porque o processo de retirada do fóssil do País estaria em desacordo com a legislação brasileira.
O paleontólogo Antônio Álamo Feitosa Saraiva, professor e pesquisador da Universidade Regional do Cariri (Urca), exalta a descoberta, que supera o Aratasaurus museunacionali, apresentado em julho, como o dinossauro mais antigo da Bacia do Araripe.
Por outro lado, questiona como se deu a saída do fóssil do Brasil. Ele observa que, na segunda página do artigo, está escrito, no item 2.1., que o fóssil saiu do Brasil em 1995 com o aval do DNPM Crato. Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) foi substituído pela Agência Nacional de Mineração (ANM) em 2017 e o escritório do Crato foi desativado, permanecendo apenas em Fortaleza. “Isso não é legal, pois o fóssil é um holótipo, aquela peça que serviu de base para a descrição da espécie e que deveria ter fica depositada aqui no nosso museu e de lá não sair”.
“É uma pena que uma coisa como essa ocorra. A ciência precisa evoluir. Mas tem que se basear em princípios éticos, respeitando as legislações e os direitos das pessoas e das entidades. O Brasil não permite comercialização ou qualquer outro tipo de troca dos seus fósseis por causa da Lei Federal de 1942. E o DNPM, citado no próprio artigo sobre o fóssil, não tem competência para autorizar exportação de fóssil. Eles dão uma autorização, quando se vai fazer uma pesquisa no exterior, temporária para portar o fóssil e trazer de volta”, detalha o professor Allysson Pinheiro, curador associado do Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, em Santana do Cariri, diretor científico do Geopark Araripe, professor e pesquisador da Urca e membro do Conselho de Geoparks Mundiais, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
De fato, segundo o artigo publicado, o espécime descrito compreende um esqueleto parcial, preservado sobre laje e contra laje de calcário laminado milimetricamente, encontrado em uma pedreira, entre os municípios de Nova Olinda e Santana do Cariri, na Formação Crato, e levado para Alemanha com autorização de exportação por um agente do Escritório Regional de Crato do em 1º de fevereiro de 1995.
A Eco Nordeste entrou em contato com o antigo chefe do Escritório do Crato, Artur Andrade, que assumiu o posto em 1996, um ano após o registro de saída do fóssil, mas ainda não há uma posição oficial da ANM a respeito do caso.
O Decreto Lei Nº 4.146, de 1942, determina que os fósseis são propriedade da União. Diferentemente de países como Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido, a compra e venda no Brasil é proibida. Sua extração depende da autorização prévia da ANM. A pena para quem comercializa as peças varia de um a cinco anos de prisão.