Política / Saúde

Covid: pesquisadores cobram dados sobre mulheres negras

Relatora da comissão externa que acompanha pandemia alerta para racismo institucional

Pesquisadores, especialistas e representantes da área de saúde lamentaram a falta de dados sobre mulheres negras vítimas de Covid-19. “Com a epidemia de coronavírus, mortes da população negra estão mais evidentes por causa do racismo que estrutura todas as relações sociais no Brasil e leva a menos acesso aos cuidados e assistência do poder público”, denunciou a deputada Talíria Petrone (Psol-RJ).

A parlamentar coordenou nesta sexta-feira (20) debate virtual promovido pela Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados sobre a saúde da mulher negra na pandemia. Na reunião, deputadas e debatedores destacaram a importância do Sistema Único de Saúde (SUS), responsável pelo atendimento de 80% da população negra. “A saúde deve ser direito de toda a população, inclusive da população negra”, afirmou Talíria Petrone. “É fundamental defender o SUS, modelo que entende a saúde integral.”

Falta de informações

Pesquisadores observam que, sem informações sobre cor ou raça nos dados de saúde, não é possível elaborar políticas de tratamento específicas para população negra. A coordenadora do Observatório da Saúde da População Negra (Popnegra) da Universidade de Brasília (UnB), Marjorie Chaves, disse que a crise sanitária tornou insustentável a desigualdade de acesso à saúde. “As áreas de saúde são obrigadas a coletar informação por raça ou cor. Mas na pandemia isso não foi cumprido”, lamentou.

Marjorie Chaves citou pesquisa de São Paulo indicando que a mortalidade da doença foi maior entre a população negra com relação à contaminação. Ela também apontou para o simbolismo de que a primeira vítima de Covid-19 no Rio de Janeiro foi uma trabalhadora doméstica negra, que contraiu doença de contratante que veio da Europa.

Partos e saúde mental

Especialista em saúde da família, a conselheira do Conselho Nacional de Saúde Maria da Conceição Silva denunciou a falta de combate à mortalidade materna de mulheres por Covid-19. Ela queixou-se do desmonte da política nacional de atenção básica em saúde e da falta de estratégia de saúde da família. “Para dar resposta melhor à pandemia, atenção básica é fundamental”, apontou.

A deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC), que é relatora da Comissão Externa que acompanha a pandemia da Covid-19 no país, lamentou o que vem ocorrendo com a população negra. “Como parlamentar e enfermeira, vi o racismo institucional na saúde. Profissionais da saúde dedicam menos tempo para mulheres negras durante o prenatal, trabalho de parto, parto e pós-parto. Isso é uma violência”, criticou.

Problemas de saúde mental, que também se agravaram ao longo da pandemia, foram citados pela psicóloga Luana Alves como outra preocupação que requer atendimento especial à população negra. “Os indicadores são terríveis. As tentativas de suicídio aumentam muito na juventude negra”, alertou. Ela lembrou que a saúde é determinada por condições de vida, alimentação e moradia, que influenciam para que os indicadores sejam piores entre mulheres negras.

Por causa da taxa de mortalidade maior em determinadas doenças e condições de saúde, a médica Regina Nogueira defendeu que prontos-socorros devem dar prioridade de atendimento a negros vítimas de violência, grávidas negras e pacientes hipertensos negros. “Não é que ser negro tenha pré-disposição a algumas doenças. Mas esta abordagem pode reduzir a mortalidade”, propôs. Regina Nogueira é criadora do Banco Grão, primeiro banco comunitário digital dos povos tradicionais de matriz africana.

Ao longo do debate, deputadas e debatedores declararam solidariedade à família de João Alberto Silveira Freitas, que era negro e morreu espancado por seguranças do supermercado Carrefour, em Porto Alegre (RS), na véspera do Dia da Consciência Negra. “Não vamos esquecer. Precisamos ter Justiça neste País”, protestou Erika Kokay (PT-DF), que também participou de manifestação em uma das lojas do Carrefour.

Já a procuradora-adjunta da Procuradoria da Mulher, deputada Carmen Zanotto, afirmou que a Câmara dos Deputados deve acompanhar o caso da primeira vereadora negra eleita em Joinville (SC), que sofreu ameaça de morte por vaga para suplente branco. “Ela precisa do olhar do Parlamento para sua proteção e de seus familiares”, declarou.